Capítulo 7 (Júlio Duarte - 16 anos)

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Novamente, ele saiu para ir a outro congresso, porque ele é deputado e precisa de se preparar para enganar mais alguns eleitores. Sim, ele é o meu pai. Ele viaja tanto tempo que raramente estamos juntos, por isso, o que conheço dele é pelos jornais ou pelas pessoas da vizinhança que conversam comigo e contam as histórias de infância dele. Ele traz sempre algum presente e conta-me o que viu na viagem, eu fico muito entusiasmado e peço-lhe se na próxima vez ele pode levar-me, mas nunca aconteceu. Deixei gradualmente de esperar por ele e de sentir saudades dele, perdi o entusiasmo quando ele chegava a casa e a solidão tornou-se uma amiga muito chegada e compreensível. O desfiladeiro entre mim e o meu pai tornou-se tão fundo que nem tinha volta a dar, limitamo-nos a falar o básico e nada mais, e a raiva de ele preferir a política em vez do próprio filho é muito revoltante.

Em compensação, tornei-me mais próximo da minha tia Sara, ela juntou-se com o meu pai quando ela (a mãe) nos abandonou e tornou-se minha madrasta, mas considero-a como uma amiga porque ela é bastante jovem e compreensível comigo. Quando o pai sai para ir a outro congresso ou reunião, ela sabe que fico irritado porque ele nunca passa tempo comigo e ela vem conversar comigo, traz-me algo para comer e eu fico mais calmo. Não posso vê-la como mãe nem tia porque nó só temos meia-dúzia de anos de diferença e ela sempre me tratou como alguém que ela gosta e cuida. Tenho uma grande admiração por ela e prefiro passar as noites a ver filmes e rir com ela do que sair com os meus amigos para as discotecas. Sei que posso confiar nela porque ela conhece muitos segredos e medos, e protegeu-me sempre, por isso, estou sempre ao lado dela quando ela precisa.

Jantámos apenas os dois como já é normal desde que nasci, e chove um temporal na rua, a tia Sara arrepia-se porque não gosta de chuva, lembra-lhe das alturas que dormiu ao relento e a sua batia no corpo como pequenas agulhas afiadas. Passei a mão na dela para a tentar tranquilizar e sorri-lhe amavelmente, ela correspondeu-me, mas ainda tem os olhos tristes e medrosos. Tomámos um chá reconfortante no sofá e quando ela já estava mais calma, estalou um trovão enorme no céu, fez-se um clarão semelhante ao acender de uma lâmpada e o estrondo fez eco dentro de casa como uma explosão.

Ela deu um grito com o susto, escondeu a cara com a outra mão e tentou respirar fundo, mas a cara dela dizia que ela não está nada bem, pensei que ela desmaiasse com o medo, por isso, abracei-a e tentei reconfortá-la. Ela treme tipo um martelo a bater no metal e a respiração é misturada com os saluços, o tempo continua a piorar e os trovões são mais constantes, quase apostaria que estavam mesmo por cima de nós. Sei que não é bom ter luzes acesas nestas alturas, portanto, tratei de apagar tudo e às escuras, nós ficamos em silêncio e com as mãos dadas a pedir que a chuva acabasse. Eu sinto-me bem com o tempo, mas fico ansioso porque sei que ela fica com medo e ela faz tanto por mim que queria poder ajudá-la a superar este medo.

Depois de algumas horas, as trovoadas passaram e a chuva abrandou, e finalmente, pude ir deitar-me na minha cama, despedi-me meio à pressa dela e fui dormir. Adormeci instantaneamente, a cama macia soube ao paraíso descrito na bíblia e o corpo derreteu-se feito um gelado ao sol, deixei-me cair no sono e no sossego da casa. Parte de mim quer ficar alerta para o caso da tia Sara se assustar outra vez com a chuva, mas a maior parte de mim, está completamente exausta e não aguenta remar contra o sono, por isso, acabei por cair nos pensamentos compreensivos e carinhosos e adormeci sem dar conta. Para piorar, comecei a sonhar.... Tenho sempre medo de sonhar porque não sei o que faço nem o que digo, e tenho medo de que alguém descubra os meus pensamentos com estes sonhos ou que me controle através dos sonhos transformando-os em pesadelos.

Estou na minha cama, no meu quarto e ainda é de noite, isso deixa-me mais tranquilo, respiro fundo e colocando-me de barriga para baixo, na posição que mais gosto de dormir. O corpo semi-nu relaxa e aprecia o fresco que está a sentir-se em comparação com o calor da rua, a aragem sabe mesmo bem... Nos segundos a seguir, abre-se a porta e, estranhamente, não me movi para ver quem é, deixei-me ficar no mesmo sítio, mas atento aos passos.

O Amor e a Morte, vencem o mais forte (Edição Especial)Onde histórias criam vida. Descubra agora