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Meu corpo se encontrava jogado na cama, meu coração batia forte enquanto eu tentava convencer-me que meu namorado não me odiava, ele definitivamente não sabia como me dar atenção ou como conversar, nosso relacionamento estava ficando uma merda e eu não fazia ideia de o que fazer sobre aquilo.

⸻ Amor, eu esqueci de te contar! Lembra que o Gabriel vai voltar da Suécia por que ele desistiu do intercâmbio? — Perguntei segurando o telefone contra a orelha.

⸻ Uhum. — Murmurou.

O sorriso que eu tentava manter para animar-me se desmanchou, mas permaneci a animação no tom de voz com o objetivo de tentar estimular uma conversa.

⸻ Pois é, ele disse que era pra eu guardar segredo, mas eu já falei para você, para mamãe, para o papai e para a minha psicóloga.

⸻ Mas você não precisa se preocupar, eu já tinha até esquecido.

⸻ Amor, também tem mais coisa, sabe a Eduarda? — Silêncio como resposta. — Pois é, ela foi sair com o ficante dela e você nem sabe, o ex dela ficou mandando vários pixs de um centavo com mensagem porque ela bloqueou ele em tudo. — Silêncio mais uma vez. — Você tá aí?

⸻ Sim.

⸻ Você quer que eu desligue? — Perguntei enquanto me deitava de costas na cama me sentindo triste.

⸻ Não.

⸻ O que você faria se você fosse ela?

⸻ Nada porque isso não aconteceria comigo.

⸻ Mas é uma situação hipotética.

⸻ Não ia acontecer.

⸻ Por que você nunca conversa comigo?

⸻ Óbvio que eu converso, eu to conversando agora, não to?

⸻ Ta bem, Gustavo, você tem razão. — Murmurei escondendo o meu rosto na palma da minha mão, ouvindo o seu suspiro no viva voz, eu me sentia frustrada.

⸻ Mas eu to falando com você. — Fico em silêncio. — Você não quer conversar? — Permaneço em silêncio. — Você tá brava?

⸻ To tentando te mostrar como é conversar com você.

⸻ Então eu vou desligar.

⸻ Desliga. — Respondo com esperança de ele pedir desculpas, mas tenho como resposta o fim da ligação.

Me levanto da cama, vou até a minha coleções de cds e coloco o "When The Pawn..." da Fiona Apple para tocar, depois me jogando na cama de costas, eu me sentia estressada e triste, eu amava o meu namorado, mas estava ficando cada vez mais difícil aguentar aquele relacionamento.

Desde que me mudei, tenho sentido que eu preciso de mais atenção, meu pai sempre foi atencioso e conversava bastante comigo, mas ele foi embora e eu precisava aceitar aquilo, o que eu até tentava lidar, eu não era tão boa quanto a Gabi, mas eu fazia o que podia, pegar caronas para casa com o Orochi ajudavam bastante, ele conversava comigo, mas não era o suficiente.

Eu sentia falta do Mount, tanta falta que doía, ele era o meu melhor amigo depois do meu namorado e ele foi embora — Mesmo que ele fosse voltar em breve. — E tudo isso estava acontecendo durante o meu ano de vestibular e se eu não entrasse em qualquer faculdade pública, eu surtaria. Definitivamente surtaria.

⸻ Criança. — Gabi abre a porta do meu quarto, seu cabelo estava rosa e curto, batendo em seus ombros, ela usava um short jeans e uma blusa grande branca. — Meus amigos estão vindo para cá, arrume-se.

⸻ Amigos de onde? — Perguntei e ela apenas me ignorou, saindo do meu quarto.

Eu estava de pijama, ele consistia em um conjunto de uma blusa com renda na bainha e uma bermuda, ambas as peças eram de seda e pretas, pego um moletom rosa do meu armário e visto-o, eu não planejava sair do quarto de qualquer forma.

Aproximadamente duas horas depois da minha discussão com o Gustavo, o barulho vindo da sacada da minha casa já era absurdo e, similar ao nível do som, já estava a minha fome, alguém bate na porta, levanto-me um pouco preguiçosa.

⸻ A Gabi pediu para eu perguntar se você quer comer, ela comprou pizza. — Perguntou Felipe, tinha muito tempo que eu não via-o, agora ele tinha um piercing no lábio de argola e uma franja enorme com cachos.

⸻ Quantos séculos, Felipe. — Ignorei tudo o que ele falou.

⸻ Nem tem tanto tempo assim, Loirinha.

Tinha tempo para caralho.

⸻ Ainda com esse apelido ridículo?

⸻ Você cresceu, né? — Mudou de assunto, eu apenas concordei com a cabeça. — Acho que eu não te vejo desde a copa de dois mil e dezoito.

⸻ A gente não se viu no começo de dois mil e dezenove? — Perguntei e ele negou.

⸻ Você não foi na minha comemoração.

⸻ Nunca imaginei que você faria medicina, para ser honesta. — Ele riu e encostou-se na lateral da minha porta.

⸻ Eu tenho cara de quê? — Doou os ombros.

⸻ Design? Ciência da computação? Engenharia da computação? Sei lá, qualquer coisa que você fique sentado num computador. — Ele riu.

⸻ As vezes um nerdola quer trabalhar com outras coisas além de computadores, sabia? — Foi a minha vez de rir, a minha franja caiu sobre meu rosto, passei a mão direita com delicadeza para colocar aqueles fiapos que eu chamava de franja para trás da orelha.

⸻ Você está gostando do curso? — Ele concorda com a cabeça.

⸻ A Usp é um sonho, eu adoro aquele lugar.

⸻ Eu imagino que seja.

⸻ Você já escolheu o que vai fazer?

⸻ Engenharia Naval, eu acho, gosto bastante da ideia de construir um navio.

⸻ Acho que não, não me pesquiso sobre, eu quero USP. — Respondi simples.

⸻ Então você só vai fazer a fuvest? — Perguntou e eu neguei.

⸻ Vou tentar puc para jornalismo.

A voz de algum dos amigos da minha irmã ecoou pela casa, ele chamava o Felipe, ele sorrio sem dentes e organizou-se para se despedir.

⸻ Eu tenho que ir. — Ele coçou a boca enquanto falava. — Mas eu ainda quero ouvir sobre isso, sério.

Deixei um sorriso bobo escapar.

⸻ Tá bem. — Disse confirmando com a cabeça.

⸻ Posso te mandar mensagem para a gente conversar mais tarde?

⸻ Com certeza. — Respondi óbvia.

Conversar.

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