DIECISEIS

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21 de setembro, domingo.

Apesar dos temporais, guardo sopros
de suavidade em mim.


Noah Urrea

Estou na cama da garotinha, com a própria da garotinha ao meu lado. Estou quase caindo da cama, então me arrumo e rolo mais para o meio. Encosto na dona do quarto, mas não tenho vontade de me afastar. Ela está dormindo profundamente, me sinto à vontade para apoiar a cabeça no meu braço e olhar para ela. Dançamos muito ontem à noite, até a hora do almoço. Depois eu fiz com que ela comesse e ela também me obrigou a comer. Quando terminamos, subimos de novo para o seu quarto e voltamos a dançar.

Sei que dormimos durante muito tempo, mas ainda sim não parece o bastante. Queria poder dormir mais e só acordar quando tia Alex tiver voltado, mas sei que isso não vai acontecer. Mesmo com dor, me esforço para levantar e fazer café. Meu celular ainda está no meio da escada, o pego e vejo todas as chamadas perdidas e mensagens dos meus pais. A maioria são do meu pai, acho que minha mãe não tem condições de me mandar mensagem.

"Fui aí mais cedo com a nossa chave,
vocês estavam em silêncio mas
pareciam bem. O velório é amanhã,
no fim da tarde."

"Josh está preocupado com
você, responda ao menos que
está vivo. Seria legal se você o visse,
você também precisa de apoio."

"Eu te amo, estou muito
orgulhoso de você."

— Meu Deus, eu sinto muito- Josh diz assim que atende minha chamada— Fui na sua casa, mas ouvi o choro da sua mãe e não tive coragem de entrar. Caramba, Noah, eu sinto muito. Como você está? Onde você está? Vou parar de falar em breve, só estou nervoso. Eu não posso imaginar o que você tá sentindo, mas... Estou do seu lado, irmão. Sempre. Eu sinto muito...

Espero que o surto dele acabe, então respondo depois que Josh fica em silêncio.

— Eu estou bem, eu acho.

Minha voz quase não existe, acho que não estou convencendo de que estou bem. Não estou bem, mas no momento não quero me permitir ficar mal. A garotinha está péssima, sei disso porque desde ontem ela não me provocou nem uma vez sequer. Quero deixar minha dor guardada por enquanto, estou conseguindo cuidar dela lembrando de bons momentos com a minha segunda mãe. Meu pai está orgulhoso de mim, estou me saindo bem.

— Ela morreu- sussurro. Talvez eu não consiga guardar minha dor— Caramba, Josh, ela morreu mesmo. Como... Droga, isso dói.

Meu amigo não responde, Josh não é a pessoa mais sentimental do mundo, não o culpo por não saber o que dizer.

— Você vai ao velório?- pergunto.

— Com certeza. Vou estar lá.

— Ok, obrigado- suspiro— Nos vemos lá.

— Nós estamos bem?

Ele pergunta, reconheço que ele na verdade está tentando perguntar "Por acaso você está tendo uma crise de ansiedade silenciosa?".

— Estamos bem, irmão. Valeu.

Desligo de novo, se eu conversar mais um pouco com ele vou desabar. Não posso desabar, principalmente quando escuto a porta da casa se abrir. É tio Joseph, mas não parece o mesmo tio Joseph que eu conheço. Ele está caindo de bêbado, literalmente. Já o vi embriagado, mas nunca desse jeito. Me aproximo para ajudá-lo, ele parece nem me ver aqui. O ajudo a cair no sofá e depois pego um copo de água na cozinha.

— O que você tá fazendo aqui?- ele pergunta confuso— Cadê a minha filha?

Não respondo, pois estou bravo. Imagino como tia Alex ficaria depois de ver seu marido desse jeito, tenho vontade de gritar. Ele não vai lembrar de nada, nem de que eu estou aqui. Pego um remédio na cozinha e entrego para ele, espero que esteja melhor para aparecer no velório. O deixo ali, estou sentindo a raiva saindo do controle. Subo de novo para o quarto da garotinha e agora ela está acordada, sentada no meio da cama. Sendo ao lado dela, quieto.

Until the last danceOnde histórias criam vida. Descubra agora