Acho que comecei a duvidar um pouco da minha tendência crônica à má sorte somente quando me mudei para uma nova cidade, aos quinze anos.
Quer dizer, há um planetário nela, além de ser maior e mais exuberante do que a que moramos anteriormente, com poucos insetos dispostos a sugar o meu sangue de canudinho e pessoas ligeiramente mais simpáticas. A porcentagem esmagadora dos jovens passa suas tardes jogando Pac-man ou Super Mário no fliperama de paredes desgastadas que se recusa a fechar no centro, ou tomando refrigerante barato de marcas meio vagabundas na praça principal, onde os skatistas, artistas e todos os outros tipos de pessoas se reúnem desde sempre perto do crepúsculo abafado.
Quase tudo é bom. Leia o quase com um enfoque enérgico, beirando o desespero, que é o que sinto no exato momento em que saio da lanchonete e o vejo.
Decerto, a coisa mais incuravelmente chata que existe nessa cidade pacata possui olhos da cor de buracos negros e mechas pálidas no topo da cabeça, que está sempre girando em órbitas abstratas demais para que a maioria dos terráqueos consiga entender.
Apollo.
Antes de tudo o que irei falar sobre ele, preciso contextualizar uma coisa para você, para que não pense erroneamente que minhas observações acerca do garoto se devem a qualquer tipo de atenção direcionada da minha parte - coisa que não é verdade, e nunca vai ser. Nunquinha da Silva.
Sempre gostei de observar o mundo ao meu redor e, involuntariamente, prestar atenção nas diversas coisas que ele poderia oferecer, como uma espécie de telespectador que assiste a vida passando na televisão, deitado em seu sofá confortável enquanto se alimenta de uma dose generosa de porcarias culinárias que provavelmente vão lhe conceder um belo câncer no futuro.
Faço isso mais do que interagir com o planeta, na verdade. Creio que seja uma tendência inerente a mim, como as rotações da Terra em torno do sol. E é por causa dela que eu percebo muito do que acontece à minha volta; e ouço, também, mesmo sem querer.
Vários boatos sobre Apollo costumam escorregar de boca em boca pelos corredores do colégio, aderidos com algum tipo de cola invisível às centenas de teorias bizarras ao seu respeito.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Universo Segundo Cosmos | ⚣
Teen FictionCosmos Silva, além de ter sido agraciado com um nome nem um pouco comum, teve o infortúnio de ganhar ao longo dos seus dezessete anos uma lista quase inacabável de tragédias para colecionar. Como se não bastasse ser daltônico, hipocondríaco e portad...