Os jogadores passam em alta velocidade no gelo à minha frente. Há muitos palavrões graças a um passe errado da defesa. Anoto tudo na minha prancheta, mas está sendo difícil manter a concentração.
Está tudo igual a quando eu perdi a minha virgindade aos quatorze anos com a minha vizinha Melanie que era a babá dos meus irmãos mais novos quando os meus pais tinham algum compromisso durante a noite. É como se todos me encarassem sabendo o que eu fiz. É como se todos soubessem que na quarta-feira à noite tinha um cara chupando o meu pau dentro do meu carro numa praça do subúrbio.
Eu vejo isso no olhar dos meus jogadores, dos técnicos auxiliares, dos meus irmãos. Principalmente Terrence, ele sabe que eu fiz alguma coisa e está doido para perguntar – eu já me acostumei com o seu faro de detetive certeiro, não dá para mentir para aquele cara.
- Treinador! – Grita Stephen me tirando das minhas paranoias.
Patino até eles para resolver a confusão no meio do gelo. Dois dos meus jogadores trombaram no gelo e gritam ofensas um para outro. É a tensão pré-jogo, amanhã teremos mais algumas partidas e não posso culpa-los por estarem tensos e arrumando motivos para xingar todo mundo, eu também já fui assim, mas é preciso ter disciplina.
- Os dois: cinco minutos fora do gelo e pedido formal de desculpas. – Grito depois de assoar o meu apito por pura formalidade e para deixá-los um pouco irritados.
Os dois patinam comigo para fora do gelo, escuto eles murmurarem um pedido de desculpas um para outro. Apito para sinalizar o reinicio da partida para os jogadores no gelo. O disco começa a voar entre eles. Está tudo sob controle. Hora do discurso motivacional.
- Meninos, eu sei que vocês estão estressados, mas não adianta descontar em nós mesmos. Levem essa raiva para o rinque amanhã e transformem em vontade de marcar pontos.
- Treinador, é difícil ser bom aqui e na escola e em casa...
- Eu sei, eu já tive problemas em casa, na escola, no time, as vezes todos ao mesmo tempo, mas vocês precisam canalizar esse estresse e descontá-lo na coisa certa, não em outro colega do time. Fiquem mais alguns minutos pensando sobre isso, em três minutos vocês voltam ao gelo.
Vejo o jogo se desenrolar a minha frente. Os garotos parecem mais tranquilos no banco e conseguem relaxar quando voltam ao gelo. Simon aparece de repente. Ele tem se mostrado um ótimo auxiliar técnico mesmo não conseguindo uma bolsa para jogar em algum time universitário, ele tem uma ótima visão de jogo e as vezes é um companheiro melhor que os meus dois técnicos auxiliares com anos de experiência.
- Eles estão prontos para amanhã. – Ele diz. – Começaram a ficar meio tensos ontem, mas amanhã não vão nos deixar na mão.
É válido que ele transmita essa confiança aos jogadores e a mim também, já que estou tenso, mas a minha tensão não tem nada a ver com os jogos de amanhã.
- Estão pressionados em ter um desempenho ainda melhor que o da semana passada, mas terei uma nova conversa com eles. – Respondo.
- Connecticut vai jogar hoje aqui em Boston. – Ele comenta despreocupadamente. – Vai acompanhar pela televisão?
- Não, consegui comprar um ingresso ontem.
Não estou muito preocupado em ver Connecticut jogar – por mais que me doa dizer isso – Eu quero assistir Max fazendo sua mágica no gelo, mostrando como fazer um jogo de qualidade e belo, daqueles em que se você piscar, perde todo o lance. Quero ficar orgulhoso por sua vitória, agora eu sou mais do que o seu antigo técnico.