Capítulo 5: Mira

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Aquele incômodo na barriga desde o momento que acordei como se fosse uma facada. Para ajudar, agora uma dor de cabeça constante. Mesmo sendo seis da manhã a luz do sol clareia fortemente pela janela, por isso mantive as cortinas fechadas.

Daya dorme profundamente com o rosto amassado no travesseiro e uma das pernas jogadas em cima de mim, ela se mexe a noite toda e quase todas as manhãs acorda com metade do corpo para fora da cama ou jogada em cima de mim. Os cabelos sempre jogados a frente do rosto e a mão fechada encostada na bochecha.

Hoje é meu dia de folga e Daya não tem aula. E mesmo querendo muito dormir até mais tarde, acordei com a cabeça latejando. Me levanto indo até o banheiro pegar a maleta de remédios, tomo um e volto a me deitar abraçando Daya novamente.

Por fim acabei pegando no sono de novo, o remédio tinha ajudado. Daya e eu acordamos já passava das dez da manhã, e mesmo assim, queríamos ficar mais. Mas, tínhamos marcado de patinarmos. Bom, ela patinar e eu olhar já que nunca fiz isso na minha vida.

- Você já fez isso mesmo? - pergunto, terminando de fazer uma trança no seu cabelo.

- Foi aquele passeio da escola. - ela sorri - Aprendi rápido.

- Claro, é inteligente - beijo a bochecha dela. - Coloca os sapatos, nós já vamos.

Daya vai até a sala para colocar o tênis. Antes de sair fico me encarando no espelho, ganhei alguns kilos depois que comecei a me alimentar direito e parei de apanhar. Minha perna já estava cicatrizada e as cicatrizes que tenho pelo meu corpo são apenas um reflexo do que minha vida foi. A cicatriz que tenho no rosto consigo disfarçar com um pó compacto, mas odeio me maquiar. Prefiro deixar meus poros respirarem.

Os olhos de Daya brilharam quando entramos na pista de patinação. Só com um aceno de cabeça ela entendeu que podia se divertir a vontade, ela merecia.

Fomos até um tipo de recepção e alugamos um patins, capacete e o resto dos equipamentos de proteção para ela. Eu, como não sei patinar e nem quero me arriscar a quebrar meu nariz no chão, vou apenas ficar sentada acompanhando e tirando fotos dela. Havia prometido para mim mesma que não iria deixar esses momentos serem apenas momentos. Iria guardar de lembrança porque Daya crescerá e não será mais criança daqui uns anos.

- Quero que vá devagar e tome cuidado, ok? - termino de prender o capacete dela e arrumar sua tornozeleira.

Daya dá um sorriso amplo, o que não vejo tem uns dias. Pelo menos ela se animou ainda mais agora que avistou uma amiguinha da escola.

Fico olhando quando ela se afasta e vai para a pista lotada de adultos e crianças. Não evito um sorriso quando a vejo abraçar sua amiga e juntas patinarem. Justamente pelo lugar estar lotado mantenho meus olhos atentos a tudo e a todos. Nunca se sabe quando um idiota pode fazer gracinha.

Pais e filhos, namorados, grupo de jovens não param de entrar. Aproveito para já fazer o pedido da pizza de brigadeiro que Daya ordenou que eu pedisse.

Até pensei em abrir minhas mensagens e ver se há alguma de Amberly, mas é óbvio que não tem. O pior de tudo é que, mesmo não querendo, acabo pensando que Amberly realmente tenha desistido. Ainda sim, mantenho a aliança no meu dedo, lutando pela vontade enorme de tirá-la e guardá-la ou simplesmente jogá-la pelo ralo e mandar esse relacionamento se foder.

Resolvo tirar Amberly da cabeça pelo menos hoje. Essa noite meus pensamentos precisam estar em Daya e eu, fazer a minha filha se distrair e se sentir feliz um pouco. E pelas risadas dela, estava funcionando.

Uma pontada no centro da testa tira minha atenção da pista. Resmungo baixo passando meus dedos no local para aliviar as dores. Se eu mantesse relações com um homem até apostaria numa gravidez, mas isso está completamente fora da casinha. Os pelos do meu braço arrepiam, meus sentidos me alertando. Levanto meus olhos percorrendo-os pelo estabelecimento, canto por canto, até pararem em dois homens parados na porta olhando como se estivessem procurando alguém. O primeiro é um homem branco de 50 cinquenta anos, cabelos pretos e barba branca, e uma jaqueta de couro com a gola levantada. Já o segundo, o mesmo homem negro da cafeteria, usando terno cinza.

Me levanto colocando as mãos no bolso, soltando meus cabelos e andando na direção oposta, mas sempre observando. Quando finalmente parei atrás de um casal com um menino voltei a olhá-los. Um olho nos dois homens e um em Daya. Um mal pressentimento atravessa meus ossos e meu corpo trava assim que o homem de barba branca fixa seus olhos em mim abrindo um sorriso travesso no rosto. Eles dão um passo em minha direção, tento me mover, mas algo me impede. Começo a ter tonturas, minha cabeça lateja novamente. Involuntariamente, agarro a primeira coisa que está ao meu alcance. Na verdade não sei o que é. Mas gritos invadem meus ouvidos e quando minha cabeça para de doer vejo sangue nas minhas mãos e roupas. A minha frente, o corpo do menino estirado no chão com um corte no pescoço e embaixo uma poça de sangue, a mulher tentando parar o sangramento do menino e várias pessoas correndo.

- Aí meu Deus, me desculpa. - sou agarrada por um homem que tenta me impedir de ajudar. Mas como que automaticamente dou uma cotovelada em seu rosto fazendo-o cambalear para trás e me soltar.

Daya me encara com os olhos arregalados e quando penso em correr em sua direção para sairmos dali, a menina que estava ao lado de Daya cai com um tiro na nuca. Daya se afasta gritando, mas cai de joelhos em cima de alguma coisa e se arrasta. Não havia notado que mais pessoas estão machucadas ou mortas.

- Daya!

- Amelie, meu bem. - me viro assim que ouço a voz feminina atras de mim encontrando minha mãe parada no meio dos dois homens. Ela veste um terno preto, calça social e salto alto preto. O cabelo preso num rabo de cavalo dando-lhe um tom de superioridade. O que chama minha atenção é o revólver em sua cintura.

- O que a senhora tá fazendo?

- Amelie, você não entendeu ainda as consequências de virar as costas para nós. - ela diz. Dou um passo em sua direção, mas meu corpo trava no lugar. Na mão de Megan um pequeno tablet. Ela se aproxima devagar ficando frente a frente comigo. - Olha só pra você. - ela passa a mão pelo meu rosto antes de sorrir - Querida, eu lhe ofereci uma oportunidade e você recusou. Sabe o quanto eu odeio desobediência. Quando Guimarães me disse que você não cederia fácil, não imaginei que seria assim. Agora eu quero que se despeça da sua filha porque você vem comigo. Temos coisas a fazer, negócios a começar e eu preciso de você.

- Eu não vou à lugar algum.

- Não está em condições de negar, Amelie. - Megan responde. Com o canto dos olhos vejo um ponto vermelho na testa de Daya, ela estava na mira. Aquele medo que senti quando Mateo apontou uma arma na cabeça dela apareceu. Luto contra meu corpo e tento me mover, mas ao fazer isso uma dor insuportável começa me fazendo gritar. Não sei exatamente onde a dor está, mas é como se meu corpo todo estivesse se quebrando até que eu fique ajoelhada. - Não resista, Mel. Isso é doloroso, sei que está assustada. Agora, por favor, não faça nenhuma besteira, venha comigo e sua filha sai daqui ilesa.

Não tive tempo algum para responder. Alguma coisa é aplicada no meu pescoço, minha visão fica embaçada e a única coisa que vejo é o chão.

SURVIVE - 3 TEMPORADA (EM ANDAMENTO)Onde histórias criam vida. Descubra agora