01. INFORTÚNIOS

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REPOSTANDO


— Vai ser melhor para você, confie em mim. Você terá contato com pessoas da sua idade. — Simon tentava me convencer pela segunda vez no dia. — Podemos estar no fim do mundo, mas as relações ainda são importantes. Você apenas tem que dar uma chance.

A ideia fez meu estômago revirar. A última coisa que eu precisava era formar laços.

— Eu entendo seu ponto, mas... não é fácil pra mim. — Respirei fundo e balancei a cabeça para afastar as lembranças que ainda me assombravam. — Eu não vou. Desiste.

Eu não queria admitir, mas aquele assunto me causava medo. Tanto medo que meu corpo começou a estremecer. Simon percebeu e segurou minhas mãos. Seu toque era firme e quente, eu até diria que aquilo foi reconfortante, se ele não estivesse me pedindo algo tão absurdo.

— Não posso. — Me guiou até a cadeira mais próxima para que eu pudesse me sentar e então se abaixou na minha frente. — Eu nunca vou desistir de você.

— Eu sinto como se você estivesse.

Desviei minha atenção para a janela, eu não conseguia encarar o rosto dele. Eu não conseguia encarar mudanças.

— Você os conhece, sabe que eles não são como a Fedra nem como os Vagalumes.

Isso não faz diferença para mim. Pessoas continuam sendo pessoas.

— Sua tentativa de me acalmar só está piorando as coisas.

Por Deus, eu só queria que isso acabasse logo.

— Eu não estou tentando acalmar você, é a verdade.

— Bom, a verdade nunca pareceu tão ruim.

Simon respirou fundo.

Nós dois estamos frustrados, isso é um fato. Temos visões diferentes sobre o que é melhor pra mim. Na minha cabeça, isso não deveria ser uma discussão, visto que a decisão deve ser minha. A escolha é uma coisa que não deve ser tirada de ninguém.

— É difícil para mim confiar sua vida nas mãos de outras pessoas, você é boa demais para esse mundo, mas eu acredito neles. Acredito que eles podem cuidar melhor de você... melhor do que eu jamais poderei cuidar.

Eu não acreditei nas coisas que estava ouvindo. Elas pareciam mais desculpas para mim. Desculpas daquelas bem ruins.

— Como você pode dizer isso... — Senti um nó se formar na garganta. Eu gostaria de poder gritar, mas estava sendo difícil até mesmo falar.

Eu estava sendo afastada pela pessoa de quem mais queria estar perto. Devo dizer que o sentimento é doloroso, mas familiar. Eu já experimentei isso antes. Então, numa tentativa fracassada de me consolar, finjo que não me importo. Mas conforto é a última coisa que você pode tirar de um trauma.

— Você cuidou de mim todos esses anos. Ainda estou viva, não estou? Como você pode dizer que eu estaria melhor com outras pessoas? — perguntei, agora com um misto de tristeza e raiva.

— Você está viva, mas não está vivendo. Você está consumida por traumas que não te deixam viver. — Ele passou a mão no rosto, em agonia.. — Como você acha que eu me sinto te vendo assim?

— Isso não tem nada a ver com você.

Eu queria ter dito que ele fez o que pôde e que isso era o suficiente para mim, mas eu estava com tanta raiva. O orgulho falou mais alto.

NO CURE, Ellie WilliamsOnde histórias criam vida. Descubra agora