O cúmplice

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No funeral de Kevser fiquei em frente a aquela que eu tinha certeza que era a algoz de todos os acontecimentos dos últimos seis anos, Ikibal Kirimli. Ainda não  tinha todas as provas suficientes do seu envolvimento com Aksak, o maior inimigo de Yaman, mas logo sua postura altiva e confiante seria apenas uma lembrança, eu quebraria seu orgulho e a jogaria na sarjeta. Sempre afirmei a todos que voltei para o caso por uma questão de justiça, mas nunca escondi que também era por vingança. Quando Yacin foi morto, eu também morri um pouco aquele dia, meus ferimentos não eram só físicos, minha alma tinha sido gravemente machucada, meu orgulho foi ferido. Tinha perdido não só meu informante, mas também alguém que tinha se tornado um bom amigo, pai de família. Ao ter essas lembranças, começo a chorar pela perda, não só de Kevser e Yacin, mas também a perda de Yusuf ao ficar órfão, me vi de novo aos nove anos de idade na beira do túmulo de meus pais.

Ao terminar o enterro, Sr. Nedin se aproxima para dar  condolências:

Nedin : Sinto muito Srta.Seher, eu sei o quanto para você é difícil passar por essa tribulação. Espero que encontre o bálsamo necessário para seu consolo.

Apenas acenei com a cabeça e agradeci, essas palavras eram a senha  de que ele tinha aceitado e que estava dentro do esquema. De agora em diante ele seria peça chave para que eu pudesse fazer parte da rotina da mansão Kirimli.

Nedin

Fui para aquele enterro com a consciência pesada em trair aquele que considero mais que meu chefe, meu amigo, no qual sempre tive orgulho de ser extremamente leal. Chamaram Yaman até a delegacia para prestar depoimento sobre o acidente da Sra. Kevser, eu o acompanhei como de costume. Quando Firat o chamou para dar seu depoimento, o comissário Ali me levou até a sala de interrogatórios, onde me expôs o que precisavam de mim. Rejeitei totalmente a idéia e ameacei de que Yaman saberia de tudo, mas o que ele me expôs em seguida fez repensar tudo:

A: Nedin, no dia que Yacin foi morto, você estava junto não? Você também foi ferido naquele confronto!

N: Você sabe que sim! Até hoje busco o responsável por aquela emboscada.

A: Ele era nosso informante, você sabia disso? A agente que você ira ajudar era a responsável por ele na época.

Vejo aquela mulher na beira do túmulo da "irmã" chorando de forma tão sentida, que quem não sabe de toda a história se convenceria que ela tinha perdido alguém muito querido e próximo. Aparentava ser muito mais nova do que realmente era, tinha lindos olhos verdes cor de esmeralda e as feições de um anjo inocente. Eu não sabia de quem eu tinha mais ódio, de Ikibal que tinha se vendido a Aksak e traído aquele que lhe acolheu em seu lar ou aquela jovem que eu passei a considerar como responsável pela morte de Yacin. Só sabia que eu iria usar essa oportunidade para descobrir tudo o que aconteceu e dar a devida punição aos culpados.

Quando o enterro terminou, ela esperou que boa parte dos presentes se retirassem, começou a andar pelas lápides do cemitério, era a dica que deveria me aproximar.

S: "eu espero que o comissário Ali tenha lhe explicado o que ocorrerá se senhor pensar em nos trair". Ela fala sem tirar os olhos na movimentação de pessoas que havia em um outro enterro. Vigiava a todo momento qualquer movimentação,  como se seus sentidos estivessem sempre alerta.

N: "sim, ele me deixou bem a par de tudo".  Me viro e fico na frente de seu campo de visão: "e você está a par do que Yaman vai fazer com você quando descobrir que é a responsável pela morte do seu irmão?"

Vejo que seu semblante muda, fica mais tênue e abaixa o olhar, mas no mesmo momento ela retoma uma feição dura  e me encara: " isso  cuido eu, seu papel é de me colocar dentro da casa, me deixar a par dos movimentos de seu chefe, me antecipar a suas decisões. Fique atento, amanhã começamos a agir, salve esse numero com o nome de Smith, nos comunicaremos por meio dele, esse número é rastreado, tudo que conversarmos será gravado para a minha e para a sua segurança". Ela me entrega um papel com um número de telefone e vai embora.

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Sr. Nedin foi imprescindível para que o plano desse certo, ele passava para Yaman as informações que nós queriamos que ele soubesse,  nos deixava a par das decisões e as vezes até o influenciava para que ocorressem da forma que queriamos.

Claro que não foi fácil,  até conseguir ficar   próxima de Yusuf e  ganhar a confiança de Yaman , muita coisa aconteceu. Ele não me queria próxima do sobrinho, achava que eu queria tirar o menino dele,  por isso fez de tudo para eu desistir:
Invadiu minha casa;
Atirou uma flecha na minha direção;
Tentou me comprar com dinheiro (sinto até hoje o arder dos meus dedos em seu rosto, sim eu lhe dei um tapa na frente de todos os seus funcionários, inclusive Sr. Nedin);
Ordenou que me mergulhasse  de ponta cabeça no mar gelado;
Me prendeu na sala da caldeira e soltou seu cão de guarda em mim;
Gritou e me humilhou inúmeras vezes.

Mas eu não desisti, eu tinha uma missão a cumprir.

Mas depois que entrei na mansão e abracei Yusuf, tudo mudou muito rapido. Ele disse que eu tinha o mesmo cheiro de sua mãe,cheiro de baunilha, e se agarrava em mim com um medo de ficar sozinho de novo, medo esse que eu conhecia muito bem. Nesse momento vi que eu tinha uma missão muito maior a cumprir: ajudar aquele lindo garotinho de cabelos cacheados a se curar, não deixar que ele se perdesse como seu tio se perdeu ou como eu quase havia me perdido.


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