capítulo 1 - O ritual.

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No me llores,
[Não chore por mim,]
porque si lloras
[porque se você chora,]
yo peno,
[eu sinto a sua dor,]
en cambio si tu cantas,
[mas se você cantar para mim]
yo siempre vivo,
[eu viverei para sempre,]
y nunca muero.
[e meu espírito nunca morrerá.]

"La Martiniana", uma canção popular Mexicana

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Tecnicamente, Draco não estava invadindo o cemitério, porque havia morado lá a vida inteira e não podia invadir a própria casa. Mas arrombar a igreja com certeza ultrapassava os limites da ambiguidade moral. Ainda assim, se queria finalmente provar que era um bruxo, precisava realizar o ritual diante da Senhora Morte. E ela estava na igreja.

A garrafa térmica preta cheia de sangue de galinha balançou junto ao quadril de Draco quando ele passou sorrateiramente pela pequena casa de sua família, na entrada do cemitério. Os outros suprimentos para a cerimônia estavam escondidos em sua mochila. Ele e Adri, sua prima, passaram agachados sob as janelas da frente, tomando cuidado para não bater a cabeça no peitoril.

Dava para ver as silhuetas dos bruxes festejando lá dentro através das cortinas. Suas risadas e o som da música ecoavam pelo cemitério. Draco fez uma pausa e se escondeu nas sombras para checar se a barra estava limpa antes de pular da varanda e partir em disparada. Adri seguiu logo atrás, os passos ecoando em sincronia com os de Draco enquanto corriam por caminhos de pedra e pisavam em poças de água.

O coração de Draco batia acelerado, os dedos roçando os tijolos molhados do columbário, onde ficavam guardadas as urnas funerárias, enquanto procurava por qualquer sinal dos bruxos fazendo ronda no cemitério aquela noite. Patrulhar o cemitério para garantir que nenhum dos espíritos dos mortos causasse problemas era uma das responsabilidades dos homens. Eram poucos e raros os espíritos que se tornavam malignos, então as rondas consistiam basicamente em garantir que forasteiros não invadissem o terreno, deixar os túmulos livres de ervas daninhas e fazer a manutenção em geral.

Os bruxos mais jovens sempre reclamavam desse serviço, mas era uma das tarefas às quais Draco sonhava em ser confiado. Ouvindo o som de um violão mais adiante, Draco se agachou atrás de um sarcófago, puxando Adri consigo. Espiando pelo canto, viu Cedric Diggory descansando recostado em uma lápide, tocando e cantando. Cedric era o morador mais recente do cemitério bruxe. O dia de sua morte, pouco mais de uma semana atrás, estava esculpido na lápide a seu lado.

Bruxes não precisavam ver o espírito para saber que havia um por perto. Os homens e mulheres da comunidade podiam senti-los, como um frio no ar, uma comichão no fundo da mente. Era um de seus poderes intrínsecos, uma dádiva da sua Senhora. Os poderes da vida e da morte: a capacidade de pressentir doenças e ferimentos nos vivos, e de enxergar e se comunicar com os mortos. Claro que essa habilidade não era muito útil em um cemitério cheio de espíritos.

Em vez de um frio repentino, andar pelo cemitério bruxe deixava um calafrio constante em sua espinha. No escuro, Draco mal conseguia notar a "transparência" do corpo de Cedric. Os dedos do espírito moviam-se em um borrão fantasmagórico ao dedilhar as notas em sua vihuela - o instrumento era seu tether, a posse material mais importante para ele, o que o mantinha ancorado na terra dos vivos.

Cedric ainda não estava pronto para ser libertado para o pós-vida. Ele passava a maior parte do tempo no cemitério tocando sua música e chamando a atenção das bruxas, tanto das vivas quanto das mortas. Sua namorada, Cho, sempre as botava para correr, e os dois passavam horas juntos no cemitério, como se a morte nunca os tivesse separado.

Cemetery boys - DrarryOnde histórias criam vida. Descubra agora