Petrus é um homem que não conhece o amor. Nasceu de um relacionamento conturbado, passou por poucas e boas na infância e adolescência.
Já um homem feito, tem que voltar ao lugar onde viveu seu inferno particular e que ganhou o seu apelido: Diabo, p...
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Alícia
Que homem mais insuportável, meu Deus do Céu! Vontade de socar aquela cara dele até o seu sorriso está completamente banguela, tipinho presunçoso, me dando ordens como se eu fosse uma subalterna dele mas se ele está pensando que vou facilitar as coisas para ele, está redondamente enganado.
Respiro fundo mais uma vez, ligo o carro e saio pelas ruas de Nova Calamária num total contraste. Enquanto o trânsito está calmo, eu me encontro em um turbilhão de emoções: raiva dele e do que Henrique me fez, indignação por toda essa situação, ódio por ter sido tão cega .
Chego em casa um pouco mais calma depois de rodar por um tempo e ainda digerindo toda as informações daquele dossiê. Gorete e Natasha estão na sala vendo pela centésima vez o filme preferido da minha ruivinha: Frozen. Sorrio com a ironia da vida pois eu não poderia estar mais numa fria do que a princesa gelada. Passo por elas avisando que vou tomar um banho para tirar a sujeira da rua mas que logo me juntarei a elas.
De banho tomado e uma roupa confortável me junto na sala para ver o finalzinho do filme. Dou a janta para uma Natasha empolgada falando pelos cotovelos sobre quem é sua personagem favorita Elsa, e Gorete diz que a sua é a Moana, ambas travam uma disputa sobre as qualidades das suas escolhidas e a diferença entre os desenhos. Depois de brincarmos um pouco de nos maquiar, claro que Natasha nos besuntou de todas as cores possíveis das paletas que a Gorete deixa aqui em casa, sinto que a madrinha da minha filha está impaciente querendo saber sobre tudo o que rolou mais cedo e resolvo dar a brincadeira por encerrada.
Enquanto vou dar um banho na minha menina e a colocar para dormir, minha melhor amiga ajeita a sala para que enfim possamos conversar.
Quando chego na sala depois de um longa batalha para acalmar a minha ruivinha pois parecia que sua bateria não iria acabar nunca, Go já me espera com duas tacas de vinho e vejo o quanto ela me conhece. Ela pergunta na lata, sem rodeios.
— Como foi lá com o tal cara, o suposto assassino do Rique? Chamou a polícia pra ele? Ele já está atrás das grades?
— Ai amiga, as coisas saíram totalmente ao contrário do que imaginamos. O tal Petrus me provou por A+B que não tem nada a ver com a morte do Rique e ainda por cima pagou a dívida que resultou na morte dele.
Incrédula Gorete me olha como se eu tivesse 3 olhos.
— Como assim ele pagou a dívida? Isso deve ser armação dele, Ali. Ele deve estar fazendo isso para abafar o assassinato. Quem garante que ele não coagiu o Rique a assinar os documentos?
— Gorete, ele fez um dossiê e tem todas as transações de apostas do Henrique. Todos os lugares que ele frequentava para jogar. Como pude ser tão ingênua? Como nunca percebi? Ele estava sempre à noite conosco aqui em casa, quando não estava no restaurante. Eu não conhecia o meu próprio marido, porque o que vi nesses papéis me mostram um homem completamente diferente. – empurro o envelope que recebi mais cedo no escritório daquele homem ridículo.
Gorete abre e lê com calma enquanto encho nossas taças e pego mais uma garrafa de vinho.
— Meu Deus Alícia, o Henrique não estava em seu juízo perfeito quando fez isso. Deve ter alguma explicação para tudo o que está aqui.
— Sim, com certeza deve haver uma explicação mas infelizmente a única pessoa que poderia nos dar, já não está entre nós. O Henrique não só ferrou com a vida dele, como acabou com a minha e da Natasha, Go. Estamos sem nada. Sem restaurante, sem casa. A partir de agora, sou apenas uma funcionária sem poder de decisão.
— Estou passada. Passada não, indignada. Como isso é possível? Digo legalmente, ele não pode te tirar nada Ali. Você é tão dona de tudo quanto o Henrique é ou melhor era. Você tem que entrar na justiça amiga, se não por você, pela a Nat. Ela tem direitos, a parte dela no caso da morte do Rique. – Gorete fica de pé, andando de um lado para o outro.
— Go, estou tão indignada quanto você. Hoje eu descobri que não conhecia o homem que dividia a cama comigo por mais de 7 anos. Foi preciso um estranho vir me esfregar na cara, toda a farsa que eu vivi esses anos todo. O Henrique me deixou de fora de tudo. Da casa, do restaurante. Eu só era dona da boca para fora.
— Isso não pode ser verdade, Alícia. Vocês assinaram os papéis da compra da casa e do restaurante. Eu estava aqui nesse dia, nós comemoramos com champanhe e tudo.
— Eu também achava isso minha amiga e como nunca desconfiei do meu marido, assinei sem ler nada. Me deixei levar pela a alegria e emoção mas no final das contas, o meu nome nos contratos consta só como testemunha. No restaurante, sempre que precisava resolver algum assunto jurídico, era o Rique que ia. Nem mesmo o seu irmão, que é o advogado sabia disso. Ontem quando ele me foi lá no Miklos me ver, ele já tinha descoberto tudo e estava tão abismado quanto eu. Ele me jurou que não sabia de nada. Que o irmão nunca pediu sua ajuda ou sua consultoria mas me garantiu que a documentação desse tal de Petrus é verdadeira.
— E agora amiga, você vai ter que sair daqui? Vai largar o restaurante? Essa cara vai te deixar com uma mão na frente e outra atrás? Me passa o endereço dele agora, que eu vou lá dar chute nas bolas dele. Elas vão parecer duas nozes no cérebro dele quando fizerem a autópsia, porque depois de chutar eu vou matá-lo por te deixar na rua da amargura.
Só mesmo a Gorete para me fazer rir neste momento, ou será que são as duas garrafas vazias sobre a mesa e a terceira pela metade?
— Sossega esse facho aí baixinha invocada. Você não vai matar ninguém, agora quanto a chutar as bolas dele... Eu iria adorar ver aquele diabo falando fino. – caímos as duas na gargalhada, mesmo que Go fique irada quando alguém a chama de baixinha. Como se ela não tivesse 1,58.
— E o diabo em questão, é bonito pelo menos? É do tipo que faz meninas santas como nós, querer pecar e passar a eternidade ardendo nos braços, no meio das pernas, com a língua do “Coisa ruim” em nosso corpo todo?
— Ele é do tipo: Quem vê cara, não vê coração. Isso é, se ele tiver coração. O cara é presunçoso, arrogante, cheio de si, estúpido, cretino, arrogante, se acha a última Coca Cola do deserto, a última bolacha do pacote, já falei arrogante?!
— Eita, que você descreveu o Cão em pessoa mas não me disse realmente se o Diabo é bonito?
— Você poderá ver por si mesma. A partir de segunda feira e por mais 18 meses, eu vou dividir a casa e o restaurante com o Diabo. E se no final desse tempo, eu provar para ele que o restaurante dá lucro e que eu posso gerir tudo sozinha, ele passa tudo para o meu nome.
Gorete fica boquiaberta me olhando e eu finalizo o meu vinho tendo a certeza que terei os 18 meses mais longos e louco da minha vida.