No dia seguinte, ao terminar de comer, tomar banho e me vestir, o sangue do feérico já havia sido limpo.
Tinha me demorado de manhã, e era quase meio-dia quando cheguei ao topo das escadas e olhei para o vestíbulo abaixo. Apenas para me certificar de que tinha sumido.
Eu estava determinada a encontrar Tamlin e explicar — de verdade — o quanto eu sentia por Andras. Se era para eu ficar ali, ficar com ele, então poderia ao menos tentar consertar o que tinha destruído.
Olhei para a enorme janela atrás de mim, a vista tão ampla que eu conseguia ver até o reflexo do lago depois do jardim.
A água estava tão calma que o céu vibrante e as fofas nuvens gordas acima eram impecavelmente refletidos.
Perguntar sobre eles parecia vulgar depois da noite anterior, mas talvez... talvez depois que as tintas e os pincéis chegassem, eu pudesse me aventurar até o lago para retratá-lo.
Eu poderia ter ficado encarando aquele borrão de cor e luz e textura caso Tamlin e Lucien não tivessem surgido de outra ala da mansão, discutindo alguma patrulha ou outra da fronteira.
Eles ficaram em silêncio quando desci as escadas, e Lucien disparou porta afora sem nem dar bom dia — apenas um aceno casual. Não um gesto cruel, mas ele obviamente não tinha intenção de participar da conversa que Tamlin e eu estávamos prestes a ter.
Olhei em volta, torcendo por algum sinal daquelas tintas, mas Tam apontou para as portas abertas pelas quais Lucien tinha saído.
Do outro lado, vi nossos cavalos, já selados e esperando.
Lucien estava montando em um terceiro cavalo.
Virei para Tamlin.
Ficar com ele; ele me manteria segura, e as coisas melhorariam. Tudo bem. Eu podia fazer isso.— Seus suprimentos só chegam amanhã, e a galeria foi limpa, e minha... reunião, adiada.
— Ele estava... balbuciando? — Pensei em sairmos para um passeio, sem nenhum assassinato desta vez. Ou um naga com que se preocupar.
— Mesmo quando terminou com um meio sorriso, a tristeza passou pelos olhos de Tamlin. De fato, eu vira bastante morte nos últimos dois dias. Bastante morte de feéricos. Morte de qualquer coisa. Nenhuma arma estava embainhada na lateral do corpo de Tamlin, ou em seu boldrié, mas o cabo de uma faca reluziu na bota.
Onde ele havia enterrado aquele feérico? Um Grão-Senhor cavando um túmulo para um estranho. Talvez eu não tivesse acreditado se me contassem, talvez não tivesse acreditado se ele não tivesse me oferecido asilo em vez da morte.
— Para onde? — perguntei. Tamlin apenas sorriu.
*Não consegui pensar em palavra alguma quando chegamos — e soube que mesmo que conseguisse pintar, nada teria feito justiça.
Não era simplesmente pelo fato de aquele ser o lugar mais lindo ao qual eu já visitara, ou por que ele me enchia de desejo e alegria, mas apenas parecia... certo.
Como se as cores e as luzes e os padrões do mundo tivessem se unido para formar um lugar perfeito — um verdadeiro pedaço de beleza.
Depois da noite anterior, era exatamente onde eu precisava estar.
Sentamos em uma colina gramada que dava para um campo de carvalhos tão amplo e alto que poderiam ser os pilares e as espirais de um castelo antigo.
Tufos trêmulos de sementes de dente-de-leão flutuavam, e a terra na clareira era coberta de açafrões, amarilidáceas e jacintos. Era uma ou duas horas depois do meio-dia quando chegamos, mas a luz estava forte e dourada.
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Corce de espinhos e rosas
Romanceconta a história de Feyre, uma humana que vive na extrema pobreza e tem que se virar sozinha para sustentar suas duas irmãs e seu pai. O mundo em que ela vive é dividido entre humanos e seres mágicos chamados feéricos, considerados assassinos cruéis...