Adhara passou a mão pela face delicada de Kastra, suspirando. A mais nova era tão bela que doía. As duas estavam numa tenda disponibilizada por Kirigan.Kastra sorriu para a irmã, enquanto tecia. Kirigan fez questão de dar tudo o que as irmãs necessitavam, para garantir que estariam confortáveis, e talvez, comprar o apoio delas. Os olhos de Adhara voltaram para o estojo de couro onde estavam as flechas. Os dedos dela passaram pela ponta afiada, para garantir que eram tão letais como aparentavam.
—Adhara, sabes que não precisas casar com ele, certo? Podemos arranjar outra forma. — Kastra expressou o que tanto a atormentava, seus olhos ainda nas linhas que usava para tecer
—Kastra, nós só precisamos de tempo para descobrir como sair deste ninho de cobras. Mas preciso de ti, viva. — Adhara.
A mais nova torceu os lábios, cansada demais para argumentar. Ela nunca teve num sítio tão arrumado e querendo ou não, esbanjava riqueza. Ela sentia-se mal por se acostumar rapidamente com o conforto, afinal, elas ainda eram vítimas de um sequestro. Sua irmã sacrificicou a sua liberdade para ela ter aquele luxo de tecer novamente.
Kastra nunca imaginou Adhara a casar, não por a irmã não merecer amar e ser amada, mas a mais velha parecia mais apaixonada pela vida na floresta do que nuna cabana ridícula a ser dona de casa.
Adhara levantou com o arco e flecha, erguendo-o de forma majestosa, flecha apontada para a entrada da tenda. Ela soltou a flecha no momento que Kirigan adentrou a tenda. Ele levou a mão à orelha, sangue machando levemente seus dedos indicador e médio, por conta do raspão causado pela flecha. Não era um ferimento grave, superficial era um adjetivo melhor, mas Adhara ficou orgulhosa na mesma.
Kirigan viu os olhos dela brilharem de desafio, a provocação clara. Aquela era a mulher com quem ele iria se casar. A mulher que disparou uma flecha contra ele, o grande General Kirigan, o Invocador das Sombras.
Ele ofereceu um sorriso, Kastra suspirou, atenta a interação que se desenrolaria diante dela, seus dedos suspendendo a ação de tecer.
—Nem nos casamos ainda e já me queres morto, Adhara. — havia uma implicância explícita na voz rouca dele
Olhos negros contemplando a face delicada de Adhara. A postura reta, baixando lentamente o arco, como se a sua vontade fosse contrária as suas ações. Talvez fosse.
—Só estava testando, não tenho culpa se surgiste das sombras. — debochou, pousando a contra gosto a arma
Kirigan a olhou, os olhos escuros fixos nela, esperando algo mais. Era impossível negar que Adhara era a Invocadora do Sol, agora que sabia disso. Ela manteve em segredo aquele poder, e o fez sem arrependimentos.
—Não somos tão diferentes, estiveste este tempo todo escondida nas sombras. E não pensavas em emergir delas. — Kirigan tinha o corpo reto, tendo total conhecimento da atenção de Kastra
Ele sorriu discretamente para a maus nova que desviou o olhar. Ela era o ponto fraco de Adhara. E Kirigan se encostaria nela sempre que possível para obter o que quisesse de Adhara.
—É engraçado, já que o ser das sombras prefere a luz ofuscante do dia. O sol aquece o teu obscuro desejo de poder? — Adhara rebateu pegando numa escova, sem nenhuma delicadeza, escovou o seu cabelo, olhos desatentos a ação de Kirigan
—Agora é uma vaga lembrança da tua existência. — o General aproximou-se lentamente dela, pegando delicadamente a escova
Antes que Adhara pudesse protestar, ele reprodução a ação anterior dela, mas com muito mais cuidado. O cabelo dela era estranho nos dedos longos dele, um estranho que ele gostou.
—Porque queres tanto casar com Adhara? — Kastra encolheu-se quando a pergunta que atormentava sua mente deixou sua boca
O silêncio instalou-se no cómodo, uma mistura de sentimentos no ar. Medo, curiosidade, desconfiança. Ele já esperava que essa pergunta viesse átona em algum momento, quanto mais cedo melhor, aquela era a porta de entrada para limpar sua imagem construída na mente delas. Era ali que ele teria a certeza que tudo seria como planejado.
—Eu sei como é ter que se esconder nas sombras, esconder estas habilidades, esconder a nossa identidade como Grishas. — Adhara torceu o nariz, achando muito diplomático — Eles passaram anos temendo o nosso poder, esse ódio levou o Herético Negro a criar a Dobra. Eu só quero o melhor para Ravka, para os Grishas. E a Adhara é a chave. Casar com ela é só uma garantia que estarão seguras.
—Nós estávamos seguras. — Adhara cortou-o, afiada, nem um pouco convencida
Kirigan pousou o pente e virou Adhara para si, olhos fixos um no outro, uma batalha que ninguém mais entendia. Algo mais escondido: atração.
Kirigan queria acreditar que era por conta dos poderes. A escuridão não podia existir sem a luz e vice-versa. A luz e a escuridão coexistiam desde o início dos tempos, era uma atração inegável e indestrutível.
—Nenhum Grisha está seguro por muito tempo sozinho. — ele rebateu, sombrio
—Ninguém saberia que eu era uma, se não tivesses trazido a luz, idiota. — Kastra fechou os olhos, achando que tudo teria ido por água a baixo
Mas Kirigan riu, irritando ainda mais a Invocadora do Sol. Ele era ridiculamente irritante, arrogante.
—Eu achei isso uma vez. Mas nenhum segredo dura para sempre, Sakta. Tu mais do que ninguém deverias saber disso. — os olhos pareciam mais densos e escuros — Eu escondi-me durante anos, vi pessoas nascerem e morrerem, chega um momento que nem as sombras são o suficientes para a sobrevivência. Kastra irá morrer, ela não é uma Grisha, e tu terás longos séculos pela frente, para chorares no túmulo dela, sentires o vazio e a solidão te corroer aos poucos, e quando nada mais sobrar, a luz da revelação virá, quererás pertencer a esta família de Grishas, os únicos que entendem essa dor que sentirás. — explicou
A postura de Adhara não vacilou em momento algum, mas ouvir a verdade daquela forma foi cruel o suficiente para as lágrimas repousarem em seus olhos, esperando o momento para descer. Kastra engoliu o choro. Ela não sabia identificar se era dor pelo futuro mais previsível sofrimento da irmã, ou comoção pela dor que Kirigan transmitiu com aquele balde de água gelada. A certeza de que vivenciou tudo aquilo.
Kirigan se dirigiu a saída da tenda, satisfeito interiormente por vê-la sem palavras. Ele olhou brevemente para a irmã mais nova que voltou a tecer, com receio de mostrar a fragilidade a ele.
—E só como uma pequena garantia da minha boa fé, meu nome é Aleksander.
Aleksander. Um nome bonito, o nome que futuramente Kastra praguejaria e culparia pela morte da irmã. Um nome que futuramente Adhara destetaria, o nome que proporcionaria os dois sentimentos mais intensos que Adhara experimentaria: amor e ódio.
O nome que foi enterrado junto com a história real dele. Um nome que voltaria das cinzas ao ser revelado a outra Invocadora do Sol. O nome que traria ruína a Ravka. Era o nome dele.
Aleksander!
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The Myth Of The Sun Summoner
FanfictionTodos conheciam o mito da Conjuradora do Sol. As duas versões eram bastante conhecidas. A primeira contava que a Conjuradora do Sol já existiu. Que ela era uma bela mulher, qualquer um rendia-se aos seus encantos, até o próprio Herético Negro. Mas...