Um piano, um beijo

46 7 0
                                    

Fechando os olhos, Lilian poderia reviver todas as cenas das últimas duas horas. Estavam vívidas e cravadas em seu cérebro. Estirada na cama, deixou-se vagar até o passado recente, relembrando cada cheiro e sensação. Chegou ao momento em que estava na cozinha, esperando o maldito sushi chegar.

James estava ao seu lado. Petúnia mexia no celular, ignorando a presença dos dois. Não era uma noite comum. As risadas habituais foram substituídas por um silêncio taciturno. James começou a batucar no balcão; Lilian fitava o chão. Todos os assuntos haviam morrido quando sua irmã chegou. Ela era uma intrusa na atmosfera de familiaridade que os cercava.

Petúnia deslizava o dedo pela tela do celular. James batucava no balcão. Os ponteiros do relógio arrastavam-se. Tic tac. Tic tac. Tic tac. A sinfonia era estressante, e Lilian fitava mais profundamente o chão. Seus olhos ardiam, seus ouvidos doíam, a mente estava cansada. Fechou as pálpebras com força. Segurou o braço de James.

— Pare! — Ordenou sem olhá-lo.

James apenas saiu da cozinha e dirigiu-se até sala. Ela observou-o e decidiu segui-lo.

— Qual o problema? — Perguntou, observando-o.

James estava de costas; suas mãos prendiam-se em seu crânio e deslizavam pelo cabelo de superfície uniforme. O movimento repetiu-se algumas vezes por um breve momento. Parecia querer reter uma ideia fugidia. Andava em círculos, com os olhos cerrados. Lilian tinha a impressão que ele queria retirar-se daquela casa estranha.

— Qual o problema? Qual o problema, Evans? — Ele virou para olhá-la. — O problema é que desde a chegada da sua irmã você tá estranha, sem dizer uma palavra!

Lilian assustou-se e deu um passo para trás. James ainda não tinha levantado a voz para ela. Não sabia o que dizer. Os olhos negros eram fúria e o verde, pura confusão. Encararam-se por um tempo eterno. Brigavam para ver quem desistiria. James perdeu a primeira batalha. Todavia, Lilian não sentiu a confiança que segue a vitória.

— O que quer que eu faça, Potter? — Sua boca estava seca e a língua era uma lixa áspera entre os dentes. O som de sua voz era quase inaudível nestas condições.

— Não sei — ele jogou-se no sofá — Diga... Algo.

— Eu não sou boa com diálogos. — Não era uma mentira. Não completamente.

— E você é boa em quê, Evans — A pergunta de James causou uma explosão de respostas na mente de Lilian.

A garota sorriu. Foi até ele e segurou sua mão. Estava suada, porém, ela não se importou. O toque quente e tranquilizador vencia a textura da transpiração.

— Eu não posso te contar... — ela não sabia por que estava falando de tal maneira, contudo, já havia iniciado a frase. Restava apenas continuar: — mas eu posso te mostrar.

Dispararam para fora da casa de mãos dadas. Atravessaram a rua, deixando a porta aberta. Lilian voltou a sentir a serenidade que James lhe proporcionava. O sentimento de paz e felicidade. O mesmo efeito da música. Duas drogas, o mesmo poder e intensidade. "Como isso era possível?", a garota se perguntava.

Tocaram a campainha de uma casa amarela e esperaram por alguns minutos. Uma mulher idosa com os fios brancos presos num coque atendeu. Sua face encheu-se de surpresa e nostalgia ao vislumbrar a menina de vestido branco.

— Você tem o mesmo olhar da sua mãe — disse, ainda incrédula com o porte familiar da jovem. Ao perceber a mudança na expressão da garota, arrependeu-se de sua precipitada fala: — Ah, me desculpe! Muita indelicadeza minha dizer isso, querida. — Apertou o robe dourado ainda mais contra o corpo, e afastou-se um pouco da entrada: — Entrem, entrem, entrem!

Lily ApaixonadaOnde histórias criam vida. Descubra agora