10/01/2018, 20:13
Av. Telles, Rio de Janeiro – RJ
601 B
A luz trêmula da luminária na ponta da mesa me faz apertar os olhos para entender a letra miúda que tento decifrar a alguns minutos, isso me faz perceber que o dia já se foi e que a luz que vinha da janela já não está mais lá para me ajudar a ler. Olho para a papelada espalhada pela superfície de madeira e a esperança de terminar isso ainda hoje parece cada vez menor. Corrigir provas sempre foi a parte menos prazerosa do meu trabalho, e olha que nele inclui aturar alunos mimados e totalmente desagradáveis reclamando por notas que consideram injustas.
Observo meu reflexo no espelho pendurado na parede a minha frente e as olheiras deixam claro que o cansaço já está me vencendo. Por isso empurro o papel na minha mão na pilha dos que ainda precisão ser corrigidos e contento em pensar só no banho quente e na cama confortável que me espera. Recosto sobre a cadeira esticando os braços para trás numa tentativa de alongar e assim criar coragem para sair dali. Fecho os olhos sentido o prazer de estalar as juntas do corpo quando sou retirado desse momento de tranquilidade pela porta do escritório se abrindo com força.
— Eu não acredito que você ainda está assim, Carlos Eduardo. — A voz da Helena ecoou como um trovão pelo ambiente.
Ouvir os meus dois nomes saindo assim da sua boca nunca é um bom sinal, mas é o vestido verde brilhante, o rosto maquiado além do normal e o penteado chique no cabelo que me fazem perceber que estou esquecendo algo importante. O seu olhar fulminante na minha direção faz um arrepio surgir pelo meu corpo e desejar não estar ali para presenciar sua irritação.
Talvez eu pudesse correr, mas não teria onde me esconder.
— Eu estou me esquecendo de algo, não estou? — pergunto temendo o que está por vir.
— Não sei por que ainda confio em você. Hoje é dia da premiação que tenho falado há semanas, a mesma que você prometeu que iria me acompanhar. — ela disse avançando pelo cômodo e apoiando as mãos na minha mesa, ficando com o rosto perto do meu.
— Oh! — exclamo lançando as mãos na cabeça, percebendo o tamanho da merda que fiz. — Mas eu preciso ir mesmo a esse evento? Ninguém vai sentir a minha falta...
— Eu sou uma das homenageadas da noite, Cadu. — ela disse em um tom ofendido. — Vai ser humilhante chegar lá desacompanhada. Eu sou sua esposa, é mínimo que pode fazer por mim.
— Eu sei, querida. Mas você sabe que eu odeio esses eventos pomposos. — disse contornando a mesa e me aproximando dela.
— E tudo que eu abrir mão por você? Nada disso conta? Eu tenho aturado sua falta de ambição todos esses anos e você não pode fazer algo por mim? — ela disse ainda mais furiosa. — É uma noite importante para mim e mesmo assim você parece não se importar.
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Desastres em Comum
RomanceA verdade é que todos nessa vida procuram o seu próprio final feliz, seja ele ter o emprego dos sonhos, a casa perfeita, uma família grande ou qualquer outra coisa que nos traga a felicidade. Para Ravi e Cadu essas metas já foram alcançadas, os dois...