15 - Não Gosto de Crianças

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Ai, merda.

Meu pai ia matar Steve antes mesmo de eu ter a chance de lhe contar que ele tinha um filho. Se bem que eu tinha quase certeza de que essa pedra já havia sido cantada. Ou ele era mentalmente perturbado (parecia) ou estava em estado de choque (com certeza). Mas havia uma terceira hipótese: talvez eu não tivesse percebido aquele detalhe antes: acho que ele gostava de falar aos berros sobre sacos cabeludos e levar surras.

James também gostava de falar sobre o seu saco o tempo todo. Será que isso era hereditário?

– Você é o…? – sussurrou Steve, olhando direto para James como se tentasse calcular de cabeça a raiz quadrada de PI.

– James Romanoff. E você quem é, bobalhão?

– JAMES! – ralhamos todos ao mesmo tempo, com exceção de Steve. Ele continuava com cara de quem ia vomitar a qualquer momento.

Merda, não foi assim que eu planejei que as coisas acontecessem. Sabia que depois de todas as nossas conversas e do quanto eu passara a conhecer Steve que eu teria que contar tudo… em breve. Aliás, tinha planejado contar naquele dia, com jeitinho.

Depois de ter lhe fornecido álcool em quantidade suficiente para embriagar um cavalo, é claro.

– Esse é um dos amigos da mamãe, filhote – disse a James. “Amigo” me pareceu melhor, no momento, do que “o pai que você nem sabia que tinha” ou “o cara que embuchou a mamãe”. Será que daria para esperar até James atingir a adolescência para traumatizá-lo com essa informação?

James pareceu ficar entediado com a falta de agitação na sala, já que todos continuavam paralisados na mesma posição, esperando o cérebro de Steve explodir a qualquer momento. James tinha a mesma capacidade de concentração de uma criança de dois anos que sofresse de DDA por abuso de crack. Começou a se debater no meu colo, pedindo para ser colocado no chão. Prendi a respiração quando ele foi direto e parou diante de Steve com as mãozinhas nos quadris.

– Você é amigo da mamãe? – questionou ele.

Steve simplesmente concordou com a cabeça, mas manteve a boca aberta de espanto, sem emitir nenhum som. Tenho quase certeza de que ele nem mesmo ouviu o que James tinha dito. Se alguém lhe perguntasse se ele gostava de assistir a filmes pornô gays enquanto pintava quadros de gatinhos felpudos, teria feito que sim com a cabeça.

Antes que alguém tivesse a chance de evitar, James ergueu um dos seus punhos pequenos e deu um soco certeiro na virilidade de Steve. Ele se dobrou para frente na mesma hora, apertando as mãos em concha entre as pernas e lutando em busca de ar.

– Ó meu Deus! James! – gritei, correndo para ele, me agachando novamente e forçando-o a olhar para mim, enquanto meu pai e Hill riam como duas hienas de porre, bem atrás de mim.

– Qual é a sua, garoto? Não se bate assim nas pessoas. NUNCA! – ralhei, com severidade.

Enquanto Steve tentava recuperar a respiração, meu pai conseguiu parar de rir por cinco segundos para pedir desculpas.

– Desculpe, filha. Provavelmente isso foi culpa minha. Deixei James assistir Clube da luta comigo, ontem à noite.

Sou a suprema humilhação de Natasha.

– Seus amigos te deixaram enjoada uma noite dessas, e você disse que esse aí era um dos seus amigos – explicou James, como se isso fizesse todo o sentido do mundo.

Só serviu para meu pai rir mais alto ainda.

– Você não está ajudando em nada, papai – grunhi, com os dentes cerrados.

– Você não devia deixar minha mãe mal, seu cara de pinto! – gritou James para Steve, colocando dois dedinhos em V diante dos olhos, para em seguida apontar diretamente para Steve, exatamente como Hill tinha feito mais cedo.

– Minha nossa! – exclamou Steve, com a voz ofegante. – Esse menino me jurou de morte?

– Minha nossa! – repetiu James com voz de menina.

Hill correu até onde ele estava e o pegou no colo.

– Muito bem, rapazinho, que tal eu, você e seu avô sairmos para dar uma volta e conversar sobre palavras de gente grande? – sugeriu ela, seguindo na direção do meu pai e levando-o para longe dali, empurrando-o pelo cotovelo.

Fiquei parada e lhe lancei um olhar de agradecimento. Hill simplesmente sorriu e levou meu pai pela porta com James, que lhe enchia os ouvidos comentando algo que vira num desenho do Bob Esponja.

Quando eu e James finalmente ficamos a sós, arrisquei dar uma olhada nele.

Notei que ele não me pareceu puto da vida. Nem triste. Parecia apenas não ter ideia de onde estava, nem de que dia era. Ficamos ali impassíveis, olhando um para o outro por vários minutos até que o silêncio, que se eternizava, me incomodou.

– Quer fazer o favor de dizer alguma coisa? – implorei.

Poucos minutos antes eu estava maravilhosamente feliz por Steve ter descoberto, finalmente, quem eu era. Ele me abraçou e ia me beijar. Agora, tudo estava arruinado e a culpa era unicamente minha, por não ter lhe contado mais cedo.

Steve balançou a cabeça com força para os lados, como se tentasse clarear as ideias.

– Crianças… – bufou. – Eu não gosto de crianças.

Mordi a língua. Ele ainda estava em estado de choque. Eu não poderia enchê-lo de porrada só por ele ter dito algo assim. Puxa, eu também não gostava de crianças e morava com uma. Amo meu filho, mas isso não significa que gosto dele o tempo todo.

– Eu usei camisinha! Tenho certeza que usei camisinha – disse ele, num tom de acusação, lançando um olhar de pânico na minha direção.

Quem me mandou morder a língua? O prazer que eu tinha sentido mais cedo, quando ele pressionou o corpo contra o meu e seus lábios provocaram arrepios no meu pescoço foi para o espaço naquele momento.

– Sério mesmo? Será que se lembra direitinho de tudo? Porque eu tenho certeza de que até vinte minutos atrás você não fazia a menor ideia de quem eu era. Mas uma coisa é certa: você realmente usou camisinha. Colocou aquele troço no pau depois de me penetrar três vezes e tirar minha virgindade. Aliás, deixe que eu lhe lembre uma coisinha, Einstein: camisinhas não são cem por cento eficazes, especialmente quando não são usadas da forma adequada. – Quase soltei fogo pelas ventas.

– Eu tenho ânsias de colocar tudo para fora quando alguém vomita na minha frente. E nunca troquei fraldas! – exclamou ele, horrorizado.

– Steve, ele tem quatro anos. Não usa mais fraldas. E não é Linda Blair no Exorcista. Não anda para cima e para baixo expelindo vômito verde o dia todo – expliquei, girando os olhos de impaciência.

– Meu saco está doendo. Preciso de um drinque – murmurou ele, antes de se virar e sair porta afora.

Sweet Malice ✔Onde histórias criam vida. Descubra agora