Capítulo 1

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Cena

No primeiro plano, de um lado a casa de Lisístrata, do outro a de Cleonice. Ao fundo, a Acrópole, Um caminho estreito e cheio de curvas conduz até lá. No meio dos rochedos, em segundo plano, a gruta de Pã. Lisístrata anda pra lá e pra cá, diante da casa.

LISÍSTRATA - Pois é. Se tivessem sido convidadas para uma festa de Baco isso daqui estaria intransitável de mulheres e tamborins. Mas, como eu disse que a coisa era séria, nenhuma apareceu até agora. Só pensam em bacanais. Ei, Cleonice! Bom-dia, Cleonice!

CLEONICE - Bom-dia, Lisístrata. Magnífico dia para uma bacanal.

LISÍSTRATA - Cleonice, pelo amor de Zeus: Baco já deve andar cansado.

CLEONICE - Que aconteceu, boa vizinha? Tens a expressão sombria, um olhar cheio de repreensão, a testa franzida. O avesso de uma máscara de beleza.

LISÍSTRATA - Oh, Cleonice, meu coração está cheio de despeito. Me envergonho de ser mulher. Sou obrigada a dar razão aos homens, quando nos tratam como objetos, boas apenas para os prazeres do leito.

CLEONICE - E às vezes nem isso. Cibele, por exemplo...

LISÍSTRATA - (Repreensiva.) Por favor, Cleonice. (Pausa.) Não é hora para maledicências. (Pausa.) No momento em que foram convocadas para uma decisão definitiva na vida do país, preferem ficar na cama em vez de atender aos interesses da comunidade.

CLEONICE - Calma, Lisinha! Você sabe como é difícil para as donas-decasa se livrarem dos compromissos domésticos. Uma tem que ir ao mercado, outra leva o filho à academia, uma terceira luta com a escrava preguiçosa que às 6 da manhã ainda não levantou. Sem falar no tempo que se perde limpando o traseiro irresponsável das crianças.

LISÍSTRATA - Mas eu avisei que deixassem tudo. A coisa aqui é muito mais urgente. Muito maior.

CLEONICE - Tão grande assim?

LISÍSTRATA - Acho que nenhuma de nós jamais encarou nada tão grande. Ou nos reunimos e enfrentamos juntas ou ela nos devora.

CLEONICE - Mas, então, se você mostrou a elas a exata dimensão da coisa, não compreendo que não tenham vindo logo correndo, todas! LISÍSTRATA - Ah, Cleonice, que cansaço! Do que é que você está falando? É claro que se fosse o que você pensa ninguém teria deixado de comparecer imediatamente. Mas o problema é muito diferente. Tenho passado noites em claro, me virando na cama prum lado e pro outro sem encontrar uma posição correta diante dele. A todo instante cresce e diminui diante de meus olhos. Não sei o que fazer. Preciso de auxílio. CLEONICE - (Ainda incapaz de levar a coisa a sério.) Será que nós duas sozinhas não podemos reduzir o negócio a proporções menos alarmantes?

LISÍSTRATA - Nós duas sozinhas como, Cleonice? Estou falando da salvação da Grécia.

CLEONICE - Ah, é isso, enfim, a coisa que te preocupa. Pobre Lisístrata, se você pensa que pode salvar a pátria reunindo as mulheres numa praça... Sagrada ingenuidade! Muitos já o tentaram antes... Muitos o tentarão sempre através dos séculos.

LISÍSTRATA - Não com meu plano. Reuniremos todas as mulheres da Grécia, incluindo as beócias e as peloponesas. E acabaremos de vez com as lutas fratricidas, que nos deixam à mercê dos bárbaros que descem lá do norte.

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