Mudança da Maré

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  O estábulo era limpo, simples, organizado e só havia a égua ali comendo tranquilamente. Dona e única habitante do lugar.

— O estabulo é só dela?

— Sim. Só dela.

Leo respondeu e eu assenti indo até ela. Ele ia me impedir, mas Amélia pediu que ele me deixasse e por fim ninguém me impediu de ir até o animal elegante e belo. Aquele era o único ser que Daniel se permitia aproximar, ela era o elo e eu sentia.

Apenas sentia...

Outra fêmea, mais uma fêmea ao redor daquele homem.

— Então você é o amor da vida desse homem hein, Centelha? – Sussurrei chegando até ela e a por fim a olhando nos olhos. Seus olhos eram negros e inteligentes... Seus olhos...

Eram calmos e me lembravam de outros...

Centelha... Fagulha...


E naquele segundo eu não estava mais ali, estava em outro estábulo, outro lugar, e me vi, um eu mais jovem, bem mais jovem saltando em uma égua branca e veloz e saindo cavalgando tão rápido quanto o vento rumo a uma praia linda e deserta onde uma mulher acenava ao longe para um barco que chegava e então o meu eu jovem se sentiu sombrio, parando a cavalgada e olhando para o navio do alto do paredão de pedra com um sentimento ruim. A cena mudou e eu já era eu adulto, em uma casa arejada, mas onde eu não me sentia mais tranquilo pois ali morava agora um homem... Um homem que se casou com a minha mãe e que agora era um viúvo rígido: O homem não era samoano, ele era espanhol e tinha todo um ar duro ao seu redor, ele tinha vindo de muito longe para se casar com a minha mãe, mas o casamento durou pouco. Agora eu sabia o porquê me ressentia ainda mais naquele momento em que ele me colocava contra a parede de maneira dura:

— Você acha que é gay!? Isso é falta de mulher de verdade, mas hoje nós vamos resolver isso! Você é um Kimoa, e vai honrar seu sangue, moleque!"

— Você não pode me dizer isso, nem Kimoa você é, Tabat, não tem direito!

— Eu sou sua única família agora, claro que tenho e vamos resolver isso essa noite mesmo! Sua mãe ficaria horrorizada ao ver você se beijando com aquele pescador inútil! Você foi criado solto de mais, Alexander! Mas isso mudará essa noite!

— Essa noite eu vou embora daqui Tabat e por dois anos não vai ter mais que ver minha cara de gay irritante! Resolvido o problema!

Gritei alto e decidido, pois eu já tinha tudo pronto e aquele pescador inútil ao qual o padrasto se referia era muto mais do que um pescador, era muito mais do que Tabat poderia sequer imaginar.

— Vai mesmo ter coragem de subir naquele avião mesmo contra os desejos da sua mãe!? Realmente... – Tabat era um homem alto, forte, imponente e usando sempre da força agarrou meu braço de forma quase dolorosa - Junji Alexander Kimoa! Se você acha que vou esperar você voltar está redondamente errado! Sua brincadeira vai custar muito caro, eu não sou alguém que você pode simplesmente abandonar!

— Eu não posso ficar, Tabat! Eu... Eu preciso ir, você não entende...

— Então suma, seu desgraçado! Vá, fuja, como sempre faz!

— TABAT!

Gritei quando ele me jogou no chão e eu evitei revidar. Eu realmente queria, mas não devia... Eu devia a minha mãe um comportamento digno do seu nome, mesmo naquele momento...

— Quer saber, vou fazer melhor, vou arrumar a bagunça em que você se tornou depois da morte dela! Levante-se, nós vamos sair!

Eu, na lembrança, senti um desejo mortal de esganar aquele homem quando ele disse aquelas palavras, mas eu realmente acreditava que minha mãe não me perdoaria, por isso eu relutei, mas acompanhei aquele homem mesmo irritado e furioso, porém quando vi o destino ao qual era levado, tentei sair do carro e fui impedido. Fui levado a força por aquele bárbaro até o bordel e só de entrar ali os cheiros me deixaram tonto. Ele se aproveitou da minha fraqueza e me empurrou para um quarto com duas mulheres. Os toques, o cheiro, as paredes escuras... Tudo era insuportável, doloroso, sufocante... E eu saí daquele quarto com as poucas forças que me restavam pensando que daquela noite não passava, aquela noite eu iria ir embora daquele lugar! E daí eu o vi no salão bebendo e rindo com outras mulheres e eu nunca senti tanto ódio de uma pessoa na vida!

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