Droga de nostalgia

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• Pov Dulce •

Sentei-me à mesa do café com Matt e Eleanor. Eles conversavam sobre algum assunto no qual eu não prestara muita atenção. Sabe aquela sensação de quando se está fisicamente em um lugar, mas seu cérebro não está? Como se o tempo passasse ao seu redor rapidamente e seus sentidos não fossem mais capazes de captar o que está diante do seu nariz. Meus olhos estavam fixos no açucareiro e todo o resto perdera o foco. Minha audição distinguia as vozes tal como um efeito sonoro em segundo plano, como alguém que escuta atrás da porta. Eu estava em choque. Ainda não conseguia assimilar tudo o que aconteceu.

Matt: Dul??!
Dul: Ham? O quê?
Matt: Não ouviu nada do que falamos?
Dul: Ouvi.
Elle: Tem certeza de que está tudo bem, querida? - Disse passando a mão sob meus ombros.
Dul: Tenho, eu só... preciso dormir um pouco mais. Licença.

Me retirei da mesa e subi as escadas. Entrei no meu quarto, fechei a porta, me escorei e sentei no chão. Meu coração estava acelerado, mal conseguia respirar.
Eu simplesmente não conseguia processar o fato de ele estar aqui. De estar tão perto.
Por muitos anos eu jurei jamais vê-lo outra vez, jamais permitir que se aproximasse, jamais encarar aquele olhar perigoso sob o qual por muito tempo me perdi, aquele olhar que... Nossa... não mudara nada, depois de todos esses anos. Um imã que me atraía de tal forma, que era impossível ignorá-lo, até quando eu lutava com todas as minhas forças para fazê-lo, eu não conseguia.
Senti um frio na barriga.
Como, me diz, como, depois de tudo o que aconteceu ele ainda é capaz de me causar tudo isso?
Não, não. Ele partiu seu coração, Cristopher Uckermann foi um trauma na sua vida, não se deixe levar por um ataque nostálgico.
Parte de mim, no momento em que ouviu aquele nome, se desmontou por completo e eu me perdi. Era como se os meses de lágrimas, negação e sofrimento tivessem sido apagados da minha memória.
Acho que o fato de tudo ter sido insuportavelmente doloroso na época, fez com que, contraditoriamente, eu deletasse a parte ruim da minha mente.
Ele era literalmente a pessoa em quem eu mais confiava no mundo. Eu o amei com todas as minhas forças, estava perdidamente apaixonada. Não só pela segurança que ele me trazia, não só pelo cuidado, mas por ele, com todas as suas imperfeições que o faziam ser tão perfeito pra mim. Pelo menos achei que fosse...
É uma pena que estivesse tão cega.
Por causa dessa paixão ele me destruiu. Permiti que ele me destruísse. Isso é fato. Foi muito difícil pra mim juntar o que restou e me reerguer sozinha. E ele sequer teve a consideração de olhar pra trás, para talvez checar se eu estava bem, nem ao menos se preocupou em me olhar nos olhos pra dizer o que tinha que dizer. Simplesmente se escondeu atrás de um papel amassado, mal escrito, por sinal, e desapareceu. E a máscara havia caído. O que eu não entendo é como alguém é capaz de mentir, fingir e manipular por tanto tempo. Como se fosse outra pessoa, alguém que eu desconhecia.
Foi assim que aprendi, da pior maneira possível, que quanto mais se ama alguém, mais controle você dá a essa pessoa sobre você e mais poder ela tem para te machucar.
E é por isso que eu prometi a mim mesma, depois de tudo que passei pra chegar onde estou, que jamais deixaria que alguém tivesse esse poder sobre mim outra vez. E não vou.
Também não vou deixar que esse reencontro me abale. Somos adultos, nossa comunicação é temporária, só até que o conserto do meu carro termine. Depois disso espero nunca mais ter que dirigir a palavra a ele novamente. Definitivamente é uma parte da minha vida que eu prefiro deixar pra trás. É melhor assim.
Não sinto raiva, não mais.
Mas nunca fui de esquecer as coisas. Ele me marcou. Estou ciente disso.
E tudo que a presença dele me faz sentir agora... não é nada comparado ao que a ausência dele um dia me causou.
Está certo, recuperei os sentidos.
Fui até a cama, acomodei-me, respirei fundo. Parei por alguns segundos e olhei ao redor. Precisava me ocupar. Peguei o notbook na gaveta do criado mudo ao lado e comecei a escrever. As coisas começaram a fluir. Tive um súbito criativo e me agarrei a isso. Eu estava precisando de um choque de impulso.

Dois LadosOnde histórias criam vida. Descubra agora