26 - Foge comigo.

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Dez minutos, foi o tempo que Simone ficou em silêncio. Dez minutos, foi o tempo que Soraya levou, para descobrir algo que bem no fundo, ela já sabia.

- Essa é a minha história. - Ela falou em voz baixa. - Eu sou Lara Almeida.

Por um momento, Soraya desejou não saber a verdade sobre ela, ou sobre o que ela passou, pois sabia, que nunca mais iria vê-la com os mesmos olhos.

Era difícil para ela, imaginar Simone como uma menininha feliz e sorridente, assim como era dificil imaginar o que ela passou para deixar de ser aquela menina.

Naquele momento, soube que não podia proteger ela, não podia tirar o sofrimento dela e muito menos, fazê-la desistir da vingança. Não podia fazer absolutamente nada por ela.

Simone continuou sentada com a cabeça entre os joelhos, uma posição que a fazia se sentir segura, mesmo sendo só uma sensação.

Ela lutava internamente, contra a vontade de sair correndo, de deixar tudo aquilo para trás e viver sua vida. Não era o que ela queria, não era certo.

- Seus pais....-  Soraya pensou alto.

- Sou adotada. - Ela respondeu, encolhendo os ombros. - Ramez e Fairte são como anjos na minha vida.

Ela sentiu o coração aquecer ao se lembrar dos pais, sensação que logo passou, ao lembrar-se do estado de Ramez.

- Foi horrível. - Voltou a falar depois de um tempo em silêncio. - Eles bateram nela. Três homens armados, contra uma mulher indefesa. Eu ainda ouço os gritos dela, ainda ouço os barulhos da luta. Posso ouvir a risada arrogante daquele...

- Eduardo? - Soraya finalmente viu sua ficha cair. - Ele fez tudo isso.

- Ele riu de mim, me diminuiu. Me deixou viva porque duvidou da minha capacidade, mas eu vou acabar com aquele desgraçado.

Soraya sentiu um frio na barriga ao ouvir Simone falar, era como se não fosse ela. O ódio era visível no olhar, e Soraya sabia que aquilo a estava destruindo por dentro. Se continuasse com aquela ideia na cabeça, Simone iria acabar como Eduardo. Uma pessoa amarga, rancorosa, sozinha e cheia de culpa.

Não era o fim que queria para Simone.

- Olha pra mim. Ela pediu com carinho. Eu sei que você sofreu, sei que ele te fez mal e que ainda dói. Mas... Simone, você é melhor que ele, esquece essa...

- Esquecer? - Ela gritou, se levantando e afastando Soraya. - Quer que eu esqueça?

- Olha, sei que é difícil, só que isso está te fazendo mal. - Argumentou. - Essa sede de vingança, está acabando com você e te transformando em alguém como ele. É isso que você quer?

- Acha que eu gosto disso, que eu quero ser uma assassina sem coração? - Continuou gritando. - Acha que eu gosto de me olhar no espelho, e ver uma mulher sozinha e cheia de ódio?

- Eu...

- Não Soraya! - Interrompeu. - Eu não gosto, eu não quero sentir essa raiva que sinto, não quero matar uma pessoa, eu não quero. Eu me odeio por isso, odeio me sentir assim, odeio mentir e manipular, odeio olhar a filha dele sabendo que em breve ela vai ficar sem o pai.

- Para! - Ela gritou de volta, fazendo Simone se assustar. - Não precisa ser assim. Eu sei que você pode colocá-lo na cadeia, deixa que a justiça cuida dele.

Ela riu de maneira exagerada, uma risada seca e sem nenhum humor.

- Não existe justiça nesse mundo. Não vou deixá-lo vivo, comendo e bebendo as custas do governo, em quanto minha mãe está morta.

- Pode ser difícil para você, eu entendo.

- Entende mesmo? - Questionou. - O que marcou sua infância? Uma brincadeira com seus pais? Um doce, uma música, um brinquedo? - Ela deu dois passos na direção de Soraya e parou. - A minha infância, foi marcada por mortes, primeiro meu pai e depois minha mãe. Minha infância foi marcada por gritos de dor, por barulho de ossos se quebrando e por nove tiros disparados em uma mulher já morta. Se você não passou por isso, não me diz que entende.

- Matá-lo, vai trazer sua familia de volta? Vai te fazer feliz?

Simone abriu e fechou a boca, pensando na melhor resposta possível. Uma resposta que não fosse, "Não". Porque ela sabia, que matá-lo não a faria feliz, não traria sua família de volta e não faria o tempo voltar. Porém, deixá-lo vivo também não trazia nada daquilo, e só fazia aumentar o ódio de Simone.

- Talvez você tenha razão. - Finalmente falou. -  Matá-lo não vai me fazer melhor. Mas também não me faz pior, porque ele destruiu tudo o que tinha de bom em mim.

- Que droga, Simone. - Disse, batendo contra a parede. - Será que não consegue enxergar ?

- Eu enxerguei. Por três dias eu enxerguei minha mãe caída nesse chão. Vê esse desenho? - Ela apontou para o chão da sala. - Eu fiz, enquanto esperava alguém me encontrar. Eu contornei o corpo da minha mãe, eu vi o sangue, eu passei três dias ao lado de um cadáver. - Ela parou, passou as mão pelo cabelo, tentando manter a calma. - Tudo porque aquele filho da puta, foi arrogante demais para me matar.

Soraya tentava entender o lado dela, afinal, Simone havia passado por coisas horríveis. Mas ela não podia, não podia deixá-la ser guiada por um ódio cego, e se transformar em uma pessoa tão ruim quanto Eduardo. Ela queria salvá-la de si mesma, queria tirar a escuridão que morava nela.

- Foge comigo.

- O que?

Simone parou de andar e focou em Soraya, tentando achar um vestígio de humor em seus olhos. Até porque, ela só poderia estar brincando.

- Vamos embora daqui, deixamos tudo pra trás e ganhamos o mundo. - Falou, se aproximando dela e a puxando pela cintura. - Sem noiva traíra, sem vingança, sem família Gonçalves. Só eu, você e nosso amor. Eu te amo, Simone.

Em outro momento, Simone derreteria por aquelas palavras. Ela a beijaria e diria que a amava também. Porém, aquele não era outro momento.

- Você está sendo egoísta. - Ela se afastou. - Meus pais biológicos estão mortos, meu pai adotivo está morrendo no hospital, e você quer que eu fuja?

- Ramez vai ficar bem, já seus pais... Eu só quero ajudar, quero te fazer feliz. - Ela sorriu de forma acolhedora. - Vem comigo?

- Eu não posso.

Soraya ficou ali, parada, enquanto via Simone virar as costas e seguir seu destino.

O rosto molhado de Simone era uma prova do quanto doeu recusar a proposta, o quanto doeu deixar Soraya para trás, mas ela tinha um destino para seguir. E infelizmente, Soraya não fazia parte dele.

- Eu também te amo. - Sussurrou em meio às lágrimas, depois entrou no carro e foi embora.

REVENGE - Simoraya Onde histórias criam vida. Descubra agora