Heitor
Nervoso vou para o banheiro tomando um banho gelado, encosto minha testa nos azulejos enquanto a água cai cheia de pressão nas minhas costas, minha mente está cansada disso, de ser refém da porcaria daquela noite, maldição, não me lembro de nada, apenas tenho uma enorme convicção que não toquei aquela mulher.
O que era para me revigorar me deixa exausto, puxo a toalha enrolando até a cintura, saio do banheiro e vou para o guarda roupa pegando apenas a box, de relance vejo no canto do quarto as pequenas caminhas arrumadas, são quatro uma ao lado da outra, tão pequenas como elas.
Sento em uma esticando meus dedos para alisar a da Bea, sua fronha é da Merida, ela adora o desenho da valente, é tão forte as lembranças dela levantando de madrugada e vindo para minha cama insistindo para ver o filme na televisão do quarto, Luiza detesta e me proíbe, mas é só ela pegar no sono que Bea e eu estamos assistindo o filme que ela gosta pela milésima vez.
Às lembranças faz brotar lágrimas nos meus olhos, desisto de sentir o sentimento da saudade por aquela noite, cansado até mesmo para colocar a cueca deito com a toalha amarrada no meu tronco e durmo.
***
Bem de manhãzinha tenho um encontro com meu advogado, saio de casa bem cedo e em silêncio, não tenho ânimo para ter contato com ninguém e sem contar que meu mau humor está altíssimo.
Ao chegar no café onde marquei o encontro entrego a chave do meu carro ao manobrista com grosseria, certo que me arrependo no mesmo instante, mas não peço desculpas, ele me analisa super avaliador, descrente porque o tratei daquela maneira.
_ Você bêbado parece ser mais humano.
Recuo alguns passos do café na minha frente, olho para ele que nada fala, apenas entra no meu carro e fecha a porta, fico intrigado demais com as palavras, deduzindo mil coisas, e a principal que ele me conhece, mas não de qualquer jeito, ele me conhece bêbado, e por mais assustador que seja só fiquei bêbado uma vez.
Ele acelera no meu momento distante, fico vendo meu carro dar a volta no café em choque, ele entra no estacionamento ao lado e por não vê-lo volto em mim, pilhado das ideias. Faço o mesmo trajeto que ele fez com meu carro, peço gentil permissão para entrar no estacionamento, de longe o vejo deixando meu veículo em uma vaga qualquer, o chamo.
_ Amigo!
Aceno indo na sua direção, meio nervoso vejo ele passar os dedos nos cabelos ao se aproximar.
_ Foi mal pelo o que eu disse, preciso desse emprego.
Se desculpa, sacudo a cabeça desesperado, aproximo mais ainda agoniado.
_ De onde me conhece?
Os olhos escuros me analisam em lembranças.
_ Dormiu na casa da Carolina, não se lembra?
Meu coração acelera, nego rápido.
_ Como posso? Estava bêbado...
Ele ri concordando, não entendo o porquê.
_ Estava mesmo, foi eu quem ajudei ela a subir com você, estava mal.
_ E depois?
Praticamente grito.
_ Não sei muito, fui para minha casa ao lado, não vi você sair de manhã, mas falava umas coisas engraçadas antes de apagar.
_ O que eu falava?
Olha o nada trazendo as lembranças daquela noite.
_ Falava repetidas vezes que Luiza não teria escapatória, não sei... Algo sobre futebol e que você ganhou a aposta.