Parei o carro mais afastado da entrada da mina do que de costume, em cima de um caminho cheio de pedrinhas. Se eu parasse muito perto, corria o risco de ficar atolada. Tem chovido muito nessa época do ano e, com isso, o barro se acumula e toma conta de locais como este.
Antes de descer do carro e me aventurar pelo frio da floresta que cercava a mina, fiquei por um tempo olhando ao redor, tentando não pensar em todas as vezes em que tinha estado ali com Noah. mas era impossível não lembrar. Foram horas sem fim conversando e andando por cada centímetro daquele lugar. Era o nosso lugar. pensar nisso me fez ficar surpresa comigo mesma por ainda não ter tido nenhum tipo de crise de pânico, agora que sabia que ele não voltaria mais. Talvez não tivesse tido tempo para aceitar a ideia ainda. Nunca fui de ter ataques e chiliques de qualquer tipo. mas com um acontecimento desses, eu esperava que meu subconsciente assumisse e me fizesse chorar sem parar chamando por Noah. mas não aconteceu. Talvez por ser a notícia tão chocante, eu ainda esti- vesse entorpecida. pois as poucas lágrimas que eu havia derramado foram mais por raiva do que por qualquer outro motivo.
Respirei fundo tomando coragem para começar a procurar. mas, assim que saí do carro, soube que não seria nada fácil. Nos primeiros passos que dei meus pés já viraram duas bolas de lama.
Tomando muito cuidado para não me estatelar no chão e me sujar inteira, comecei a afastar folhas, galhos e pedras conforme ia andando à procura do meu anel. mas só encontrei lama, alguns cogumelos, mais lama, insetos, musgos e mais e mais lama.
Refiz os caminhos por onde passamos da última vez em que havíamos estado ali. passei reto pela entrada da mina, onde tantas vezes entramos, mas, como não chegamos a entrar das últimas vezes, nem me daria ao trabalho de procurar lá dentro.
Só tinha realmente entrado na velha mina com Noah. mesmo sendo uma mina relativamente segura, agora que estava abandonada, não achava muito pru- dente ficar andando por baixo da terra. Ainda mais sozinha.
Já que sabia que não o tinha perdido lá dentro, isso excluía toda a parte de baixo do terreno. Deve ter sido em algum lugar mais para cima, onde fizemos piquenique naquela última vinda.
virei-me para o sul começando a subir. passei por várias placas de aviso de perigo indicando o poço de água logo à minha frente, ou melhor, o que restara dele. Um dia deve ter sido um poço com as bordas de tijolos laranja de onde os mi- neiros deveriam pegar água potável. mas agora não passava de um buraco perigoso.
O céu do final da tarde estava escuro e nuvens carregadas se acumulavam por cima de toda a cidade. Logo começaria a chover. Tinha que me apressar.
Não sei por quanto tempo fiquei procurando. Revirei cada pedra e galho que achei pelo caminho tentando com todo o afinco não pensar em Noah para não começar a chorar. mas o simples objetivo dessa minha ousada jornada, de ir procurar meu anel, já era completamente contraditória ao meu objetivo de tentar não pensar em meu melhor amigo.
minhas mãos estavam frias, dormentes e cheias de barro. E as mangas de meu agasalho também. Não via mais a cor preta das botas em meus pés e minha calça estava encharcada até os joelhos.
Já havia sentido vários pingos de chuva. mas ainda não estava pronta para desistir. para desistir do meu anel. E de Noah. pois era isso o que significava para mim achar esse anel, que eu não estava desistindo do meu amigo. Afinal, era o único pedacinho que sobrara dele.
continuei a procurar com mais afinco, enfiando as mãos por dentro da terra, na esperança de sentir o frio do pequeno metal. mesmo sabendo que aqui- lo talvez fosse em vão.
meus olhos estavam embaçados, não sabia se pelas lágrimas que agora insistiam em se formar ou pela chuva, que agora caía de verdade. Eu já estava encharcada da cabeça aos pés. Estava quase impossível andar sem escorregar.
Foi então que me dei conta. como um click, algo se acendeu dentro de mim. Mas o que eu estava fazendo? Eu sabia que não acharia um pequeno e sim- ples anel. Ainda mais no meio daquela lama toda. Ele deveria estar soterrado por quilos e quilos de barro. Não vou achá-lo. O perdi, o perdi para sempre. Meu anel. Meu amigo. Nunca mais os verei.
A verdade massacrante foi tomando conta de mim. minha garganta es- tava em chamas. E a sensação por aceitar essa verdade foi como se colocassem uma pedra muito pesada em cima de meu peito. grande demais para que eu pudesse suportar.
meu coração batia acelerado e eu tinha dificuldade para respirar. me apoiei nos destroços de uma das poucas paredes que ainda estava de pé. Dobrei o corpo para a frente me abraçando, tentando fazer esse sentimento ir embora. mas podia sentir que aquele ataque de pânico estava chegando.
Agora a verdade me atingira com toda a força como uma bofetada na cara. Ele não vai mais voltar, ele não vai mais voltar. E ali, naquele lugar onde nos encontramos centenas de vezes, no nosso lugar especial, me sentindo absoluta- mente sozinha e abandonada, foi onde pude finalmente compreender a horrível realidade e chorar. Esvaziar minha alma de todo aquele desespero.
Incapaz de poder fazer qualquer outra coisa, me sentei abraçando minhas pernas, trazendo-as de encontro ao peito, e chorei até adormecer.
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Labirinto de Espelhos (Livro 1)
RomanceSinopse Quando a estudante Eva Lins conhece o misterioso e sedutor Willian não imagina quais segredos ele podia esconder por trás de tanta beleza. Que ele é perigoso, ela pôde ver em seus olhos desde a primeira vez que se encontram, porém, a vontad...