Capítulo Um: O Padre Miguel

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Aborto

É a quinta causa de morte materna no país

1 a cada 5 mulheres até os 40 anos já realizaram/tiveram um aborto

Independe de religião

Estimasse que haja quase 1 milhão de mulheres que abortam anualmente no país (induzido e espontâneo)

Infelizmente, aproximadamente 200 mil vem ao óbito, desse número cerca de um quarto é devido ao aborto espontâneo.

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                Aquela sala fedia. Era um cheiro forte de desinfetante misturado com o de um rato morto. O sofá que eu estava sentada estava todo acabado, eu podia ver a espuma em algumas partes e milhares de fios estavam puxados. Só sentei porque estava nervosa demais para ficar em pé. Era uma casa normal que eles chamavam de clínica. Eu estava numa salinha, como uma sala de estar mesmo, sentada num sofá velho, de frente a uma TV de tubo e uma mesinha de madeira cheia de revistas. Só havia eu naquela salinha. Isso me deixou ainda mais nervosa e ansiosa.

                Da sala eu podia ver a escada, ela ficava no meu lado esquerdo, que era o inverso do lado da porta de entrada. A porta era de madeira e a madeira estava toda lascada. A aparência podre do lugar me deixou muito agitada. Comecei a bater o pé insistentemente no chão. Inspira. Expira. Porém, até isso estava me deixando nervosa. Lá fora estava chovendo muito e o barulho da chuva não me acalmava.

                                                                      

                Talvez, não era uma boa ideia. Mas, eu não nasci para ser mãe. Eu fumo, bebo e ainda me drogo de vez em quando... Como eu posso ser algum exemplo? Só se for do inverso: faça tudo o que faço, só que ao contrário. O cheiro do lugar estava me dando náuseas. Não sei se era a gravidez... Eu só tinha um mês de gestação. Fiquei me perguntando se grávidas sentem enjoo já no primeiro mês, ou se na verdade, era o lugar que estava me irritando.

                - Annabelle O’Sullivan. – uma mulher desceu as escadas e me chamou. Ela nem ao menos vestia roupas brancas. Estava com uma camiseta azul, calça jeans e um jaleco amarelado. O amarelo do jaleco parecia sangue que ela não conseguia limpar o suficiente. Isso me fez tremer toda. Respirei fundo e levantei. Atrás dela surgiu um homem que vestia uma camisa polo branca e jeans. Ele era muito grande. Isso também me assustou.

     O medo que estava sentido era incomum. Normalmente, eu era irresponsável e insana. Porém, olhando para essas duas figuras fiquei em choque.

     - Por favor, nos acompanhe. Vamos começar o procedimento. – a mulher tinha uma pinta imensa na bochecha. Resolvi me concentrar na bochecha dela. Talvez isso me acalmasse. Era uma pinta grande, marrom... – Annabelle, está tudo bem? – ela perguntou porque eu nem me mexi.

     Meu coração explodiu no peito. Meu único pensamento era: não posso fazer isso! Eu não posso entrar nesse lugar. O homem estava se aproximando de mim. Meus olhos foram para a porta. Deixei ele se aproximar mais, e quando estava a menos de um metro, quase colado em mim, chutei sua parte inferior e corri para a porta.

     - Annabelle se acalme! – a mulher berrou. – É só o nervosismo!

     O homem se enfureceu, levantou depois de gemer de dor e tentou me agarrar pela bolsa. Tentei afastá-lo, porém não consegui. Ele segurou meu braço e isso me desesperou. Só conseguia pensar: Vou morrer aqui! Vou morrer aqui! Não, por favor, não...

     Sem pensar muito, enfiei o dedo no olho dele, que acabou afrouxando o aperto em mim. Aproveitei esse momento para sair correndo. Nem pensei em fechar a porta. Só pensei em sair correndo. Acho que nunca na vida corri tanto. Corri desesperadamente, descendo a ladeira que era aquela rua, tentando não cair... A chuva batia nos meus ombros e molhava todo o meu corpo. Meu carro estava estacionado muito próximo da casa. Não quis ir com ele. Estava com medo. Saí correndo desesperadamente sem olhar para trás. Tinha medo de estar sendo seguida.

O número da sorte e a busca do pai perfeitoOnde histórias criam vida. Descubra agora