Ketlen narrando
— Tchau, mãe. – digo.
— Deus te abençoe filha. Te leve e traga em segurança amém. – minha mãe sempre me abençoa, abraça e beija quando eu tô de saída.
— Já vai pra igreja, santinha? – Jonas adora fazer hora com a minha cara.
— Deveria seguir o exemplo da sua irmã, Jonas. O mundo não tem nada pra tu.
— A se tem. – ele gosta de debochar até da mamãe.
— Nada de bom. – ela revira os olhos.
— Ai, mãe deixa de coisa. Me dá uma coxinha aí. – se debruça sobre o balcão — Tô morrendo de fome. Papai me levou pra ir ajudar um irmão da igreja em uma obra.
— E ai? – ela diz.
— E aí que eu não fiquei, né mãe. Vê se eu tenho cara de quem fica levantando parede pros outros. Levanto nem pra mim. – mostra o sorriso de galã da globo e pega a coxinha e o suco que mamãe colocou sobre o balcão — Papai é muito avarento. Mão de vaca que só ele. Do que adianta ser filho do pastor da igreja se ele só rouba pros filhos oficiais.
Mamãe odeia quando o Jonas fala assim.
— Para de falar assim do seu pai. Seu pai é um homem honesto. Ele não faz essas coisas, minino e outra: esse terreno que ele deu pra mim tá ótimo. Tenho braços e pernas saudáveis. Posso trabalhar pra conseguir minhas coisas. E vocês dois também são capazes disso.
— Tô dizendo nada mãe. – digo.
— Honesto. – Jonas repete a palavra enquanto procura um lugar pra sentar — Honesto sou eu.
— Vai pra igreja com a tua irmã, Jonas. Vai estudar a palavra que Deus vai te abençoar, meu filho. Triste da pessoa que se mantém ignorante da palavra de Deus.
— Não. Obrigado. Domingo, eu tô no culto. Até lá, deixa que a Ketlen tá sendo santa pela família toda. Do que depender dela, o nosso canto no céu tá guardado.
— Aff. Deixa de ser idiota, menino, deixa. — reviro os olhos.
— Olha ai mãe a Ketlen.
— Ketlen respeita teu irmão.
— Tô indo, mãe. Tchau.
— Tchau irmãzinha, cuidado pra não tropeçar na barra na saia.
Apenas saio sem dizer mais nada. Hoje é dia de estudo bíblico na igreja e eu faço parte de um grupo. Sou uma espécie de líder.
— Ketlen tá grande... – um homem na rua diz.
— O tecido dessa saia é tão fininho. Se desse um vento mais forte. – risos — Um garoto da escola está com o peão de obra.
A gente mora no morro chamado Desejo. Não sei de quem foi a ideia e nem o motivo de se manter esse nome. A gente fica perto da cidade 2000 e do Mucuripe. Pra chegar na praia é só descer o morro e atravessar a avenida.
Sei que tem muita gente que daria um braço pra estar no meu lugar, mas eu não gosto de praia. Detesto areia incomodando e não sou fã de banho de sol.
— Gente. – tô falando com o pessoal da minha idade que adora se dispersar durante a explicação da bíblia — Foco aqui. – estalo os dedos — O que vocês acham dos homens da bíblia que viviam cem anos, novecentos anos?..
— Acho que não era bem isso. – Vanessa responde — Eles deveriam contar o tempo diferente da gente. Era outra época.
— Era. – João comenta — Acho que dia e noite eram dois dias diferentes. Sei lá, mas não tem como alguém viver tanto, ainda mais sem higiene e alimentação adequada.
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Visita Íntima (morro) COMPLETO
RomansaCOMPLETO NA AMAZON, LINK NA BIO TRECHO: Acho que o que eles chamam de Pitbull é o cara que vi lá atrás. Estou perplexa que tudo isso esteja sendo feito por conta de uma coxa de frango. É real? Como pessoas pré-históricas, os homens que assistem come...