Lobo e Coelho

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Midoriya estava exausto.

A ideia de explorar a madrugada de Callas junto do filho do inimigo não era terrível. Todoroki Shouto morava no castelo por razões diplomáticas, e Izuku tinha sucesso em fazer com que tais razões se tornassem irrelevantes.

E Midoriya experienciava um sono interminável. Deitaria no chão sólido das calçadas e dormiria com gosto se pudesse. Seria Todoroki seu amigo, o acompanhando pela noite apesar dos riscos? Pensando melhor, nenhum dos dois havia feito a proposta de amizade. Deku não gostaria de enfiar rótulos onde não existiam. Talvez em Flamínia funcionasse diferente.

— Você está bem? — Perguntou Shouto em certo momento quando o silêncio se tornou presente. Achou incomum pois, afinal, andava ao lado de um curioso condenado dentre todas as pessoas.

— Sim, vou ficar. Não se preocupe — Sorriu ao virar para ele.

Então tropeçou em uma pedra e por pouco não foi ao chão, parando em pé no último segundo, fazendo com que o capuz de coelho que escondia sua identidade deslizasse de sua cabeça.

— Estou vendo. Perfeitamente equilibrado.

Preciso dormir. Preciso dormir, Midoriya repetia mentalmente, os olhos fechados de vergonha.

Callas era bem iluminada a noite, principalmente por bares e Shouto contou pelo menos três festas no caminho que fizeram pelo centro da cidade. Izuku havia lhe dito que não o levaria até o bar que costumava frequentar, "Dragon Field", pois estaria lotado de alfas bêbados a essa hora e não teria a paciência necessária pra lidar com nenhum deles. Estava abandonando o plano de beijar qualquer um que o elogiasse no bar, e não contaria para o príncipe que o acompanhava.

Passaram por um enorme quadro de avisos onde panfletos eram espetados para que todos pudessem ler: avisos sobre campeonatos locais de xadrez. A localização de novas lojas. Ofertas de emprego. Cartazes de desaparecidos.

Izuku pegou um dos cartazes, todos estampados com o rosto da mesma garota loira de coques na cabeça, e enfiou no bolso da calça. Todoroki não entendeu o porquê. Himiko Toga, desaparecida a semanas atrás, vista por último perto de um orfanato nas redondezas.

O orfanato no qual Midoriya havia crescido até ser adotado pela rainha. Luz do Amanhã.

A realidade era que, diferente do resto do reino que tinha uma taxa balanceada de crimes, a cidade central que morava em volta do castelo quase nunca era manchada por assassinatos, roubos, desaparecimentos. Eram acontecimentos raríssimos. Os cidadãos tinham medo dos cavaleiros, medo de Clara. Medo de serem julgados como "traidores do reino" e enforcados no meio de uma multidão que nunca mais se atreveria a cometer o mínimo crime que fosse.

Se você matou, cavalheiros irão te encontrar e bater na sua porta.

Se você roubou uma fruta nos mercados, irão bater na sua porta.

Se alguém havia sequestrado a desaparecida Himiko Toga, uma adolescente no colegial vários anos mais nova que Izuku, a pessoa certamente seria encontrada também. Midoriya nem ao menos pensou na possibilidade da garota ter fugido ao invés de machucada, e enfiou o papel no bolso.

Foi quando, ao longe, ambos ouviram sons de cavalo.

Izuku passou a ser seguido pelo ômega até uma carroça modesta. Ela seria usada para carregar mantimentos e o dono havia acabado de terminar de organizar as caixas de madeira, subindo no cavalo e iniciando uma canção assobiada irreconhecível. Era agora ou nunca.

— Vamos subir — Disse Midoriya, um pouco animado.

— Você inventa cada coisa.

Mas Shouto subiu com rapidez, ambos se esgueirando entre as caixas, e logo estavam em uma carroça que não os pertencia grande o suficiente para cabê-los no mínimo deitados. O cavalo começou a andar e o assobio se intensificou, as madeiras fazendo barulho ao baterem umas nas outras, animais ao longe conversando e celebrações rolando soltas. Era som suficiente para acobertar as vozes dos príncipes.

3 A.M: O Conto da Lua EscarlateOnde histórias criam vida. Descubra agora