Capítulo 20

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Tic. Tac.

Tic. Tac.

— Quando se sentir pronto — estávamos há mais de dez minutos em silêncio, sendo audível somente o som do relógio na parede que incansavelmente ressoava a cada segundo.

Me diz, em pleno século vinte e um, quem tem um relógio tic tac com barulho?

É de propósito, só pode! O paciente fica impaciente e começa a falar para não ter que prestar atenção no toc infernal.

Finalmente ouvi o conselho das duas psicólogas da minha vida e procurei por um especialista, ainda hoje será meu primeiro encontro formal de pai e filho e eu estou uma pilha de nervos.

Cheguei a vomitar ontem, por isso ao perceber que foi um sintoma psicológico eu decidi marcar com o doutor, que depois de um leve suborno do Eddy conseguiu uma consulta ainda hoje.

Mas agora estou aqui e nem sei por onde começar.

— Eu vou ser pai — joguei do mesmo jeito que fiz com a Angel.

O doutor assentiu, seu rosto continuou ameno e ele não expressou nenhuma alteração, mas pelo menos eu tinha dito alguma coisa após as apresentações formais.

— Ótimo, vamos começar por aí, descobriu quando? — ele anotou no caderninho rapidamente e repousou o braço na poltrona sem deixar de me analisar.

— Um mês? Talvez menos — respondi indeciso, nem sei dizer em que dia estamos.

— É recente então.

— Ele tem catorze anos — expliquei e ao contrário de todo mundo, ele não se assustou.

— E como se sente com isso?

— Como eu deveria me sentir?

— Não tem uma resposta certa ou errada — bati no braço da poltrona e olhei para a janela de vidro que tinha a vista da famosa e movimentada Savile Row.

— Então não sei para que tudo isso — apontei para o ambiente.

— Só quem pode me dizer como se sente é você — explicou o óbvio.

— Mas tem que me dizer como tenho que me sentir.

— E algo que eu disser vai te fazer se sentir diferente?

— Essa é ideia — suspirei cansado.

— Se eu ou algum psicólogo tivesse esse poder as coisas seriam muito mais fáceis — pela primeira vez vi seu senso de humor.

— Certo. Estou confuso, angustiado talvez — pensei um instante. — A verdade é que eu não faço a mínima ideia de como me sinto ou como tenho que me sentir.

— Não costuma expressar seus sentimentos?

— Acho que até expresso, mas nunca parei para perceber se estou fazendo ou não.

— Podemos começar por aí, o autoconhecimento é uma ferramenta importante e você vai perceber que alguns detalhes te fazem entender coisas nunca percebidas antes.

— E como eu começo a fazer isso?

— Vamos fazer uma tarefa essa semana, quando estiver com esse sentimento de confusão, angústia, ou algum que queira trabalhar, pare para perceber o que está acontecendo ao seu redor, se for preciso anote que discutiremos na próxima sessão.

Assenti pensando sobre isso, é uma tarefa um pouco esquisita se for pensar bem, onde eu anotaria uma coisa dessas? Como anotar? Algo tipo "estou no meu quarto pensando sobre ter um filho que calça quarenta"?

Infinitamente MinhaOnde histórias criam vida. Descubra agora