O jantar transcorreu tranquilamente e mesmo eu sentindo certa tensão no ar, ele era bem disfarçado.
Como sempre, meu jantar havia sido esquematizado de acordo com as horas de um relógio e eu era o único que não me servia diretamente da mesa. Minha carne estava cortada em pedaços para que eu não precisasse usar uma faca e se encontravam às três horas, a salada se encontrava às nove e as batatas às seis. Era basicamente isso o que eu comia, nada que me desse trabalho, mas que também não me deixasse com fome. O cardápio para os visitantes era bem mais requintado. Isso eu podia saber pelo cheiro.
Quando terminei de comer, coloquei os talheres de lado e peguei o guardanapo ao lado direito do prato.
- Você estudava na Hanlim Multi Arts School, antes do acidente? - perguntou Kim casualmente.
Estranhei o modo banal a que ele se referia ao acidente e a forma indiferente com que fez a pergunta.
- Você não é obrigado a conversar comigo - respondi, pousando guardanapo de pano, cuidadosamente, na mesa.
Ouvi seu riso baixo.
- Não sei por que ainda tento...
- Nem eu - concordei torcendo os lábios, impaciente - mas só para não ser mal educado eu vou responder a sua pergunta: sim, eu estudava no Hanlim Multi Arts School.
- Ouvi falar sobre você e seu amigo...
- Macau.
- Como?
- O nome dele era Macau
- Ouvi falar sobre você e Macau - repetiu ele.
- Aposto que sim - retruquei irônico - Ainda somos assuntos naquele colégio?
- Você é desagradável - Kim falou baixo, mas com o tom de voz divertido.
- Você é insistente.
- Tem medo, Chay? - perguntou. Senti que ele se aproximou um pouco. Ninguém ouvia nossa conversa.
- Medo do que?
- Medo de alguém se aproximar de você... Pelo jeito não tem tido muitas conversas casuais com ninguém. E, como disse seu irmão, você não tem amigos.
- Foi uma escolha - rebati irritado.
- Uma escolha? Quem escolhe ficar longe das pessoas?
- Eu. - respondi.
- Você tem medo - ele concluiu. Eu podia imaginar que ele sorria.
- Você não me conhece. Não fique me analisando - o repreendi, querendo sair da mesa.
- Estou tentando te conhecer.
- E para que? Não vamos ser amigos... Não quero amigos...
- Você é muito presunçoso... - comentei virando o rosto para outro lado. Era estranho, mas eu me sentia levemente sem jeito - Porque insiste tanto? Não vê que me irrita e me deixa nervoso?
- Pelo menos há alguma reação...
- Por acaso acha engraçado ficar falando gracinhas?
- Só você não ri... - ele gargalhou baixo - Você está vermelho.
- Oh! Sim! Senhor engraçadinho... - disse com os dentes cerrados e controlando para não falar alto.
- Quero ser sua amigo, Porchay...
- Por quê? É Pena? Obrigado, mas não preciso.
- Eu já disse que não sinto pena de você. Essa sua língua afiada não faz ninguém ter pena de você. A não ser você mesmo, talvez.
- Não tenho pena de mim mesmo. - retruquei quase bufando.
- Essa sua autodefesa instantânea me irrita.
- Que ótimo!
- Me irrita, mas eu gosto - completou Kim. Ele parecia mesmo estar querendo me irritar e estava conseguindo, mas eu sentia algo diferente... Vontade de rir... - Eu não sei o porquê, mas... Quero ser seu amigo... Depois daquele dia no seu jardim...
- Obrigada por me lembrar disso - cortei seco.
- Depois daquele dia no jardim - continuou como se eu não houvesse interrompido - Fiquei pensando no que fazer para recompensar minha tremenda ignorância com relação ao seu problema.
- Oh! Passou seus dias pensando em mim? Fico lisonjeado! - eu disse irônico.
- Você pode ficar quieta um instante? - a voz soou um pouco irritado. Fiquei quieto - Quero te fazer uma proposta...
- Proposta?
- É algo que seria interessante e... Consequentemente nos tornaríamos amigos... Isso seria algo bom para mim e para você.
- Para mim?
- Você pararia de ser tão chato.
- Elogios! - Me peguei pensando em quando o jantar terminaria. Respirei fundo. - Qual é a proposta?
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Be My Eyes - KimChay
Fanfiction[CONCLUÍDO] Há um ano, eu havia sofrido um sério acidente de carro. Meu amigo, que dirigia, havia morrido no caminho para o hospital de parada cardiorrespiratória. Foi difícil. No começo, tudo me irritava, principalmente a morte de Macau. Era difíci...