Jantar

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Boa noite. 😌

Lembrem de comentar, curtir e me dar os biscoitos que eu mereço.

Boa leitura, até já.

TT: @umamabs

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Nota da autora: O primeiro parágrafo (em itálico) pode conter gatilhos, sugiro a quem seja sensível a relatos de abuso começar a leitura pelo segundo parágrafo.

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POV GIZELLY

As mãos em meu corpo me sufocavam. Eu me culpava por não ter forças para impedir. Não falar, eu não podia falar, eu não tinha ninguém para falar. Os olhos escuros que me encaravam quando, por milésimos de segundos, eu abria os meus me mandavam ficar em silêncio, era a única maneira de tudo ser pelo menos suportável. E quando tudo acabava, o único sentimento que eu nutria dentro de mim era de que eu estava suja. Eu sentia nojo.

Os pesadelos sempre voltavam quando eu estava prestes a um lançamento, me ver em uma livraria de shopping, com uma fila de pessoas na minha frente, aguardando por uma simples assinatura minha, era desesperador, sufocante. Eu não via hora de acabar. Por dentro apavorada, por fora um sorriso enorme se instalou em meu rosto. Eu aprendi a disfarçar bem as minhas aflições, assim como havia aprendido a me impor e me defender com o passar do tempo.

Marcela colocou a mão em meu ombro e eu assustei um pouco, mas assim que reconheci a voz ao meu lado relaxei. - Já está acabando, bichinho. Passa de meio dia, vamos comemorar quando sair daqui, é só um jantar.

- Ma, a única coisa que quero fazer quando sair daqui, é ir pra minha casa. - O mau humor deu sinal pela primeira vez aquele dia. Ela fez de conta que não ouviu e saiu de perto de mim.

...

Uma arquitetura elegante nos saudou ao chegar no Nau Frutos do Mar que ficava em Capim Macio, nós mal entramos e já dava para sentir no ar que eu não iria me sentir à vontade, por mais aconchegante que fosse o lugar, o restaurante estava lotado. Marcela e Luiza entraram na minha frente, de mãos dadas. Eu as segui, me forçando a não dar meia volta. Mas uma mesa estava reservada para nós, a nossa espera em um ambiente mais tranquilo que o resto do lugar.

- Você disse que estariam nos esperando. - Questionei Marcela sobre as pessoas da editora não estarem no restaurante quando chegamos.

- Eles estariam, mas eu falei pra eles que você preferia uma comemoração mais intimista e pedi para que cancelassem o jantar com todo mundo. - Ela me lançou um olhar cúmplice e eu sorri de volta.

- Se eu não soubesse que são como irmãs, ficaria com ciúmes desses olhares. - Luiza nos interrompeu e Marcela a olhou com um sorriso enorme.

- Você não precisa se preocupar, esse mulherão aqui só tem olhos pra você. - Elas selaram os lábios e eu coloquei as mãos em meu rosto. - Gigica é só minha irmãzinha mais nova, veja como ela se comporta como uma criança quando nos beijamos. - Eu estava fazendo graça, algo que não acontecia muitas vezes, nem por muito tempo, mas estar na companhia das minhas amigas era algo que me fazia sentir um pouco mais de segurança.

Marcela sempre me tratou como irmã mais nova, mesmo que a pequena diferença de idade entre nós não justificasse esse comportamento, o que justificaria seria a necessidade que ela sentia de me proteger de tudo que existia em mim. Tudo que eu silenciei por anos, ela sabia, só porque ela sabia como me fazer falar. Ela sabia como me deixar a vontade mesmo que o ambiente não ajudasse.

- Não se preocupe, Lu, Marcela não faz meu tipo. Eu não gosto de loiras sonsas. - Falei antes de tomar um gole do vinho que o garçom acabara de me servir.

- Prefere morenas de olhos verdes, não é? - Eu cuspi o vinho.

- O que você está insinuando, Marcela? - Luiza perguntou com um sorriso divertido brincando em seu rosto.

- Gizelly deu o número pessoal dela pra fotógrafa que fez as fotos da capa. - Arregalei meus olhos para ela.

- Eu queria saber como as fotos iriam ficar antes que a gente mandasse para a editora.

- Mentirosa. Não foi o meu número, nem o meu e-mail que estava escrito naquele papel. Muito menos os números e e-mail do escritório. - Luiza estava com a boca aberta.

- Veja só, temos uma atacante entre nós. Camisa 10? - Ela perguntou a Marcela.

- Não, acho que ainda tem muito feijão com arroz pra comer. Mas passar o número pessoal já é um grande passo para nossa Gigica. - Marcela fez um coração com as mãos. - Estou orgulhosa, bichinho.

- Quando me chama de bichinho é só pra me convencer a não ficar brava com você. - Revirei meus olhos.

- Ainda bem que me conhece bem e sabe como funciona nossa relação. Mas antes de você me conhecer, sabe que eu te conheço e que seu número pessoal não é algo que você passa para todo mundo. Acho que por muito tempo eu fui a única que soube da existência dele. - Eu encolhi os ombros.

- Isso é um absurdo, eu nunca tive esse número e alguém chega do nada e consegue ele assim? - Luiza se fez de ofendida.

- Você sempre falou comigo através da Ma, para de drama, Luiza. - Eu levei a taça de vinho mais uma vez até minha boca. - E ela só me mandou as fotos mesmo. - Falei com a taça ainda em minha boca, tentando disfarçar e deixar inaudível o que eu acabei de falar.

- Tá vendo? Você esperava outro tipo de contato. - Eu estava vermelha e desconfortável com aquela conversar. - O que ela falou no e-mail em que enviou as fotos?

- Pediu um feedback.

- E o que você respondeu? - Marcela levantou uma sobrancelha.

- Eu não respondi, só encaminhei as fotos que eu escolhi para a editora. - Luiza colocou as mãos no rosto, impaciente.

- Você recebeu as fotos por um e-mail do estúdio ou do dela? - Ela perguntou enquanto massageava as têmporas.

- Rkalimann alguma coisa. Não tenho como saber se foi do estúdio. - Marcela inclinou a cabeça e apertou os olhos.

- É o pessoal. As fotos que você jogou no lixo do outro ensaio foram enviados para o e-mail do escritório por um rkstudio. - Ela estava com o celular em mãos, conferindo qual o e-mail do estúdio. - Você vai dá esse feedback agora. - Ela tentou pegar meu celular que estava ao meu lado na mesa, mas eu fui mais rápida.

- Não vou não. Fique longe do meu celular, Marcela. - A tentativa de intromissão dela me deixou irritada. - Vamos terminar de comer, em silêncio. - Frisei a parte do silêncio, queria acabar com aquele assunto. - Eu quero ir para minha casa logo, não dormi bem a noite passada. Estou cansada.

- Porque não dormiu bem? - Marcela ficou séria e me fez encolher com seu olhar questionador.

- Tive pesadelos de novo. - Falei com indiferença fingida antes de colocar mais uma garfada de comida na boca.

- Você devia voltar a conversar com sua psicóloga. Se não quiser falar com a mesma, podemos procurar outra que você também goste.

- Sim, eu sei. Mas depois conversamos sobre isso. - Encerrei o assunto e continuei a comer.

Desarrumar - GiRafaOnde histórias criam vida. Descubra agora