12. Go to Hell

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Dedos frios tocaram-me, e uma luz ofuscante me atingiu, como ondas formando estranheza em meu estômago. Frio e escuridão em seguida, antes que se dissipasse. Mas ainda existentes simultaneamente, como riscos vivos de relâmpagos pulsando dentro de mim, mesmo quando o solo pareceu diferenciado sob meus pés.

Fios de meu próprio cabelo acariciaram minhas pálpebras antes que eu retornasse a abrir os olhos, notando toda a área peculiar que me encontrava; e o que deixei para trás. As prateleiras enfileiradas e organizadas em letras alfabéticas, deram lugar a árvores altas, coberta por folhagens densas, assim como o solo estranhamente macio. Olhos âmbar cintilaram na escuridão, e eu os encarei antes de me dar conta do sorriso divertido nos lábios.

— Onde estamos? — questiono, minha voz desaparecendo em meio a sons de animais noturnos, cigarras, e o vento que viajava através dos galhos, forte o suficiente para movê-los.

— Na floresta onde eu morri. — instantaneamente, minha pele reage ao que ele diz, erguendo os pequenos pelos em resposta. Onde ele morreu. Encarei meus próprios pés para me certificar de que não pisava em restos de ossos e carne pútrida.

— Estava de dia à poucos minutos atrás...— minha voz falha outra vez, e encarei a lua acima de nós. Cheia e bela. Quase hipnotizante.

— Tivemos que atravessar por horas devido ao pouco poder que armazeno, trazê-la até aqui instantaneamente exigiria de mim uma força que não possuo.

Atravessar. Por horas. Horas. A sensação foi que se passaram segundos, e estávamos em um processo de travessia incompreendida por horas. Mantive a perplexidade distante de minha face, ajeitando minha postura. Galhos se quebrando foram ouvidos com o movimento sutil.

— Bem neste lugar está localizado a fenda ou a porta entre a Terra e o inferno. Não é visível para humanos, apenas para seres celestiais. Isto é, se um único feixe dela for aberto. — a luz do luar banhou uma pequena parte do rosto de Justin, que aos poucos perdia sua coloração habitual. Me perguntei o quão fraco ele estaria para ter deixado visível metade de seu rosto deformado por um tempo, e o quanto de sua magia teve que utilizar para esconder o lado bestial.

O fato era que ele aos poucos parecia cansado, desgastado. O próprio corpo demonstrava pequenos sinais de putrefação, apenas pelo modo como sua imagem estava distorcida, mais ainda após a travessia.

— Quando for aberto, apenas eu poderei passar. Porque fui concebido na Terra. Nenhuma outra criatura poderá ultrapassar o limite. Ficou claro? — disse ele, e um suave levantar de sua sobrancelha demonstrou que ele aguardava por uma resposta; algum sinal de entendimento.

— Como abrimos? — dessa vez, firmeza fortaleceu meu tom. Não que coragem fosse a principal emoção, mas porque apenas com aquilo estaria salvando aqueles que amo. Talvez por um tempo.

Acompanhado por sons sibilantes de folhas em movimento, Justin se aproximou, e com delicadeza surpreendente pegou em minha mão, estendendo a palma diante de si. Sussurros e o zumbido clamaram no mesmo tom, e os lábios do homem se moviam naquele ritmo. Uma outra língua, percebi. A linguagem do inferno.

Senti mais do que vi o corte sendo feito no centro de minha mão, e eu reprimi o ruído de dor antes de notar que ele tinha feito com uma lâmina. No espaço entre nós, Bieber inclinou meus dedos e permitiu que sangue rúbido deslizasse quente por eles, manchando a folhagem lameada.

No momento seguinte, pensei estar vendo uma pequena fenda flutuante e brilhante no espaço que mantemos, e ao encarar a íris de Justin, percebi que não era a única a notar aquilo. Ele permanecia a sussurrar a oração em outro idioma, e a luz dourada emitida pareceu mais forte.

— Preciso de mais do seu sangue. — disse ele rapidamente, ao passo que retornou a cantarolar frases repetidas e incompreensíveis.

— Pegue. — sibilei apenas. Sem arrependimentos. Sem culpa. Um olhar sugestivo encarou-me de volta, a luz iluminado do queixo para cima.

— Precisará morrer por isso.

— Isso não estava em nosso trato. — puxei a mão de volta, e a fenda diminuiu a densidade antes de desaparecer com a mesma rapidez com que apareceu. Conforme abri e fechei os dedos, o corte se fechou; a cicatrização mais rápida do que eu jamais vira.

— Estava, só não foi mencionado por não ser tão importante. — as mãos de Justin, que antes suportavam as minhas, pendiam ainda no ar.

— Minha vida não é importante? — gritei, e sons de pássaros se afastando, assim como animais terrestres foram ouvidos. A face peculiar e cansada permaneceu monótona.

— Não quando poderá morrer e viver quando for necessário. Sua espécie não pode ser morta, Winchester. Você irá morrer temporariamente.

— Irei pro inferno como você?

— Como assim?

— Irei? — Insisto, sabendo que talvez ele quisesse uma troca de lugares e não permitiu que eu soubesse disso. Ou não fora mencionado.

— Quando meu pai, Lucifer, mandou que os cães do inferno dilacerasse meu corpo até tirar minha vida, sangrei exatamente neste ponto. — ele fez uma pausa, apontando exatamente para onde meu sangue agora secava e parecia negro. - Isso garantiu minha passagem direta para o inferno. Porque é o DNA de Lucifer que corre em minhas veias, sangue de demônio que jamais deveria estar na Terra. Entretanto, você foi feita por Deus, gerada e concebida na Terra. Portanto, seu lugar é aqui, e sua entrada é restrita no inferno.

Pensei. Pensei e repensei. Justin esperou pacientemente enquanto lutava internamente, convencendo a mim mesma a cometer aquele erro. Por mim. Por eles. Precisava do conhecimento que somente ele poderia me fornecer, e também precisava de meus amigos e familiares vivos. Mesmo que ele não tivesse forças para me causar grandes danos àquela altura, em algum momento ele teria. E viria atrás de mim e dos meus.

— Certo, pode começar.

E a oração retornou, e fechei os olhos quando Justin passou para trás de meu corpo, colocando a lâmina à frente de meu pescoço. Mantive meus músculos imóveis, consentindo àquilo, desejando àquilo. Era a minha salvação, e a dele. A lâmina passou por minha garganta e o som de carne rasgando instalou em minhas vias auditivas antes mesmo da dor pungente me fazer engasgar com meu próprio sangue. A visão turvou no segundo seguinte, e no outro tudo queimou em escuridão.

Tão rápida e súbita quanto à vida, era a morte. Gélida e quente, até que nenhuma dor lhe atinge. Apenas paz silenciosa e alta.

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