Capítulo 50 | Antes

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Consegui me recuperar e fui para a aula, com a cara toda amassada e os olhos inchados, mas fui. Ninguém me perguntou nada, nem me zoaram, não ficaram olhando para mim curiosos... Agradeci mentalmente. Pablo e sua irmã ficaram o tempo todo do meu lado.

As aulas se arrastavam, demorou séculos até que a terceira aula iniciasse. Quando bateu o sinal para o recreio, pedi para uma outra colega de classe comprar meu lanche, porque se eu aparecesse no refeitório, Luiz me abordaria e eu não queria ter que ouvir suas desculpas.

Fiquei na biblioteca com Pablo, Paulinha estava lá também, pesquisava algumas coisas sobre o trabalho que tínhamos para fazer.

___ Vocês dois moram sob o mesmo teto, Clar. ___ Paula rodou a cadeira para me olhar melhor. ___ Acha mesmo que conseguirá evitá-lo?

___ Eu sei... Bom, não vai ter jeito e eu não vou ficar enfurnada em meu quarto só para não ter que olhar na cara dele. ___ suspirei. ___ Não sei como vai ser, mas não irei perdoá-lo tão cedo. ___ abaixei minha cabeça, tentando não chorar.

___ Se quiser... ___ Pablo pegou minha mão. ___ Pode ficar lá em casa. Sabe, por um tempo... Não sei, enfim. ___ sorriu sem graça.

Não era uma má ideia, mas não queria perturbá-lo, nem nada. E talvez minha mãe não aceitasse a mudança, mesmo que por pouco tempo, seria complicado.

___ Obrigada... ___ sorri. ___ Não sei se isso daria certo, quero dizer, minha mãe pode não gostar muito da ideia. E... Eu também já sou adulta, preciso providenciar logo o meu cantinho, não posso ficar na casa do Doug a vida inteira. ___ Paulinha olhava para o irmão de forma suspeita, em seguida se virou para a tela do computador, concentrada na pesquisa.

___ Entendo. ___ beijou minha cabeça. ___ Mas se precisar, pode contar comigo, Morena. ___ entrelaçou nossos dedos. Agradeci pela gentileza e disse que pensaria a respeito.

Na verdade, não queria me mudar por causa do Luiz, mas também não me agradava ter que olhar para ele todos os dias e perceber que não poderia beijá-lo, abraçá-lo, nem nada... E ainda ter que suportar vê-lo com a Maya, não, aquilo era demais para mim.

Ficamos na biblioteca até bater o sinal. Voltamos para nossa sala, com uma preguiça enorme. Decidi que não ficaria fugindo do Luiz, mas também não ouviria nenhuma palavra que saísse de sua boca.

*****

Como eu costumava ir com meu namorado, acabei tendo que pegar um ônibus para voltar para casa. Na saída da faculdade, eu o tinha visto me procurando com o olhar e assim que me vira, começara a correr até mim, e eu, claro, tratei logo de dar sinal para qualquer ônibus que aparecesse ali naquele ponto. Quando vi um vindo, abanei a mão e ele parou mais à frente. Antes de entrar, Luiz conseguira me segurar pelo braço, eu gritei dizendo que não o conhecia e o motorista quase bateu nele, então, consegui escapar e Titico não teve jeito, senão deixar para lá. Teria sido muito engraçado, se não fosse tão doloroso mentir e dizer que não sabia quem ele era. E também porque tinha sido comigo.

Já no ônibus, consegui encontrar um assento vago. Coloquei meu fone e apertei o play para músicas românticas. Foi inevitável não derramar pelo menos duas lágrimas, aquela situação era tão contraditória...

Eu o amava, mas me separei. Eu estava sofrendo, mas queria pelo menos continuar com ele. Tudo muito embaraçoso. Complicado. Sofrido.


|||

A primeira semana foi mais difícil do que eu esperara.
Simplesmente porque eu tive
que responder à todos daquela casa sobre o meu namoro e o que havia acontecido, porque Luiz havia feito um barraco pedindo perdão e todos assistiram àquilo como se eu fosse uma menina muito má por deixá-lo. Ele quase chorou. Só quase.

É claro que ignorei as perguntas do tipo "Jesus, Clari, o que houve? ", "Tadinho, perdoa ele, Clarisse", "Sinto muito", e essa última foi da Maya, a falsidade em pessoa. Ela pensava que eu era burra a ponto de não enxergar sua alegria por trás daquela máscara. Até fingi que acreditava nela, só fingi também. E inevitavelmente passei o dia do término em meu quarto ... Trancada e sozinha. Não queria ter que ouvir os perdões do Luiz que batia na porta, ou Cássia que mesmo com bom coração queria me aconselhar a pensar melhor, ou Maya com suas falsidades e o sorriso estampado na cara. Somente Nanda que estava no canto dela, não tinha aberto a boca para falar sobre Luiz, não o defendera, nem acusara. Aquilo me surpreendeu.

•••

Era hora do jantar e eu não queria mesmo ter que passar por todo aquele auê de gente dizendo para eu "deixar de bobeira". Mas, minha mãe, que havia chegado do trabalho, me obrigou a me sentar à mesa e me alimentar corretamente. Não discordei, estava faminta.

Pus os pés na cozinha e logo vi todo mundo sentado. Todos levantaram o olhar e ficaram me observando. O que foi estranho: ninguém tocou mais no assunto principal. Fiquei imensamente feliz. Até conversavam animados. Nanda estava falando com minha mãe sobre o vestido que tinha visto em tal loja, Doug tentava fazer meu irmão Lucas rir das palhaçadas dele e Davi estava no carrinho ao lado de Maya, que brincava com ele, arrancando-lhe umas risadinhas.
Cássia puxava um assunto ou outro comigo, tentando me animar também, enquanto Luiz mexia no celular, após ter limpado o prato, o olhei. Parecia tão animadinho, algo nas redes sociais havia mudado o humor dele... E muito, porque dias atrás estava me mandando mensagens, pedindo desculpas, dizendo estar arrependido, havia até esmurrado a porta de meu quarto, tentando abri-la para falar comigo uma vez, mas ali não, ali ele parecia um rapaz muito de boa, tranquilo e despreocupado.

Ah, como os homens são estúpidos. Sabia que deveria ter ouvido os "conselhos" da Maya. Só pode. Talvez ela tivesse enchido a cabeça dele de minhocas, para ter mudado tão rápido.

Minutos após o jantar, os dois subiram. Ele e ela. Maya e Luiz. Não dá para negar que fiquei morrendo de curiosidade e raiva. Nós mal tínhamos terminado, não tinha nem duas semanas e ele já estava com ela? Então Luiz não me amava mesmo?

Não suportei ficar ali com cara de tacho e dor de cotovelo. Estava sobrando. Despedi-me de todos e subi para o meu quarto.

Parei perto da porta do quarto de Luiz. Estava entreaberta. Senti algo me avisando que eu não deveria espiar o que estava havendo lá dentro. "Eu deveria ter escutado meu subconsciente. ". Teria evitado mais dores.

E o que eu vi me doeu de uma forma avassaladora. Talvez mais do que me separar dele.

Lá na cama, estavam os dois. Juntos. Se beijando. Maya tirava as roupas. Não havia palavras para expressar minha dor. Não éramos mais namorados, mas eu ainda o amava mesmo assim. Bom, parecia que ele tinha superado a separação.

Se pudesse medir minha dor, não me assustaria com o tamanho dela. Cambaleei para trás, senti meu peito se apertar, minha visão estava turva. Talvez fosse um pesadelo apenas... Mas não era. Eu estava ali, vendo que o amor da minha vida não me amava mais. Eu até poderia me debulhar em lágrimas, mas decepção foi tão grande que não saia nada, só sentia meu coração se despedaçando aos poucos, em milhares de pedaços. Ah, como doía, sentia-me sufocada.

Não existe nada pior que perceber que tudo está perdido. Não existe nada pior do que sentir seu coração se quebrar.

ClarisseOnde histórias criam vida. Descubra agora