Capítulo 29

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– Acho que a sua rainha está sentindo saudades do coven – comentou Jinpa
no dia em que a chegada de Rangi a Kinevane completava duas semanas.

– Sim, também tenho percebido isso – reconheceu Kyoshi, desviando o olhar do monte de papéis espalhados sobre a escrivaninha. As saudades da família eram uma mancha na felicidade da vampira, mas isso seria corrigido em breve. E também o seu forte temor de se encontrar com outros Lykae. Rangi lhe contara que já estava “acertando um terço das dúvidas que tinha sobre os Lykae” e que “não iria levar as coisas tão a sério”. Elas voltariam ao castelo em três dias, e Kyoshi quis saber de Jinpa:

– O que o leva a dizer isso?

– Ela chamou uma criada para sua saleta pessoal para jogar videogames. Depois, passaram a tarde pintando as unhas dos pés uma da outra. De vermelho.

Kyoshi se recostou na poltrona.

– Como a jovem reagiu?

– No início, ficou assustada, mas depois se sentiu mais confortável. Todas estão bem. Ela realmente conseguiu encantá-las.

Kyoshi sorriu.

– Ela tem tudo de que precisa? – quis saber Kyoshi, embora soubesse que ela andava cada vez mais satisfeita. Quando se sentia feliz, cantarolava baixinho, distraída. Muitas vezes, a Lykae ouvia a voz dela enquanto cuidava das flores do “lunário”, como a vampira chamava o jardim fechado. Kyoshi quase poderia apostar que ela gostava mais dos jasmins do que de joias.

– Oh, sim. Ela é, ahn… Muito prendada, eficiente e, atrevo-me a dizer, viciada em compras.

A própria Kyoshi já reparara nas compras e suspeitava que se sentia melhor agora que estava enchendo a casa com coisas que curtia ou precisava, transformando em lar aquele seu espaço. A Lykae se sentia profundamente grata por ver tudo aquilo tomar forma à sua volta. Será que conseguiria, um dia, compreender o porquê de ela precisar de centenas de vidros de esmalte para as unhas? Não, mas certamente a Lykae gostava de ser  surpreendida por novas cores sempre que lhe beijava os dedinhos dos pés.

Kyoshi estava se curando e se sentia mais forte a cada dia. Sua perna parecia estar praticamente de volta ao normal, e ela recuperava o seu poder aos poucos. Seu próprio sentimento de contentamento – especialmente considerando tudo que lhe sucedera – era espantosamente forte. E tudo aquilo acontecia por causa de Rangi.

A única mancha na felicidade da Lykae era o fato de saber que, muito em breve, teria de deixá-la por uns tempos. Isso, por si só, já era insuportável, mas Rangi agora começara a insistir em acompanhá-la. Disse-lhe que iria com Kyoshi, lutaria a seu lado e não permitiria que todo aquele sufoco tivesse sido em vão. Caso contrário, regressaria ao coven.

Recusava-se a ser deixada para trás, em Kinevane. Kyoshi sabia que poderia
convencê-la a deixar de lado esse ultimato. Sem dúvida, conseguiria fazer com que ela analisasse a situação usando a lógica. Contudo, a cada dia ela ficava mais forte e a Lykae, menos confiante. Se ela insistisse nisso, só lhe restaria desistir da vingança ou perdê-la para o coven. Na sua mente, as duas possibilidades eram inaceitáveis.

A Lykae e Jinpa discutiram mais algumas questões de negócios e, pouco depois de Jinpa se retirar, Adora bateu na porta.

– Você sabe onde o uísque está, pode se servir – ofereceu Kyoshi.

A loira, pelo visto, acabava de voltar da cozinha. Vinha lambendo o dedo enquanto se dirigia ao bar, e o cheiro de algo doce encheu o ar. Quando ofereceu uma dose de uísque a dona da casa, Kyoshi balançou a cabeça, recusando. Adora encolheu os ombros e ergueu o copo.

Desejo Insaciável (Rangshi)Onde histórias criam vida. Descubra agora