CAPÍTULO 2| A vespa

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Aeroportos tinham sempre o mesmo ar de vida nova, despedidas e recomeços. Perséfone amava isso, por esse motivo estava indo em busca de uma vida nova na Europa onde sabia que poderia conhecer outros países com mais facilidade e ainda ensinar sobre seus costumes sendo uma turista.

Aquele dia deveria ser perfeito, mas com sua irmã mais velha  no seu pé nada estava sendo como o planejado.

— Tia Abilia vive perto de onde vai ficar. A gente meio que vai se ver sempre. – começou a platinada, com seu tom sério de sempre.

Perséfone, por outro lado, não gostou nada da notícia: — Ainda não acredito que vai deixar a mamãe aqui sozinha cuidando do restaurante só pra me torrar a paciência.

— Ei, seu pai é o chefe, não vou estar sozinha! — Isabel tratou logo de se defender – E eu até acho bom vocês duas irem juntas. Dina já conhece aquela região, cresceu lá.

Ah, claro, esqueci de mencionar que Isabel é italiana nascida e criada. Conheceu o pai de Despina quando era jovem e a moça viveu boa parte da infância lá. Se mudaram para tentar a vida em outro país após o homem as abandonar.

Isabel levou alguns anos para se estabilizar, até conseguir abrir o restaurante e conhecer Zeca, pai de Perséfone e atual chefe do lugar.

⋆⋆⋆⋆

O voo foi longo, mas tranquilo. Após duas escalas de quase 4 horas de espera, as irmãs finalmente chegaram ao seu destino bem na hora do café da manhã.

Sua tia Abilia fez questão de ir buscá-las e levar ambas para conhecer o melhor panifício da cidade que, claramente, era a dela própria.

Despina parecia nervosa.

— Os Bruno ainda vivem por aqui, tia?

Perséfone não sabia quem eram, na verdade nunca havia escutado esse nome nas histórias que sua mãe ou mesmo Dina contavam.

— Os Bruno? Quem são?

— Sua irmã brincava sempre com a filha deles. Lucia vive na mesma casa, mas os pais se mudaram para Sicília – respondeu Abilia.

— E... como ela está?

Despina interessada em uma amiga de infância que não vê há anos? Estranho. Muito estranho.

— Ah, bella, acho que vai ter que encontrá-la para descobrir.

A mais velha apenas assentiu, ainda nervosa, e voltou a ter sua atenção na vista da janela do carona. Era uma manhã chuvosa e fria, mas linda e aconchegante.

Não demorou muito para que finalmente Perséfone estivesse no hotel. Precisava se apresentar para começar finalmente a trabalhar, mas também precisava de um banho quente.

— Aí, te vejo no jantar? — perguntou a platinada, ainda dentro do carro.

Per estava impressionada e eufórica demais para dar atenção a mais velha, mas foi obrigada a tal quando a buzina soou: — Aí! Tá bom, a gente se vê no jantar.

Ao menos teria um pouco de paz até o anoitecer. Ou talvez não.

Estava prestes a entrar quando alguém estacionou uma vespa ao seu lado na beira da calçada. A freada foi tão brusca que jogou água empoçada por tudo, inclusive em si, o que a deixou furiosa.

— Eu não acredito! — exclamou — Jura que tinha mesmo que estacionar assim?

A forma calma  como o condutor da vespa descia do veículo a deixou ainda mais puta, mas tudo só piorou quando ele tirou o capacete e mostrou um sorriso debochado: — Se estivesse dentro de casa não teria se molhado, bella.

Não, ela não podia perder seu réu primário logo no seu primeiro dia ali, por isso apenas respirou fundo para responder: — Eu estava prestes a entrar e isso não justifica sua falta de senso para estacionar. Achei que os italianos fossem cavalheiros.

O sorriso debochado deu lugar a uma risada anasalada: — Achou errado. 

— Não me diga. — agora foi sua vez de debochar.

— Escuta, você não ia entrar?

Ela até abriu a boca para responder, mas estava mesmo atrasada e com frio.

Ao entrar no saguão do hotel sua primeira impressão foi a de estar em um castelo. As paredes eram feitas de tijolos que ficavam à mostra, bem como a lareira rodeada por poltronas fofas e uma mesa de centro repleta de biscoitos. Alguns hóspedes estavam sentados ali aproveitando uma boa xícara de chá ou chocolate quente.
Do lado oposto à lareira, ao pé das enormes escadarias, ficava o balcão da recepção e seu futuro local de trabalho.

— Tchau, bella! — cumprimentou a recepcionista, com um sorriso angelical no rosto.

Perséfone demoraria para se acostumar a ser chamada de bella por todos: — Oi! Eu sou Perséfone Romano. Vim pro intercâmbio.

— Seja bem-vinda. Eu sou Lúcia Bruno, vou te treinar até que esteja preparada para cuidar da recepção sozinha.

Aquele nome? Oh, a amiga de infância de Dina!

— É um prazer. E por que eu vou ter que ficar sozinha na recepção? – A curiosidade foi sanada quando a mulher de cabelos castanhos deu a volta no balcão apenas para mostrar o volume em sua barriga. Estava grávida. Deveria estar no quinto ou sexto mês de gestação – Aw. Entendi.

Ambas riram, mas logo Lúcia notou o estado em que ela estava; molhada e tremendo de frio: — Dío mío! Está tremendo. O que houve com suas roupas?

Per já havia até esquecido do estupido que a dera um banho no lado de fora.

— Ah, um bobão sem noção jogou água em mim quando estacionou a droga de vespa, ele ainda foi sup-

— Signore Di Fiori, bom dia. — interrompeu a grávida ao cumprimentar o homem que acabara de chegar.

A jovem lembrava desse nome por conta do e-mail que recebeu com a confirmação do intercâmbio onde informava o nome do hotel e, também, o nome do proprietário: Eduardo Di Friori. Não queria encontrá-lo naquelas condições, mas o olhar de Lúcia a obrigou a voltar-se para ele e o cumprimentar.

— Senhor Di Fiori, primeiro quero me desculpar por... — assim que pôs os olhos nele sua voz falhou — Você é o dono desse lugar?

Justamente o cara da vespa.

RomanoOnde histórias criam vida. Descubra agora