6: Espiral Azul

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Meus pés tremulam sobre um dos últimos degraus da escada metálica abarrotada de ferrugem e vislumbres de tinta estelar multicolorida, que escorre um pouco mais para o vácuo abaixo de mim toda vez que meus dedos movem o pincel livremente pela pared...

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Meus pés tremulam sobre um dos últimos degraus da escada metálica abarrotada de ferrugem e vislumbres de tinta estelar multicolorida, que escorre um pouco mais para o vácuo abaixo de mim toda vez que meus dedos movem o pincel livremente pela parede, banhando a superfície antes branca de um caleidoscópio de cores verde pálido e vermelho fluorescente que rodopia e se mescla diante dos meus olhos como se tivessem vida própria, com seus torvelinhos que me remetem à Van Gogh em sua Noite Estrelada.

No entanto, não pretendo fazer um céu noturno. Quero retratar o crepúsculo como eu vejo através dos meus olhos de luneta.

O sol irradia nódoas de morango na pintura, acariciando a lateral do meu corpo em um abraço quente e incendiando meus fios bicolores, que tremelicam graças ao vento proveniente da janela aberta do quarto. Aproveito o calor, sorvendo-o com cada poro que consigo para tentar evitar um congestionamento mental.

O fulgor do astro-rei um dia vai esmaecer, de acordo com os cientistas. Se o universo encolher no seu túmulo final, toda a luz será comprimida pela matéria em singularidade até não restar muitos astros com que se dê para jogar um golfe cósmico. Meio trágico, eu sei, e não faço ideia do que me leva a pensar nisso, mas fico ansioso sempre que penso.

Por isso, procuro parar de refletir sobre o fim nada iminente do mundo, ciente de que, se eu continuar, vou cair na minha espiral azul. E não é muito legal rolar até lá embaixo.

Então, tento somente pintar.

O esquisito é que, sempre que pinto, sinto-me como uma das minhas telas; aprisionado por entre suas fibras de tinta e imagens fixas feito um besouro escaravelho grudado num mosaico com alfinete de segurança; inerte, mesmo com todas as possibilidades de coisas que davam para fazer no mundo inteirinho - inclusive, visitar outros mundos, se por acaso a ideia de me tornar um astronauta super incrível voltasse à tona.

Não gosto de admitir, mas as minhas tentativas de permanecer distraído se mostram meio chatas há algum tempo. Por mais que faça planejamentos para o dia, crie listas de coisas para se fazer sozinho ou com outra pessoa, prenda cada uma dessas pequenas folhas de lembrete com fita sobre a minha escrivaninha antes de dormir, às vezes parece tudo um tanto... esfumaçado, como poeira velha. Então, tento inventar formas diferentes de fazer as mesmas coisas, do tipo escovar os dentes fingindo dançar tango com um golfinho invisível.

Quase sempre funciona.

Minha criatividade é a única coisa capaz de me salvar de mim mesmo.

Depois das cerdas embebidas de verde-ensolarado pincelarem a parede pela última vez, no traço que selou a última nuvem desbotada do céu, sou preenchido por uma euforia elétrica que me faz descer os degraus metálicos da escada e saltitar algumas vezes para trás, apenas para contemplar o quão radiante o trabalho está ficando. Esbarro em algumas bolas de papel com esboços quebrados no caminho, e chuto pincéis errantes.

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