XXVI

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Fúria.

Qualquer pessoa que olhasse para Guimarães agora, pensaria em uma só palavra. Guimarães era a fúria em pessoa, pronta para atacar quem é que entrasse em seu caminho. Pronta para despedaçar, esganar, apertar gargantas.

Quando Gabriela andava daquele jeito – sobrancelhas juntas, o olhar animalesco nos olhos, os punhos cerrados, passadas determinadas – arrancava diversas reações: inveja dos homens que faltavam tamanha confiança; medo da parte dos que eram culpados; admiração daqueles que aspiravam ser como ela. E respeito de todos suficientemente ajuizados para saberem com quem estavam se metendo. E é por isso que nenhum policial ou técnico entrou em seu caminho quando ela pisou duro dentro de sua casa. É por isso que alguns deles se sentiram ignorados: ela estava concentrada demais em seu objetivo para notar qualquer coisa ou alguém durante sua passagem. E eles até se sentiram aliviados, porque ninguém queria explicar a essa mulher a razão de ela ter sido a última a saber de um ataque na própria casa. E no estado em que ela estava – visivelmente abalada, bufando de raiva – ninguém queria se meter em seu caminho, ninguém queria ser repreendido por ela.

Ela subiu a escada a passos duros, firmes, e se os policiais ali prestassem bem atenção, eles jurariam que os degraus estremeciam em cada passada. Mas de novo, ninguém se atrevia a observá-la. E isso porque eles ainda não tinham ouvido sua voz nesse estado. Todos os colegas de trabalho sabiam como ela era grave, mas poucos deles haviam presenciado Gabriela em estado de fúria, de ódio puro. A voz soava como trovão, e abaixava até mesmo as cabeças mais ousadas.

A morena continuava em seu caminho, e nada impedia seu progresso, nem mesmo uma mão que tentou segurá-la nesse ponto. Ela estava quase alcançando a porta do escritório, onde o ataque tinha ocorrido, e agora que tudo parecia mais próximo e real ela sentiu o nível de ansiedade aumentando.

– Gabriela, ela tá bem. – Ela ouviu a voz de alguém atrás de si. Natália. Era Natália? Ela dispensou o comentário com uma mão. Não, não era o comentário, era um braço tentando segurá-la.

– Gabriela! – Ela chamou de volta e agora Roberta estava na entrada da porta. Nos seus olhos negros um misto de preocupação e simpatia. Gabriela engoliu seco. Era assim tão ruim? Sheilla tinha se machucado muito? Ela estava agindo assim porque ela parecia tão determinada a matar alguém quanto sentia vontade?

– Nenhum passo a mais, Guimarães. – Roberta colocou as mãos na frente do corpo impedindo a passagem dela, e Gabriela virou o pescoço de uma maneira desafiadora e deu um passo à frente. Ela iria passar por aquela porta.

– Roberta, não! – Elas ouviram Sheilla gritar do outro lado do quarto quando a mulher segurou a morena pelos braços, impedindo-a de avançar.

Gabriela queria chegar até Sheilla. Ela mal podia ver a mulher dali. E a voz da morena só aumentou o desejo de vê-la, de checá-la com seus próprios olhos – com suas próprias mãos.

– Cai fora. – Ela ordenou para Roberta num rosnado, mas a mulher sabia melhor. Ela não deixaria a parceira entrar.

– Ela é evidência, Gabriela. Você odiaria destruir a evidência.

– O caralho! – Ela vociferou. – Ela é minha esposa, Roberta! – Ela socou o batente da porta, mas Roberta nem se mexeu.

– Amor, para! – Sheilla ordenou numa voz frágil, o que a enfureceu mais ainda.

– E ela é minha amiga, Guimarães. – Ela rebateu endurecendo a voz enquanto apontava o dedo para morena, inclinando o corpo para frente, ameaçador.

– Roberta... – Ela estava prestes a fazer uma ameaça quando a outra a fez primeiro.

– Você força a entrada, eu forço você no chão. E eu tô falando sério. – Ela lançou um olhar afiado. – Agora se você se acalmar... Se você se acalmar, Gabriela... Eu deixo você entrar. Mas você não vai chegar perto. Você me ouviu?

Sobre Amor, Tartarugas e Novas ChancesOnde histórias criam vida. Descubra agora