Aurora

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Ouço gritos ao longe e por um instante penso que ainda estou sonhando.

Mas os raios solares que entram pela velha janela invadem o pequeno quarto que divido com Harley, me avisando que já é dia.

Os raios refletem no espelho quebrado em cima de uma cômoda velha no canto de uma parede, de cor laranja, a cor de todas as paredes deste cômodo, na verdade.

Acordei sobressaltada e meu coração ainda está acelerado, devido ao susto que tive no meu sonho e logo depois com os gritos realistas que ainda ouço.

Olho pela janela e o s já brilha alto no céu, estamos no meio do verão, treinei a tarde ontem com Marcus e há alguns dias não durmo direito por conta dos meus sonhos.

Há anos não sonhava assim. Mas ultimamente o mesmo cenário tem invadido meus sonhos com frequência.

Troco de roupa, visto um vestido simples, lavo o rosto, não há tempo para pentear os cabelos, então passo os dedos por eles, na esperança de desembaraçar as longas madeixas negras.

Logo em seguida corro para rua para ver o porquê de tanto alvoroço, mas assim que vejo a cena que se forma em minha frente.

Tenho vontade de voltar para casa e permanecer naquele sonho horrível, pelo menos sei que é apenas um sonho.

-Solte o! Ele é apenas uma criança! Só estava com fome.

Marcus tenta para explicar para um soldado que segura uma criança pelo braço.

- Esse menino cometeu um roubo! Conhece as regras! O soldado diz sem um pingo de bondade na voz, nem cara no rosto.

Atrás dele vários outros soldados esperam pacientemente pela ordem do homem que discute com Marcus, imagino que seja o líder deles.

— Largue o menino, e me levem no lugar dele! Desta vez quem fala é Agnos, o líder da nossa Aldeia.

- Conhece as regras Agnos! Diz o soltado impaciente.

- Sabe o que fazemos com delinquentes. Me aproximo de Harley e Cora que observam a cena com preocupação.

- O que houve? Pergunto quando me aproximo delas.

- Segundo o guarda o menino roubou frutas de uma barraca da capital, os guardas vieram até aqui e insistem que o menino deve pagar pelo erro.

- Como se eles soubessem o que é certo ou errado! Grita Harley para os guardas.

- É decreto do rei regente! Qualquer ato de furto deve ser pago com 5 chicotadas!

Ao ouvir isso, a criança entra em desespero e começa a chorar e a tentar se libertar das mãos do soldado.

Conheço ela, é um dos meus alunos, o qual dou aulas de arco e flecha, seus pais morreram de anemia, deixando três filhos, o menino é o mais velho.

- Preparem o tronco! Grita o soldado para os demais que se apresentam e trazer uma enorme barra de madeira e finca lá no chão.

- Não pode chicotear uma criança, que só queria se alimentar.

Insiste Marcus.

- E se o rei regente não quisesse que isso acontecesse, ele devia dar direitos iguais para o povo das aldeias, direitos que só o povo da capital tem.

- Cale a boca Aldeão, ou você aumentar o número de chicotadas para esse delinquente.

- Porque você não vem calar! Marcus diz invocando uma chama de fogo azul em uma de suas mãos, fazendo o soldado dar alguns passos para trás.

- Qual o problema soldadinho? Diz Harley se aproximando também uma com uma chama de fogo vermelho em suas mãos, Harley e Marcus tem praticamente o mesmo dom.

O de invocar o fogo, mas enquanto as chamas de Harley são vermelhas, a de Marcus são azuis.

Ardem mais forte e causam um estrago maior.

- Controlem as suas aberrações Agnos! Ou o rei regente não cai gostar nada de saber que fomos ameaçados por cumprir o seu dever.

- Se conseguirem sair vivos daqui, você quis dizer.

Entro no meio do show, levanto uma das minhas mãos e os guardas começam a fazer careta de dor colocando a mão no lado esquerdo do peito.

Excerto pelo líder deles.

- O que está fazendo com meus homens? Ele berra assustado.

- Nada de mais, estou apenas diminuindo suas pulsações, daqui a pouco eles desmaiarão e só restará você. Solte o menino.

- Agnos! Conhece as regras! Pare suas aberrações.

O guarda berra assustado.

— Deixem os soldados trabalharem, meninos Agnos diz calmamente.

E acabar de uma vez logo com isso.

Não entendo o porquê de Agnos pedir para recuarmos, mas somos forçados a facilitar e assistir o soldado amarrarem o menino no tronco e aplicar o castigo enquanto o pequeno grita, e logo desmaia com a dor.

É angustiante de ver.

Por isso, antes mesmo dos guardas se retirarem de volta para a capital, Marcus e Agnos tiram o garoto que ainda está desacordado e o levam nos braços para a casa de Marcus, para que eu o possa curar.

Invoco a cura de dentro de mim, que logo atende ao meu chamado e sai de minhas mãos em forma de uma luz branca.

Passa as mãos pelos ferimentos do menino, 5 tiras de sangue há nas costas do pequeno, mas logo desaparecem, é o mínimo que posso fazer por ele agora.

Lágrimas silenciosas caem pelo rosto de todos nós, choramos pelo menino que só queria alimentara si mesmo e a seus irmãozinhos.

Ele não vai acordar. Assim que ele desmaiou no meio das chicotadas, eu pude sentir quando o seu coraçãozinho parou de bater.

Quebrando um coração de geloOnde histórias criam vida. Descubra agora