14: Apoteose Caótica de Cores

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Nunca havia parado para pensar no quanto filmes antigos ficam incríveis em telas gigantes de cinema até essa noite, abraçando minhas pernas no banco do passageiro de Apollo enquanto um dos maiores clássicos de terror se desenrola em preto e branco...

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Nunca havia parado para pensar no quanto filmes antigos ficam incríveis em telas gigantes de cinema até essa noite, abraçando minhas pernas no banco do passageiro de Apollo enquanto um dos maiores clássicos de terror se desenrola em preto e branco à minha frente, riscando o horizonte além de alguns outros carros que descansam após o nosso sob a noite estrelada como monstros de metal gigantes.

Eu deveria estar concentrado na movimentação - ou na ausência dela - do balcão em que a Brunna está atendendo, mas por motivos que me fogem atualmente à compreensão, não consigo tirar os olhos da tela. E, ocasionalmente, de Apollo. Mais especificamente, de todas as suas reações estrambólicas e falas que beiram o irritante durante os atos do filme mudo, sem, no entanto, chegarem a ser - o que é incomum para os padrões dele. Ou para os meus, de achar quase tudo o que faz insuportável.

Ele não consegue parar de comentar sobre como o visual do vampiro de longa idade é medonho pra burro, mencionar todos os momentos nos quais identifica o rolo de filme sendo trocado graças ao "tremelique seguido por corte não natural na cena", e o modo como não consegue entender o porquê das pessoas terem medo da criatura mística sugadora de sangue, embora evidentemente fique nervoso sempre que o Nosferatu aparece na tela, feito uma gelatina que sabe que vai ser comida em breve. Com garfo e faca. Não que Apollo vá ser comido, mas o sentido é quase análogo.

É bizarro. E cômico. E... divertido. De um jeito que esparge arabescos incandescentes em algum ponto do meu peito. Quer dizer, é bem provável que seja nos pulmões. Talvez eu esteja prestes a ter uma crise de rinite, logo, a sensação inflamável acima do meu diafragma não oferece motivo algum para preocupação além do fato de não ter trazido um antialérgico.

Há outra coisa estranha, no entanto. Apesar dos vidros abertos do veículo no qual estou, minhas narinas constantemente detectam a fragrância com vislumbres de limão que tinge Apollo de cima à baixo. É esquisito, porque ninguém deveria conseguir passar tanto perfume sem ficar enjoativo, muito menos exalá-lo por um período tão longo. Mas é o que está acontecendo. E toda vez que seus dedos recobertos por anéis prateados pressionam a gravata e, em seguida, a afrouxam com desleixo no pescoço como uma reação automática a um calor que definitivamente não está fazendo, fica pior. Ou melhor. As sinapses nervosas do meu cérebro ainda não conseguem definir. Isso, talvez, seja mais preocupante do que todo o resto, considerando os fios de energia estridente que estão começando a envolver meus músculos com o ímpeto de me aproximar um pouco mais da sua materialização física no mundo, apenas para tentar detectar todas as notas que compõem este perfume inquietantemente indistinguível.

Como se de súbito ficasse ciente da minha agitação incomum, suas íris recaem até mim. E eu sinto de novo as cores estranhas infestando meus poros em um dilúvio fosforescente de tons explosivos.

- Isso tá estranho. - Ele parece ler o que se passa na minha cabeça, com a maestria de um telepata meio punk que saiu dos anos oitenta.

- O quê? - Quase engasgo com a pergunta.

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