Sete

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      O vídeo estava passando pela—nas contas de Anerile— vigésima sétima vez na tela do computador do chefe.
O homem somente repetia o play incessantemente.
O olhar focado na tela, sem saber descrever o que estava sentindo. Passaram-se três meses desde que conseguiu seu divórcio com Michel, quase três que deixou o Brasil —Ele se mudou dois dias depois do divórcio sair.—e dois anos desde o acidente.

Sua vida está caminhando bem, finalmente.
Está morando em seu apartamento, o mesmo que ficou durante a viagem com Eric; voltou a pilotar moto, coisa que tinha deixado de fazer.
Largou todo o passado para trás, mantém contato com as outras empresas—Inclusive a da Alemanha que Michel comanda.—, com Otto, Mirela e até mesmo, seu pai.

Sim, o homem que não o queria ver nem pintado de ouro resolveu aparecer.

FLASHBACK

           O setor de criação estava uma loucura quando Ravi voltou para a empresa após o almoço. Ele andou para o elevador quase correndo, falava com as pessoas rápido, mas falava. Ravi detestava ser arrogante.
Então, não importa como seu dia estava corrido ou ruim, ele sempre respondia com educação.

—Ravi! Finalmente, nossa! Tem um senhor na sua sala. Te esperando —Anerile, que havia começado a trabalhar diretamente com ele desde que Ravi chegou na França, diz.

— Quem é?

Ele pergunta parando na frente da poltrona que a garota ficava quando não estava em seu horário de trabalho. Ela tem a própria sala, ao lado da dele.

— Hikon Snodiny.—Ela responde lendo o nome que está escrito em sua mão. Ela está nervosa, sabia a história de vida do chefe, mas como iria impedir o homem?—Disse que é seu pai e eu sei que é mesmo, pois ele é seu clone.

Ravi sorri cético, crendo ser impossível o homem estar ali, mas as feições sérias de Anerile mostram que não é brincadeira.

Ele fica quase um minuto parado em frente a sua própria sala, como se estivesse encarando a parede de seu quarto na adolescência. Criando coragem para entrar. Não via Hikon há anos, logo não tinha ideia de como eles podiam reagir à presença um do outro.

Ele gira a maçaneta da porta, ainda sem coragem mal olha para frente, seu olhar segue suas mãos no momento de trancar a porta. Se iria encarar, Hikon, faria isso sem interrupções.

— O que faz aqui?

Ele finamente se vira e vê o pai olhando pela janela. O homem bem parecido com ele, olhos de mesma cor, a maior diferença era somente as marcas de expressão, os cabelos grisalhos que estavam aparecendo. Está com cinquenta e sete anos, em forma, aliás seu pai sempre foi professor de educação física, ex atleta. 

As roupas são como Ravi se lembrava: Sociais e claras.

— Oi. Bom ... Vim ver você, meu filho. —Ele se vira para Ravi.

Inacreditável.
É a palavra que sai dos lábios de Ravi sem ao menos perceber. Aliás, a última conversa que teve com o pai consistia em um:
"Some da minha casa. Se não for viver como a porra de um homem descente, pode ir embora."

Seguido de um: "Nem consegui trabalhar direito hoje de tanta vergonha de você. Fiquei de cabeça baixa com vergonha de quem você é. Um pecador, nojento!"

E finalizado com um belo: ''A partir de hoje você não tem mais um pai. Some da minha casa.''.

—Soube do seu divórcio. 

—Ah, isso. Claro que seria isso. —Ele sorri, um sorriso sem nenhum humor e totalmente cético.—Não quero ouvir lição de moral. Se foi para isso que veio.

O Que Restou De Nós? | Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora