𝕮𝖆𝖕𝖎𝖙𝖚𝖑𝖔 30 - 𝕰𝖝𝖎𝖌𝖊𝖓𝖈𝖎𝖆𝖘

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"É no vazio dos olhos, no frio dos lábios e no silêncio das palavras, que se aloja o pesar dos dias mórbidos de quem está à definhar."


Lucy Vaughan

   — Quem saco! — Resmungo, jogando o lençol em cima do meu rosto para impedir que os raios pálidos do sol continuem a me incomodar. Esse amanhecer é a única noção de horário que tenho e, se não estou errada, ele me diz que já é o meu quarto dia trancada aqui.

Desde aquele dia eu me afundei profundamente nas água congelantes dos sentimentos que eu tentei conter durante anos. Eu não chorava um gota se quer desde a morte de Dylan, e agora cá estou eu. Esparramada na cama com o travesseiro molhado das lágrimas que fizeram meu olho inchar absurdamente e a boca machucada de tantas mordidas que dei tentando abafar meus gritos. Estou há dias com a mesma camisola longa e gasta e não lembro a última vez em que penteei meu cabelo ou tomei um banho que fosse além de água quente e lágrimas. Meu estado é deplorável, mas, honestamente, eu não dou a mínima para isso.

Eu guardei a carta e todas as fotos que encontrei naquele dia em um gaveta que está bem longe de mim e mantenho ao meu lado apenas a pulseira de Ivan. Esses pensamento fazem meus olhos começar a arder de novo, mas meu momento é interrompido por batidas na porta, que eu ignoro.

   — Senhorita Vaughan, eu trouxe seu café da manhã. — Parece que hoje não é Yala ou minha tia que vieram trazer a comida. A voz, que parece familiar para mim, é bem jovem e delicada.

   — Não estou com fome.

   — Bem... Eu também trouxe alguns livros da biblioteca. Achei que poderiam animar a Senhorita. — Livros? Biblioteca? Desde quando esse lugar tem uma biblioteca? Essa perguntas movem o meu corpo lentamente e, quando eu vejo, já estou com a chave da porta em mãos.

   — Bom dia, senhorita Vaughan. — Eu sabia que lembrava de sua voz. Mal abro a porta e logo aquele projetinho de gente entra com a mesma animação invejável da última vez que entrou nesse quarto para nos trazer a janta. Ela começa a colocar as comidas na mesa do quarto, enquanto fala o que tem nessa refeição. Ela está mais solta que da última vez, o que deve ser consequência de Ivan não estar aqui para ser rude com ela, como foi da última vez.

   — Quais livros você trouxe? — Pergunto sem enrolar. Ela logo os pega e coloca na mesa, ao lado da comida.

   — Eu consegui trazer 4 livros sobre a nossa história. 4 sobre as nossas leis e também trouxe 2 de comédia romântica. Não sei se são seus estilos favoritos, mas nossa biblioteca é bem limitada em relação a diversidade. Nós dificilmente temos livros que não tenham um sério teor político envolvido. — A garota se acanha.

   — Entendi. — Volto a ficar em silêncio, esperando que ela saia do quarto e me deixe só, o que demora para acontecer devido a sua lerdeza irritante. Assim que ela sai eu, que estava imóvel, vou às pressas para os livros.

As capas amareladas exalam um cheiro amadeirado de idade, me levando para uma atmosfera melhor em comparação com a que estava há alguns segundos atrás. Tateio delicadamente as páginas livro que está no topo da pilha que aquela menina me deu. Me aconchego na grande poltrona no canto mais iluminado do quarto e trago a mesa com as comidas e os outros livros para perto de mim. Apesar da imensa tristeza em que estou afundada, sei que ainda tenho responsabilidades lá fora e, mesmo que eu não queria essa vida, eu tenho que dar um jeito nessa bagunça.

A começar por Renne, aquele grande mentiroso de língua venenosa. Ele me esconde tudo o que pode e mente para mim, como se eu fosse alguma idiota. Só espero que ele esteja preparado para me encarar após minha coroação. Ele não faz ideia do que o aguarda.

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