Equinócio

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O dia não havia amanhecido quando despertei. Eu estava excitada.

Era assim que eu despertava todas as vezes que era tomada por estes pesadelos.

Quando sai do quarto, caminhei até a cozinha.

Lá, procurei por água gelada.  Não vi Dona Viridiana pelo casarão. Imaginei que ela ainda dormia.

Eu vestia uma camisola de algodão curta, apenas.

Abri a porta da cozinha que dava para os fundos do terreno e desci os degraus, descalça. Até alcançar a grama crescida, repleta de outras plantas invasoras.

Precisava cuidar do jardim dos fundos.

O céu estava encoberto por uma linda coloração alaranjada. O dia estava nascendo.

Ouvi um som estranho vindo de entre as árvores, como um murmurar de vozes.

Curiosa que sou, e até mesmo um pouco louca, fui conferir do que se travava aqueles murmúrios.
Caminhei em direção aos murmúrios, até que vi a claridade de chamas.

Abaixei-me entre o mato crescido e continuei a me aproximar ainda mais.

Viridiana vestia uma camisola branca, longa, como aquelas túnicas que os padres vestiam nas garotas. Tinha os braços estendidos para o céu, de joelhos a frente de uma pequena fogueira.

Tive o impulso de gritar por ela, interroga-la. Fiquei de pé e dei dois passos em sua direção, mas paralisei com suas palavras.

– Venha até aqui, menina. – Ela disse com a voz rabugenta.

Tudo que fiz naquele momento foi seguir suas ordens.

Ao parar de pé frente a ela, vi um circulo de sal.

– Entre no circulo, e sente.

Entrei naquele circulo e sentei-me frente à fogueira.

– O que é isso, Viridiana?

A velha desceu as mãos e repousou sobre as pernas, e me olhou com um sorriso doce de uma forma da qual eu não conhecia nela.

– Menina, que bom que veio... – Ela disse. – Tem muito a aprender.

– O que é tudo isso? – Sussurrei como se tivesse medo que pudessem nos ouvir ou nos ver.

– Hoje, é o primeiro nascer do sol da colheita...

– O quê? – Murmurei, mas ela me calou.

– Estamos no Equinócio de Outono, irei lhe ensinar como agradecer e honrar nossos deuses... Feche os olhos, e apenas sinta o ar a sua volta, ouça a natureza.

– Seja grata... – Ela sussurrou antes de voltar para seus cânticos e segurar minha mão.

Senti a brisa a nossa volta, o calor das chamas daquela fogueira. Deixando-me levar pelo som do cântico em uma língua desconhecida que Viridiana entoava.

Quando tudo aquilo acabou, a velha não me disse nada. Mas estava diferente comigo, sua face estava mais leve.

Observei ela recolher cristais e galhos do chão e fomos embora, após ela apagar a fogueira, abafando com a folhagem úmida.

Na cozinha, ela preparou chá de camomila com canela e mel e me ofereceu. Repetindo as palavras; Seja grata.

Senti naquele momento, que ela havia derrubado um muro entre nós.

Ela se foi pelo corredor, entrou em seu quarto e nada mais disse.

Terminei o meu chá, e voltei para o meu quarto, adormecendo novamente.

Liana  --------Onde histórias criam vida. Descubra agora