"Robin,
Eu sei que isso vai parecer estranho, mas minha madrasta tem um plano para me ajudar a fugir.
Não acredite nos boatos, quando ouvir que estou morta. Eu não estou. A Rainha me deu uma poção para que eu pareça morta por vinte e quatro horas.
Amanhã à noite, serei colocada na cripta no subsolo do castelo. O túnel que lhe mostrei o levará até lá. Se a Rainha não tiver aproveitado a oportunidade para me envenenar, espero despertar ao seu lado.
Esperando vê-lo em breve,
Branca de Neve".
Por um momento, Robin pensou ter lido errado. Sempre soubera que a Rainha odiava Branca de Neve, e que seu único desejo era vê-la morta. Como sua Princesa concordara em adotar um plano da madrasta?
Só lhe restava ter paciência, e esperar pela noite, para entrar no castelo e resgatar sua amada. Então, quando despertasse, ela mesma poderia explicar essa estranha história.
A bandeira no castelo foi baixada a meio mastro não muito depois do amanhecer. Pelo meio da manhã, começou a circular a notícia de que a Princesa Branca de Neve morrera enquanto dormia. O povo estava inconsolável. Como algo terrível fora suceder a uma alma tão boa?
O anúncio formal só foi feito no início da tarde, por um arauto, enviado à praça principal da cidade para dar a triste notícia à população.
Era costume no reino que o funeral durasse pelo menos três dias, porém, Branca de Neve seria sepultada ao crepúsculo. Ninguém explicou o motivo, mas correu um rumor de que a Princesa fora vítima de uma doença rara e traiçoeira, e que o cadáver apodrecia mais rápido do que o normal por causa dessa moléstia.
O Rei não queria que o povo visse sua linda filha naquele estado, foi o que explicaram os criados a quem se atreveu a chegar-se ao portão do castelo para perguntar.
– Pobrezinha – sibilou uma das camareiras da Princesa, chorando junto ao portão. – Fui eu que a encontrei morta. Não respirava, e a pele, outrora tão alva, estava cinza. Manchas negras surgiam nos braços e no pescoço. Oh, que doença terrível!
Will Scarlett cobriu a boca com ambas as mãos ao ouvir esse relato. E apressou-se a dar a notícia a Robin Hood.
– Foi o mal da bruxa! – disse o rapaz, sem fôlego pela corrida desabalada pelas entranhas da floresta, até a clareira que servia de esconderijo ao bando.
– Que bruxa, garoto? – indagou Pequeno John, sem compreender o que ele dizia, pensando que o amigo tivera algum pesadelo.
– Não sei... A Rainha talvez – disse Will. – A criada disse que a Princesa tinha a pele cinza e manchas negras crescendo pelos braços e pelo pescoço. Já vi isso antes. Aconteceu, anos atrás, na comarca vizinha. Na época em que ameaçaram queimar a bruxa na fogueira, vocês se lembram?
– Me surpreende você lembrar. Estava ainda nos cueiros quando isso aconteceu...
– Aquelas duas mulheres tiveram a mesma moléstia que matou a Princesa, e todos disseram que foram amaldiçoadas por uma bruxa. Chegaram a prendê-la.
– Sim, eu me lembro – disse Frei Tuck. – Ela ficou numa cela na Igreja, mas se transformou em corvo antes que ateassem fogo à sua pira, no dia da execução. Não sei por que, mas não consigo me lembrar do rosto dela.
– Lembro que tinha cabelos ruivos – disse Pequeno John.
– Eu me lembro que ela se parecia um pouco com a finada Rainha Morgana – disse Will Scarlett.
– Você não tem como se lembrar disso – disse Pequeno John.
– Eu me lembro, sim. Poderiam ser irmãs, eu acho. Ou, quem sabe, a mesma pessoa.
– A Rainha Morgana não era uma bruxa – disse Pequeno John. – Se fosse, a Princesa Branca de Neve também seria. E certamente não teria morrido dessa praga.
Quieto a um canto, Robin Hood ouvia atentamente o que eles diziam, e as palavras que Branca de Neve lhe escrevera, martelavam com força em sua mente:
"Se a Rainha não tiver aproveitado a oportunidade para me envenenar..."
A Rainha Morgana talvez não fosse uma bruxa... Mas a Rainha Má era. Disso, Robin não tinha a menor dúvida. E como um passarinho entra voluntariamente na armadilha, Branca de Neve permitira que ela cumprisse seu pérfido intento.
A Rainha Má assassinara Branca de Neve.
Longe dali, na cabana da floresta, as irmãs Cassandra e Theodora também eram informadas do infortúnio da Princesa.
– Katherina deve ter enlouquecido – disse Theodora. – Usar nossa poção secreta para ajudar aquela Princesa dissimulada...
Vinte anos antes, na comarca vizinha, Cassandra e Theodora usaram esse mesmo artifício para simular suas mortes, e escapar das acusações de bruxaria, e, principalmente, para incriminar Morgana. As pessoas chamaram os sintomas da "doença" de "O Mal da Bruxa", pois os "cadáveres" ficavam horrendos poucas horas após a ingestão da poção. Tudo desaparecia assim que o efeito se dissipava, mas quem chegou a vê-las, jamais esqueceria as veias negras se espalhando por sua pele acinzentada.
Morgana fora acusada de bruxaria, e de ter lançado essa "praga" sobre elas, mas fugiu antes de sua execução.
Quando as duas bruxas despertaram de seu "sono da morte", a feiticeira maléfica havia desaparecido.
Nessa mesma época, a Rainha Leda, primeira esposa do Rei John, caíra num lago congelado, e Morgana viu nisso a oportunidade de ocupar o trono dela.
– Precisamos agir depressa, antes que o mal seja concretizado – disse Cassandra.
– Vigie a Princesa, e avise-nos quando ela despertar – ordenou Theodora ao Corvo.
A ave alçou voo, rumo ao castelo, desaparecendo entre as árvores.
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Branca de Neve e a Rainha das Trevas
Short StoryEra uma vez uma história que você já conhece: sobre uma Rainha que costumava consultar seu Espelho Mágico; uma Princesa que comeu uma maçã vermelha como sangue; e a inveja daquela que viu ameaçado o posto da mais bela de todas... Tem certeza que voc...