- Quero ser seus olhos - Kim disse baixo e sua voz soava muito séria.
Aquela frase ficou pairando em meus ouvidos até começar a fazer algum sentido.
Comecei a me sentir quente por dentro. Como ele pôde propor tal coisa?
Senti a raiva subir sem controle pelo meu corpo. Levantei-me, rapidamente, ouvindo a cadeira cair para trás. A mesa ficou em silencio.
- Acha que é engraçado ser cego, Kim? Acha que é engraçado querer bancar meu cachorro guia? - perguntei colocando as mãos sobre a mesa e me inclinando em direção a ele. Eu respirava rápido. - Você é um completo idiota.
- Porchay! - ouvi meu irmão me repreender, surpresa com minha repentina reação.
- Não chegue mais perto de mim! - exclamei começando a me afastar, quase tropeçando no degrau que levava para o pátio dos fundos.
No jardim, sentindo o vento bater no rosto eu tentei me acalmar para não chorar. Joguei os óculos longe, revoltado. Nunca imaginei que alguém pudesse brincar comigo desse jeito. Nunca pensei que... Como ele podia?
Que tipo de proposta ele achava que estava me fazendo? Ele não tinha ideia de como era ser cego. De ter que depender dos outros para fazer qualquer coisa. De ter que vestir roupas que nem sabia como eram. Não sabia como era conhecer alguém, sem saber qual era sua aparência, seu sorriso. De não poder mais ver a cor do céu quando está chovendo ou o sol se pondo. Ele não sabia anda disso! Era um imbecil!
Umedeci os lábios ouvindo o som do vento batendo nas flores ali e me trazer um cheiro doce e suave. Eu não sabia nem em que lugar do jardim eu estava naquele momento. Senti vontade de gritar.
- Porchay... - Passos se aproximavam de mim. Era Kim.
- Como consegue? - perguntei lentamente, controlando a raiva - Como consegue ter a cara de pau de vir falar comigo depois do que fez?
- Não era minha intenção te ofender... - ele disse baixo, ainda se aproximando.
- Você não tinha e não tem o direito, Kim, de fazer isso comigo. Não me conhece. Não sabe o que eu passei para chegar ao que sou hoje. Não pode chegar querendo mudar meu mundo.
- Eu só queria... - Ele estava logo atrás de mim e sua voz próxima me causou arrepio - Não sei o que estava passando pela minha cabeça. Você parece tão triste... E não tem o porquê de se isolar só porque é cego! Eu queria ajudar...
Soltei um suspiro, balançando a cabeça lentamente.
- Não quero e não preciso de sua ajuda...
- Me de uma oportunidade, Porchay - pediu ele postando-se a minha frente. Seu perfume flutuava em minha direção.
Ri ironicamente, baixando o rosto.
- Seus olhos não perderam a cor... - comentou Kim, erguendo meu rosto pelo queixo. Esse gesto me deixou sem ação. Uma corrente de eletricidade percorreu meu corpo. Afastei-me.
- E o que vai fazer se eu aceitar sua proposta? Dizer-me o que tem em meu jardim? Levar-me para passear na esquina? Isso é um pouco patético. - Cruzei os braços no peito imaginando á quantos passos eu estaria da porta. Eu odiava ficar perdido.
- Se for o que você me pedir, eu faço... - Pude perceber, pela entonação da voz, que ele sorria. - Mas não é isso o que eu tenho em mente.
- E o que tem em mente?
- Parques, talvez... Algum lugar divertido, onde você não fique sozinho e mal humorado.
- Não entendo porque você acha que eu fico sozinho... - minha irritação ia diminuindo consideravelmente.
- E não fica?
- Não. Eu frequento um instituto duas vezes por semana e também tenho aulas particulares... Estou sempre com Skoop ou Porsche. Não me sinto sozinha...
- Sua agenda é lotada - contatou ele. Percebi que Kim andava para lá e para cá.
- Consideravelmente cheia - corrigi e depois me repreendi, pois havia acabado de dizer, mesmo que indiretamente, que eu tinha tempo para fazer programas com ele.
Ele riu, vendo que o clima estava ameno.
- Aceite Porchay - pediu ele vindo novamente em minha direção - Saia apenas uma vez comigo, como amigas e se não gostar, não irei mais insistir.
- Você já está insistindo.
- Apenas uma vez... Só uma...
Mordi os lábios, indecisa. Eu sabia que Kim tinha boas intenções, mas eu não estava acostumado a confiar ou depender de estranhos. Ele me causa sentimentos estranhos. Me deixava agitado e confuso.
- Ok. Apenas uma vez - aceitei com um suspiro, incerto.
- Não vai se arrepender - A mão dele pousou em meu rosto e seu cheiro se aproximou. Seus lábios pousaram em minha bochecha. Meu coração acelerou por um instante e novamente me arrepiei.
Ele se afastou, dando um passo para trás.
- Não quero que faça isso de novo - eu o repreendi, me virando e tentando adivinhar o caminho para voltar para casa.
- Por aqui - Kim pegou em meus braços e me guiou até minha casa.
As vozes que vinham da sala de estar ja haviam cessado. O único barulho que era possível ser escutado, era respirações aceleradas. Vindas da cozinha.
- Porsche?
Em poucos segundos, pude ouvir sua voz.
- Chay! - pelo tom de voz de Porsche, ele estava contente - Estavamos na cozinha, preparando uma sobremesa. - apenas sorri.
- Não estou afim de comer doce, estou me sentindo tonto - pronunciei, sentindo Porsche se aproximando.
- Talvez você esteja cansado, Chay, quer ir se deitar? - perguntou meu irmão. Sua voz estava ofegante e baixa. Parecia que o mesmo tinha corrido uma maratona.
- Acho que sim - murmurei segurando sua mão - Boa noite.
- Nos vemos amanhã, as 15horas - ouvir Kim dizer isso, me fez para e me voltar para ele - Vamos sair, esqueceu?
- Oh!... Claro - resmunguei contrafeito - Boa noite senhor Kinn e Tankhun e me desculpem o mal entendido.
- Não se preocupe! Khun já foi embora, mas digo a ele que você está bem - exclamou Kinn - Boa noite.
- Vamos...
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Be My Eyes - KimChay
Fanfiction[CONCLUÍDO] Há um ano, eu havia sofrido um sério acidente de carro. Meu amigo, que dirigia, havia morrido no caminho para o hospital de parada cardiorrespiratória. Foi difícil. No começo, tudo me irritava, principalmente a morte de Macau. Era difíci...