A cabeça de 2-D doía. E doía muito. Havia anos que uma dor lancinante assim não o atormentava, talvez desde quando perdera por completo o azul de seus olhos.
Seu despertar era sempre dessa forma: calmo, bagunçado, ansioso e dolorido. Mas nem sempre era exatamente nessa ordem. Ainda assim, havia algo diferente desta vez. Não estava acomodado em travesseiros fofos e confortáveis, não estava repousando em um ambiente calmo de hospital. Aliás, ele nem ao menos estava parado.
Ainda de olhos fechados, 2-D sentia seu corpo balançar de lá para cá, mas estava quase certo de que estava sentado. Havia uma rajada de vento golpeando seu rosto, fazendo com que os fios de seu cabelo azul se agitassem contra o que quer que fosse que estivesse apoiando sua cabeça. Um ronco muito alto e mecânico parecia querer lhe furar os tímpanos, mas, ainda assim, podia ouvir uma respiração acelerada e meio cortada ao seu lado. Em algum outro ponto próximo, sons metálicos tilintavam de quando em quando.
- Careca desgraçado!
2-D abriu os olhos sobressaltado quando, ao seu lado, Murdoc urrou desgostoso. Já muito bem desperto e agarrado ao estofado sob suas coxas, olhou a sua volta para ter uma noção básica do cenário. O trio estava novamente na estrada e, ao que tudo indicava, fugindo do mesmo penetra que havia invadido a Kong; o líder dirigia alucinado, quase como se pudesse fazer o Stylo voar somente com o poder de seus pensamentos; no banco traseiro, a cyborg empunhava suas armas, pronta para um novo embate – ignorando totalmente o enorme furo que faiscava em sua testa.
- Ah... – 2-D lamuriou-se enquanto agarrava-se ainda mais em seu assento, a cabeça latejando.
- Vejam só quem acordou dos mortos. – Murdoc resmungou ao seu lado olhando-o de esguelha. Sua atenção estava totalmente voltada para a pista a sua frente e ao retrovisor, mesmo que só houvesse apenas o Stylo e o veículo vermelho colado em sua traseira na rodovia. Nem mesmo o alívio interno do despertar de 2-D seria capaz de fazê-lo desviar o olhar.
À suas costas, 2-D escutou a cyborg empunhando uma de suas armas, com o som característico de quando se a deixa engatilhada. O azulado engoliu um seco quando observou, hesitantemente, o rosto da máquina pelo retrovisor interno. Sua face metálica exibia um semblante aterrorizantemente sério e compenetrado. Mesmo pelo pequeno espelho, 2-D sabia que ela o fuzilava com os olhos. De onde vinha todo aquele ódio? Se a cyborg fora feita para ser a cópia de Noodle, então por que parecia querer sempre uma carnificina?
Enquanto o vocalista colocava suas ideias no lugar, Murdoc fez uma série de desvios que fez seu cérebro balançar. Ele envolveu a cabeça com as mãos imediatamente, numa tentativa de diminuir o efeito das manobras. Seus olhos fecharam-se com força no mesmo instante; mantê-los assim parecia oferecer algum consolo. Do lado de fora, o careca parecia bastante confiante ao acertar em cheio o retrovisor de Murdoc.
Embora percebesse o desconforto de 2-D, não havia muito o que o líder pudesse fazer, visto que já tentava – da maneira que podia –, salvar a pele dos três. Mesmo assim, tentou reduzir os movimentos bruscos o máximo que pôde, em resposta do ardor crescente que ainda estava encravado em seu peito e parecia agora espalhar-se pelo fundo de seu abdômen. Mas que diabo era aquilo?
Assim como 2-D percebera antes, o penetra realmente não parecia querer dar trégua. O que quer que Murdoc tivesse feito a ele, não parecia que seria esquecido ou perdoado tão cedo. O homem havia encontrado o trio nos arredores de Lingfield, quando Murdoc – sem saber que havia sido seguido depois de incendiar a Kong –, corria com o Stylo em busca de um hospital para 2-D.
Mas a visita do azulado ao médico havia sido adiada, pois, no mesmo instante, o homem pôs-se a perseguir e atirar no veículo, levando Murdoc a deixar a freguesia às pressas, sem que um atendimento digno fosse oferecido ao vocalista. Por sorte, o líder tinha certa experiência com os acidentes de 2-D, visto que fora ele próprio quem provocara a maioria deles. O rapaz ainda parecia estar vivo e, ao julgar pela aparência, continuaria assim.
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Gorillaz: Make Me Feel Good
FanfictionDepois de Paula Cracker, o coração do doce e gentil 2-D se fechou para tudo e qualquer pessoa que tentasse transpor a armadura que ele criou para si próprio em autodefesa. Ele só não imaginava que não conseguiria ser capaz de impedir que o tiro de u...