Capítulo 5-Tô indo agora pra um lugar todinho meu

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Depois que a baixinha me deu os últimos chutes, saiu dizendo alguma coisa que eu nem conseguia compreender, estava quase que desmaiada.

Começou a chover, e todos os meus machucados ardiam muito. Tentei levantar, minha costela doía e saía muito sangue do meu nariz. Um cara saiu do bar do Viola e me ajudou a levantar.

Entramos no bar e ele me ajudou a chegar até o banheiro, me deixou sentada na privada imunda sem assento e saiu, logo em seguida voltou com um copo de agua e um pano encardido para que eu me limpasse. Tomei a agua e lavei o rosto, limpei o que pude do sangue espalhado em mim e sentei pressionando meu nariz até que parasse de sangrar.

O cara que me ajudou chamava-se Getúlio e me deu uma carona de moto até um ponto de táxi.

O taxista me olhou de cima abaixo, afinal parecia que eu vim de uma guerra, mas me deixou entrar no táxi, apenas forrou o banco do carro com jornal antes.

Sei que eu devia ir direto para casa tomar um banho e me encher de remédio, mas na hora que tudo em minha vida está caótico há apenas um lugar no mundo onde me sinto em paz, segura, onde as coisas parecem voltar a fazer sentido, e era para lá que eu pedi ao taxista para ir.

Na hora de descer do táxi mais uma surpresa agradável no meu dia: Perdi minha carteira!

-- Olha Seu taxista eu perdi minha carteira...-- Ele deu um riso de deboche achando que eu não tinha carteira nenhuma.—Mas fica com isso e me da seu cartão que eu pago a corrida e pego de volta.—Ele brilhou os olhos na correntinha de ouro com uma letra P no pingente cravejada de pequenos brilhantes. A corrente que meu pai me deu quando nasci. Entregou seu cartão e foi embora. Senti que possivelmente nunca mais veria minha correntinha da sorte, mas também, aparentemente na questão da sorte ela não estava funcionando.

Me virei e olhei o muro enorme, e através das grades do portão, a casa fechada. Abri a porta do compartimento de lixo que havia no muro e subi nela, com um pouco de dificuldade devido às dores pelo corpo pulei para dentro. Caminhei lentamente sentindo a vibração boa que aquele lugar sempre me trouxe, e sentei embaixo da árvore enorme onde tive tantos momentos maravilhosos.

Aquele era o meu paraíso, ali, embaixo daquela árvore, vivi tantas coisas incríveis, li livros que me levaram a outros mundos, descobri historias sensacionais, e imaginei minhas próprias historias. Embaixo desta árvore descobri o amor, desenhei meus primeiros quadrinhos, e escrevi minhas primeiras palavras românticas. A árvore da casa onde nasci, o meu lugar no mundo.

Sentei embaixo daquela árvore, alisei seu tronco, e chorei.

--É Leonilda, meu dia tá osso! As vezes eu queria ser Árvore como você, ficar aí paradona fazendo sombra, curtindo o sol, o vento... Sabe, ontem eu tava pensando que...—Nossa conversa continuou, mas não vem ao caso.

Que foi? É, dei nome pra árvore e converso com ela tá legal? E só pra saberem ela é uma grande amiga, ouve melhor que muitas pessoas tá bem? Continuando meu dia, estava lá eu bem tranquila conversando com a Leonilda:

--... É garota, pensa que é fácil? Procurei quase uma semana o esmalte azul da Giovana Antonelle e...—Estava com a cabeça encostada na minha amiga árvore, e de repente parecia que ela estava rosnando tipo... RRRRRRRRRRRR. Afastei devagar a cabeça da árvore e percebi que o som vinha de trás das minhas costas.—Oh merda!

Lá estava eu em mais uma situação agradável do meu dia, correndo de um cachorro dobermann enorme que rosnava e latia enfurecido correndo atrás de mim. Pulei no muro, e o medo faz a gente pular alto viu!

Quando estava quase subindo no muro pendurada, o cachorro pegou meu pé. Lá se vai um pé do sapato do Alcio. Sentei em cima do muro e fiquei olhando o cachorro mastigar o sapato fedido e rosnar pra mim.

E lá estava eu, novamente na rua, sem sapato, sem dinheiro, sem carro, sem lenço e sem documento. Resolvi apelar. Parei no orelhão, disquei a cobrar:

-- Alô, Pai?—Ele estava em um local barulhento cheio de gente.

-- Oi filha que bom que você ligou eu ...chhcc caca um ... gan você pod... chch...

-- Alô Pai, tá me ouvindo?

-- Tô sim, é... Chh... na gráfica e precisamos...chhch... dia terrível...chh cheio de problema... chh... guma idéia porque os nossos cchhhc..., poderia me ajudar?—Me irritei mesmo sem entender a frase toda.

-- Pai, o seu dia não tá pior que o meu!

-- Ótimo filha, maravilhoso, esse não tinha cchhh..como nã..ccchh... tivemos ...cch... ideia... gênio! Te vejo à noite, Beijo!—Agora que fiquei sem entender nada mesmo, ia pedir pra ele me buscar e ele desliga na minha cara, ainda diz que é maravilhoso isso? Será que ele tá ficando maluco?

Me restou ir andando até em casa, machucada, embarrada, cheia de mercúrio, escabelada, com um pé de sapato só, muito maior do que meu pé, com cara de maluca cansada deste dia horrível.

As pessoas na rua me olhavam como se eu fosse um figurante do The walking dead, e eu parecia mesmo. Depois de trocentas horas caminhando, quase sete da noite chego ao meu prédio.

O porteiro quase me barrou pensando que eu fosse um mendigo, mas me identifiquei e ele até pediu desculpa. Nesta altura eu já estava cansada e irritada de mais para entender que no fundo ele estava certo de não ter me reconhecido, ele tentou falar algo comigo, mas eu não quis ouvir nada, o ignorei e subi correndo pela escada.

Ah, a cada degrau que eu subia imaginava como seria bom me jogar na banheira, comer alguma coisa que certamente a Dani ia fazer pra gente, pois a última coisa que eu comi foi um picolé acompanhado de socos, deitar na minha cama e desmaiar, aproveitar que no outro dia ia ser domingo pra dormir até enjoar.

Até aqui você me acompanhou no que acreditou ser um dia infernal, mas nada do que passei se compara com o que vem agora.

Meio de arrasto cheguei até minha porta. Girei a chave e exclamei pra mim mesma:

--Enfim a paz que eu precisava, lar doce... merda!—Minha casa estava vazia. Meus móveis haviam todos sumido e todas as paredes estavam pintadas de rosa. Fitas e fumaça, e umas pessoas circulando para todo lado parecendo ocupadas. Tão ocupadas que nem me viam. Parei no meio da sala e gritei:

--QUE MERDA TÁ ACONTECENDO AQUI?! --Todos pararam e ficaram me olhando. Acreditem, se eu adivinhasse a resposta para a minha pergunta, ao invés de ter perguntado teria saído correndo antes mesmo de entrar e fugido da minha própria casa! Quer saber o que mais de tão terrível pode me acontecer hoje? Olha lá no próximo capítulo!

Ataque das Ex Namoradas Zumbí (não ficção)Onde histórias criam vida. Descubra agora