16/01/2018, 03:39
Av. Telles, Rio de Janeiro – RJ
Edifício Otavio Cortês – 601 A
Tento ignorar o som de pássaros na janela, mas minha vista embaçada é o maior empecilho para conseguir me concentrar na tela a minha frente. O cansaço da noite em claro parece estar prestes a me vencer e o que me deixa mais frustrado é que foi inútil todo esse sacrifício, já que nenhumas das palavras que eu digitei ali pareceram boas o suficiente. Perdi as contas de quantas vezes comecei a escrever do zero e tudo que saiu da minha cabeça pareceu um lixo sem sentido que de maneira nenhuma poderia ser enviado para editora.
Esse é, sem dúvidas, o pior bloqueio criativo que já tive.
Antigamente era tão fácil transformar meus pensamentos em história, eu só precisava de um pedaço de papel e de uma caneta para criar um mundo novo. Era a minha forma de escapar dos murros que meus pais criaram em volta de mim, através da minha criatividade eu poderia ser outra pessoa e viver aventuras que pareciam tão distantes para mim. Escrever era o meu escape da realidade que vivia.
E foi por conta desse escape que surgiu O Herdeiro de Sangue, que no começo era só uma brincadeira que pensei que ninguém nunca fosse ler. Eu não tinha pretensão de fazer sucesso com esse livro quando comecei a escrevê-lo, ainda na casa dos meus pais, foi só anos depois que percebi que essa história poderia tomar vida e atingir outras pessoas. E foi o Pedro que abriu meus olhos para isso, já que foi o primeiro que deixei ler. Ainda me lembro das suas palavras quando terminou a leitura.
"Isso precisa ser publicado, eu não estou dizendo isso por que vou te levar pra cama daqui a pouco. Eu realmente me emocionei lendo isso daqui, isso me tocou de verdade. Você tem um talento foda e não pode desperdiçar deixando isso escondido em uma gaveta de cuecas."
Não foram as frases mais inspiradoras e bem elaboradas que ele já tinha me dito, mas eram tão verdadeiras que podia sentir isso na entonação empolgada que ele falava. Ele não parava de fazer perguntas sobre o livro, fazia teorias sobre a continuação e até torcia pelos possíveis casais, era seu jeito de demonstrar admiração e também de me incentivar a continuar escrevendo. E não cansava de dizer que seria meu maior fã, não posso negar esse titulo a ele já que comprou a primeira edição do livro e a guarda na cabeceira da cama. Por várias vezes já o peguei relendo a história, mesmo já conhecendo cada linha de cor.
— Ainda acordado? — Pedro perguntou se apoiando na cadeira a minha frente para amarrar os cadarços do sapato. — Sei que a sua criatividade não tem relógio, mas ainda sim você precisa dormir, sabia?
— É eu sei... — gaguejei. — Só preciso escrever mais algumas páginas.
— As ideias estão aqui dentro, elas não vão fugir se você for descansar um pouco. — ele disse tocando minha cabeça com a ponta dos dedos.
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Desastres em Comum
RomanceA verdade é que todos nessa vida procuram o seu próprio final feliz, seja ele ter o emprego dos sonhos, a casa perfeita, uma família grande ou qualquer outra coisa que nos traga a felicidade. Para Ravi e Cadu essas metas já foram alcançadas, os dois...