O plano

497 57 170
                                    


  Eu caminhava em direção a imensa árvore de figueira.

A imensa árvore de muitas ramificações e folhas em formato de coração jazia única no pico daquela montanha e eu sabia seu nome: A grande e antiga árvore de Bodhi.

O vento soprava suave em meu rosto, a grama estava macia sob meus pés nus, e o largo manto que envolvia meu corpo tinha uma ampla abertura nas minhas costas para revelar todo o sutra do coração.

Eu sabia, eu sentia, e eu via que aos poucos conforme eu me aproximava, outras oito pessoas se aproximavam também até que ficamos os nove ao redor da imensa árvore milenar e então uma mulher surgiu de dentro da árvore, seus troncos que já eram emaranhados entre si se retorceram e de lá ela saiu vestida com um longo manto vermelho e um rosário nas mãos.

Eu senti meus joelhos dobrarem e logo todos os outros oito fizeram o mesmo e eu me ouvi em uníssono com todos em uma saudação suave a ela:

— Vá, vá além, vá além do além, desperte! Oh Mãe das mães, Maia Devi.

— Sejam bem-vindos meus filhos e que seus passos sempre os tragam de novo ao início, pois a forma não é outra senão o vazio e o vazio é a forma.

— Vá, vá além, vá além do além, para a outra margem e desperte! E veja a Iluminação!

Todos se ergueram e eu fiz o mesmo, curioso ainda que ciente de tudo, como se meu coração soubesse, mas minha mente ainda não compreendesse todo o cenário e ritual.

Ela sorriu serena e me olhou diretamente estirando os braços em um convite:

— Seja bem-vindo de volta, Mārga. Que bom que agora está apto a relembrar, como foi a roda para você nesses séculos em ausência entre nós?

— Mārga?

— Sim, esse é o nome da sua alma não importa qual encarnação esteja, todos temos nomes de alma que só é conhecido quando transcendemos. Venha, me abrace, meu filho.

E eu fui para ela sendo acolhido em um abraço materno, mas também acalentador e ali eu senti, eu soube, que estava no lugar certo, que estava no caminho que deveria, que tinha feito bem e que faria ainda mais, porque esse era meu caminho e meu destino. O que foi traçado nas estrelas e para além delas. Como uma luz do mundo eu devia trilhar os meus passos muito bem, mesmo errando, mesmo cometendo pecados ainda deveria retornar ao meu caminho, porque eu era um dos nove e esse era meu legado. E lutar contra o mal e ser uma luz onde todas as outras não podiam alcançar era também meu dever.

— Você tirou uma vida recentemente, precisa se livrar desse peso e dessa mancha, está preparado?

— Ele era uma alma ruim, eu não sinto remorso, mãe. Mas sei que não devia tê-lo feito com minhas próprias mãos. Eu peço perdão pelos meus atos, mas não pelo mal que livrei minha terra.

— Todo mal pode ser resgatado e transmutado, mesmo que seja pelo fogo comum. Você não está na roda para tirar vidas por isso não repita essa atitude, compreende? Deixe que outros se maculem, você é um consagrado, você dá vida e não as tira. Você e seus irmãos são os abençoados diretamente de Buda.

— Sim, mãe; Eu compreendo.

— Feche seus olhos e receba sua remissão.

— Eu sou um consagrado e eu vou além, vou para a outra margem, pois eu vejo a iluminação.

Disse baixinho e então senti minha pele arder e tudo ao meu redor queimar. Eu queimava, ardia, a dor era lacerante, mas fiquei ainda preso aquele abraço até perder o fôlego, as chamas virarem cinzas e subirem aos céus do nosso corpo entrelaçado como um e então finalmente eu fui solto dos braços dela. A dor minha era a dor dela e a dor dela todos sentiam, mas no fim, ambos estávamos chamuscados, ainda assim vivos e quase ilesos.

CobiçadoOnde histórias criam vida. Descubra agora