Thiam - Ink Wings Boy

VII - O NECROMANTE AMIGO

- Confia em mim? - Theo perguntou. Liam estava com as mãos no ouvido, as pressas rasgando a gengiva, perfurando os próprios lábios interiores. O gosto metálico de sangue era apenas mais um detalhe inoportuno de todo a situação - Vamos sair daqui, okay?

- Eu não fiz nada para eles - o Beta falou, com a voz chorosa, uma nova forma de falar que certamente desconcertou o do lado. Ele estava encolhido, em baixo da mesa do professor, em meio a sala de ciências - E-eles descobriram, eu não sei como. Disseram que eu devia voltar para minha escolinha de monstros.

- Liam, precisa respirar fundo, se perder o controle, isso tudo ficará pior - o Raeken tentou, mas quando ia tocar no garoto, viu o mesmo se encolher mais. Dedos recuando antes mesmo de chegar na superfície viva e inquieta.

- Pede para pararem - o bruxo inclinou a cabeça, não entendo o pedido do "recém-conhecido" - Pararem com o barulho - ele apertou mais as mãos nos ouvidos, tentando sumir com o som das buzinas, do trânsito que acontecia na via atrás do colégio, tentando sumir com os fuxicos dos colegas de turma, e até mesmo com o barulho do tamanco da diretora, cruzando o corredor com pressa, para chegar até a sala dele e examinar a ocorrido - Por favor.

Era difícil para o Raeken entender, teve tão pouca interação com seres como o jovem, que havia conhecido há pouco tempo. Eles tiveram que fazer um trabalho de física juntos, e estava tudo bem, até que alguns jovens se aproximaram de Liam, e Theo simplesmente se afastou, porque ele não sabia. Ou talvez, ele somente não ligassem.

Não eram amigos, somente precisavam apresentar aquilo, e Theo voltaria a ser o garoto mais velho, do funda da sala. E o licantropo continuaria sendo garoto extrovertido, de olhos atentos, e um bom faro para dúvidas que precisam de resposta.

Só que agora eles estavam alí, o bruxo se enfiando na caixa da mesa, e esperando que o lobo se acalmasse, batendo os dedos contra os próprios joelhos e tentando pensar em soluções rápidas.

- Você já tentou voar? - as palavras saindo, enquanto o lobisomem murmurava um mantra, mas parou para ouvir ele - Tem uma hora, que está tão alto, que pode chegar nas nuvens. Mas a melhor coisa, é que não existe nada, sabe? É silencioso, sem humanos. É calmo.

- O quê? - os caninos parando de cravar a película da boca, os olhos molhados se locomovendo para Theo, e as palmas se afastando minimamente das orelhas dele, como se quisesse ter certeza de que realmente ouviu o que ouviu, ou se estava alucinando.

- Se quiser, eu posso te tirar daqui. Nunca levei ninguém comigo antes, mas deve ser fácil. - propôs, imaginando. O lobo ainda parecia perdido, mas a ideia de fugir era boa, ele queria sair dali, se colocar atrás de cortinas, abraçar a cintura da mãe e contar tudo o que lhe disseram como se ela tivesse o poder de mudar a linha do tempo - Ou podemos ficar, apresentar o trabalho, ganhar uma ótima nota, e fazer eles engolirem isso - mas essa era a opção correta, tanto Liam quanto Theo pensou, mas não sumia com a evidente, e borbulhante, ansiedade.

- E se eu me descontrolar?

- Não vai, é mais controlado que eu - disse, com firmeza, o outro certamente estaria a se perguntar de onde essa veio - Consegue fazer isso. E eu ainda posso te levar pra voar, se não me fazer perder esse bimestre.

Theo ergueu a mão, o lobo pegou. Ele levantou com facilidade, mas teve que ver o outro rapaz se bater na madeira, ao sair do quadrado. O lobo limpou os lábios, ignorando a dor na cabeça.

Quando a diretora chegou lá, Liam estava apresentando seu trabalho perfeitamente, a voz clara e alta, como sempre, e como se não tivesse surtando cinco minutos atrás. O Raeken estava ao lado dele, fazendo sua parte no projeto.