Capítulo 6

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Capítulo 6

O alto muro da propriedade faz frente com outra rua, que tem poucos bichos à vista. Aproveitando os grandes vasos por onde eles podem subir, Brunno e os outros logo alcançam facilmente a borda e avistam à esquerda e à direita um pequeno grupo de mortos-vivos. Não é grande a concentração, mas suficiente para se juntarem e fazerem estragos.

Descem sem fazer qualquer barulho, apoiados nos galhos de um velho e úmido carvalho. Em instantes estão sobre a calçada levantada pelas velhas e grossas raízes das árvores, que invadem cada fenda de concreto, jogando-o para o lado com seus tentáculos de madeira cheios de vida e mostrando toda sua força, apesar da nova ordem mundial e de toda a morte e destruição que rodeia a cidade.

Correm muito discretamente, tensos, esgueirando-se pelos muros cobertos de heras vermelhas e verdes, por detrás dos carros largados com portas escancaradas, até que Brunno, preocupado em não ser visto por um trio de bichos que está de costas, não percebe que está perto demais de um morto dentro de um velho Siena prata. O que um dia foi uma criança, imediatamente tem a fome aguçada. A criança, de não mais que quatro anos, tem o tórax completamente chupado para dentro de si mesmo, como uma bexiga murcha, e o desejo de se alimentar a faz puxar o braço dele para dentro do vidro quebrado. Por sorte, ela está presa à cadeira de segurança e não consegue cravar nele os podres dentinhos de leite, mas Brunno bate na lataria e dispara o alarme.

Atraído pelo som, que parece se satisfazer com todo o alarido que está causando, um grupo de bichos surge do interior da garagem de um prédio, vindo até eles com um arrastar de pés, como se tivessem bolas de ferro amarradas aos tornozelos, mas facilmente os três dão conta do recado. Sem necessidade de tiros e maiores barulhos, deixam os mortos agora realmente mortos e rapidamente seguem até a esquina, depois de Duende conseguir arrancar vários fios e desativar o alarme do Siena, contudo não se veem livres. Logo após virarem à esquerda, avistam ao longe uma concentração maior de bichos, aglomerando-se numa modorra que se estende por vários metros. Parados a observar um nada que somente eles são capazes de entender.

— Droga! — Ryder explode numa fúria contida, pois não é o momento de grandes desabafos ou exibições. Qualquer ruído os levará à perdição, e tudo o que querem e precisam é de um plano que magicamente os teletransporte até o hotel, que está a dez, talvez quinze metros de distância de onde a aglomeração se concentra.

O vento traz o fedor rançoso dos bichos, com lufadas sólidas de coisa podre, e para piorar, o tempo parece conspirar contra todos os planos ao anunciar as primeiras gotas de chuva.

— O plano é o seguinte: você atravessa a rua e fica atrás daquela Pajero vermelha — Ryder diz a Brunno, apontando para um carro estacionado do outro lado, coberto de folhas, poeira e dejetos de pássaros. — Fique o tempo todo abaixado e de olho em mim. Ao meu sinal, você irá para o próximo carro, até chegar naquela perua branca, então você entra nela e toca a buzina para atraí-los.

— E por que eu faria isso? — Brunno questiona. — O que está pretendendo fazer? Jogar-me na boca dos leões?

— Porque eu estou mandando! Como pretende tirá-los do caminho?!

— É um plano de merda, se quer saber! — responde o garoto atrevido, sem encará-lo. — A perua nem está a uma distância suficiente pra tirá-los do caminho.

— Tem um plano melhor?! — Ryder sibila entre os dentes, numa ironia que chega a ser ridícula. Ele nunca foi bom em fazer ironias.

— Se aquele caminhão estiver funcionando, poderá ser usado para esmagar os que estiverem no meio do caminho e atrair para longe os que sobrarem. — Brunno aponta para um velho caminhão de transporte, que está numa posição contrária a que vão e que parece, relativamente, em condições de funcionamento.

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