Pós-Desavença

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Algumas semanas antes, um dia depois dos eventos de "Desavença"...

Bakugou encarava o teto de seu quarto com a mente distante, contemplativo, enquanto a luz do amanhecer passava atrevidamente pelas frestas das cortinas escuras do pequeno cômodo. Tinha dormido pouco naquela noite, passando no mínimo umas três horas rolando inquieto pelos seus lençóis pretos; seu subconsciente processando tudo que precisava fazer dali para frente.

O concurso estava cada vez mais próximo, seus treinos agora eram decisivos... o que significava que não havia mais margem para erros. Mitsuki, apesar de nunca ter sido a mulher mais amável do mundo, parecia ainda mais firme quando o assunto era seu futuro, fazendo tudo que estivesse em seu poder para garantir que tivesse todas as chances de alcançar seus objetivos. A pressão nos ombros do aspirante a caçador não parava de crescer, semelhante ao número de pesos que carregava durante os treinos.

Porém, força física não era suficiente para o nível das conquistas que o loiro almejava, e tudo ao seu redor evidenciava isso com demasiada intensidade. Por mais próximo que estivesse da data mais decisiva de sua vida – poucas semanas o separavam do dia D – Bakugou acabara de reconhecer, dolorosamente, que ainda havia um certo tipo de coragem que não estava em sua posse... e isso implicava em problemas ainda maiores do que imaginava.

"— ...por que caralhos ele [Midoriya], continua insistindo em se aproximar se não vai ganhar nada com isso?!

— Porque ele ainda quer ser seu amigo?!

— EU NUNCA QUIS AMIGOS, PORRA!

— ...então o que raios eu estou fazendo aqui?"

A expressão decepcionada e enraivecida que recebera do ruivo na tarde anterior lhe afundara em uma queda angustiante em si mesmo, sendo suficiente para que quisesse atirar seu próprio cérebro numa parede espinhosa de concreto. A intervenção rápida de sua mãe fora a única coisa que realmente o movera para frente naquele momento, levando-lhe vagarosamente a mais óbvia e estúpida das realizações: por mais que não quisesse admitir, era esse o efeito que sua teimosia crônica tinha sobre as pessoas mais importantes a sua volta.

Bakugou havia se acostumado a afastar todos, se acomodado com os altíssimos níveis de autossabotagem que estabelecera para si mesmo ao longo dos anos. Autointitulando-se como "independente", percebia-se incapaz de pedir, aceitar ou até mesmo cogitar ajuda alheia, por mais que às vezes precisasse desesperadamente de socorro.

Seu pai, como o elo mais gentil naquela família, havia tentado alertá-lo desse problema de diversos modos; conselhos carinhosos, investidas amigáveis, até mesmo algumas repreendas firmes... todavia, em sua infância, sua mãe lhe ensinara diferente. Firmeza, força e altivez eram seus pontos mais valorizados, e tais mudanças em seu modo de aprendizagem haviam-se iniciado um pouco tarde demais.

Fugir de tal situação conturbada estava cada dia menos efetivo, tornando-se mais um problema no meio de tão emaranhada equação. Bakugou engolia em seco a necessidade de resolver suas inúmeras paranoias sozinho.

— ...Bakugou?

A voz rouca e sonolenta de Kirishima pegou o loiro desprevenido.

— Que foi? – Questionou, sem coragem de encará-lo.

— Nada, achei que não estivesse acordado... – O ruivo disse. – ...só chamei porque você parecia inquieto. Está tudo bem?

Bakugou afundou sua cabeça no travesseiro. "Que maravilha, eu sequer consigo ser discreto..."

— Cuida da sua vida, idiota. – O loiro grunhiu, rude, abafado pelos tecidos grossos. – Eu estou ótimo, não podia estar melhor.

Kirishima soltou uma risadinha nasalada, sem graça.

Mokutekichi - KiribakuOnde histórias criam vida. Descubra agora