Capítulo Vinte e Cinco

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"Sentimos ciúmes de tudo aquilo que consideramos nosso, e que não queremos arriscar perder. Certo? Alguém me confirme, com urgência."

Eu podia sobreviver a mais um dia qualquer da mesma maneira como venho sobrevivendo à minha vida, mas trabalhar, comer e respirar nunca foi tão maçante. O engraçado de se esperar por alguma coisa é a presença daquela sensação horrorosa de angústia, que te impede de achar que as horas duram sessenta minutos cada uma. Sério, parecia muito mais.

Esperei pela conversa que teria à noite com a Maraisa como se ela definisse o total percurso da minha trajetória; de certa forma, dependendo do que ela me falasse, muita coisa mudaria. Juro que tentei conter as minhas expectativas, não podia ser tão inocente em achar que não sofreria decepções, mas era mais fácil conter um espirro do que a esperança que vibrava em meu peito.

Aparte mais difícil foi quando cheguei a minha casa, acendi as luzes do jardim e constatei que tinha mais quatro horas pela frente, e nada útil para fazer até lá. Fiquei na esperança de haver alguma coisa nova na minha varanda, porém estava tudo igual: o vaso com as rosas vermelhas, as violetas, a lavanda. Precisei procurar na internet durante um tempão para descobrir que aquelas flores cheirosas eram lavanda e o cacto pequeno, até que a entrada da minha casa estava ficando bem decorada. Graças a ela.

Estava em meus planos comer macarrão instantâneo, mas aproveitei que havia feito compras para receber os meus pais e decidi preparar algo mais articulado. Liguei o som e dei uma de cozinheira, tentando inventar sabores que não existem ou não são comestíveis e cortando legumes com a maestria de um pinguim manco, consegui me distrair por pelo menos duas horas nessa historinha de sujar panela sem necessidade para no fim, ter o meu jantar reduzido a um risoto com cara de vômito. Meu forte realmente não é na cozinha.

Não estava lá tão ruim, vai. Claro que não o suficiente para eu ser considerada uma mulher apta a casar, mas isso não me preocupava. Se eu casasse com Maraisa, estaria feita, certo? Errado, eu não devia estar pensando em casamento, muito menos com a safada da minha vizinha, isso sim seria o auge da minha tolice. Se controle, Marília!

Acabei fazendo uma mini faxina na cozinha e na sala de estar, mesmo que nem uma e nem a outra estivessem precisando. Olha, eu não tenho mania de limpeza, só queria me distrair mesmo. Sobrevivi a mais uma hora completa, e utilizei mais alguns minutos para tomar um banho relaxante. Lembrei-me do banho com ela, na verdade, quase não podia mais usar aquele banheiro sem me lembrar dela e isso é estranho.

Estava escolhendo uma roupa legal, acho que tinha levado aquela conversa muito a sério, mesmo sem saber do que se tratava, quando ouvi barulhos esquisitos no quarto ao lado, uma porta se fechou ruidosamente, meu coração acelerou no mesmo instante, quase tive um infarto, agucei os meus ouvidos.

– Não dá, Rita... vá embora. – Ouvi Maraisa sussurrando baixo.

O jantar sofreu um looping dentro do meu estômago, e me vi correndo até a parede da Clarice, encostei meu ouvido em cima de uma das frases.

– Por que está agindo assim? Tento conversar contigo há tanto tempo, e você sempre me corta. – A voz meio chorosa de uma mulher ecoou, o nervosismo total já me dominava.

Ela tinha mesmo escolhido aquele dia para levar uma de suas vadias para casa? Puta merda, Maraisa!

– Não há o que conversar, muito menos aqui, vamos para sala... – Maraisa sabia que eu podia estar ouvindo, levei uma mão à boca e rezei para ninguém ouvir a minha respiração ofegante de raiva e angústia.

– Não! – A mulher gritou. – Já chega... qual é o seu problema, hein?

– Não tenho problema algum, Rita, só não quero que me siga e muito menos que venha até a minha casa sem ser convidada. Não te dei essa liberdade.

A VIZINHA DO 119 | MALILAOnde histórias criam vida. Descubra agora