Prólogo

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No crepúsculo sombrio, um trovão rugiu no céu. Embora a tempestade se aproximasse rapidamente, uma multidão se reunia na praça diante do castelo. Aquela não era uma tarde qualquer. Todos estavam ali para assistir ao enforcamento de uma bruxa.

– Este tempo é mau agouro – murmuravam alguns.

– Até o sol se recusa a oferecer um último alento à maldita – rosnavam outros.

À sexta badalada do sino da Igreja, ouviu-se o som de uma trombeta, anunciando a hora da execução. Em pé, na varanda do castelo, o Rei John assistia, enquanto os guardas conduziam a prisioneira ao cadafalso. Com uma expressão dura no rosto, a bela mulher esperou enquanto o carrasco passava a corda em seu pescoço, encarando um ponto fixo à sua frente, sem olhar diretamente para ninguém. Não havia medo em seus olhos, nem arrependimento. A mulher que outrora fora Rainha daquele reino partiria oferecendo a qualquer expectador apenas o seu desprezo.

– Katherina Mondragón – começou o magistrado, com um grande pergaminho aberto nas mãos. – Pela acusação de assassinato da Princesa Branca de Neve você foi declarada culpada, e condenada à morte. Pena que será executada imediatamente. Você tem direito a uma última palavra.

A Rainha permaneceu imóvel, sem dizer nada, e sem qualquer mudança em sua expressão dura.

– Muito bem – disse o magistrado, sinalizando ao carrasco que podia ir em frente com seu trabalho.

O carrasco contornou a condenada, e agarrou firme a alavanca que abriria o alçapão, e selaria o seu fim.

Na multidão da praça, alguns prenderam a respiração, aguardando o momento final daquela que agora todos alcunhavam a Rainha Má. Alguns desviaram o rosto ao menor sinal de movimento da mão do carrasco; outros permaneceram com os olhos fixos na condenada, aguardando...

Subitamente, um silvo cruzou a praça, e uma flecha atravessou com precisão a corda da forca, pouco acima da cabeça da Rainha, no exato momento em que o alçapão se abriu. A Rainha Má desabou no chão. Apesar de um leve torção no tornozelo, não pôde deixar de sentir o alívio por não ter sido seu pescoço a quebrar.

Um enorme rebuliço tomou conta da praça. De todos os lugares surgiam homens armados com arcos ou espadas, irrompendo bravamente contra os guardas do Rei. Os populares mais corajosos envolveram-se na luta, ajudando como podiam: com facas, bordões e pedaços de pau, enquanto os demais fugiam da confusão.

– Guardas! – bradou o Rei. – Prendam todos esses arruaceiros!

Era uma ordem inútil, pois os guardas já estavam completamente envolvidos na luta ferrenha. Uma loba saltara sobre o carrasco e o dilacerava enquanto os guardas nas proximidades tentavam conter a confusão.

Um cavaleiro misterioso, com o rosto coberto com uma máscara negra, abriu caminho a golpes de espada pela praça, até chegar ao pé do cadafalso, onde dois dos invasores ajudavam a Rainha a se levantar.

– Não deixem a prisioneira fugir! – berrou o Rei.

Mas era tarde. Os rebeldes cortaram as cordas que prendiam suas mãos às costas, e ergueram-na para a sela do cavalo. Agarrando-se firmemente à sela e ao cavaleiro salvador, a Rainha Má procurou chutar qualquer um que se aproximasse. Os rebeldes enxamearam em torno do cavalo, afastando os populares e os soldados, enquanto o cavaleiro habilmente abria caminho para fora da praça.

Assim, resgatada na hora final por um cavaleiro misterioso, a Rainha Má desapareceu nas sombras da floresta.

Um segundo cavaleiro, igualmente encapuzado, juntou-se aos fugitivos na margem da estrada, guiando-os pelos atalhos da floresta para longe do castelo.

Somente ao chegar ao esconderijo seguro, num complexo de cabanas suspensas entre as copas de grandes árvores ao redor de uma clareira, os cavalos descansaram, e os cavaleiros ajudaram a Rainha a desmontar.

– A quem fiquei devendo a vida? – perguntou ela, assim que recobrou o fôlego.

– Adivinha? – disse o cavaleiro que os escoltara, cuja voz fora reconhecida antes mesmo que o capuz fosse despido.

A voz da Rainha saiu num suspiro de alívio:

– Branca de Neve!

Branca de Neve e a Rainha das TrevasOnde histórias criam vida. Descubra agora