GUS (Parte#1)

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Era seu aniversario de 8 anos, o pai e a mãe estavam ansiosos, iria ganhar sua primeira bicicleta.

Gustavo Roque Bernardes, ou simplesmente Gus, de simples não tinha absolutamente nada. Desde seus 3 anos frequentava psicóloga e psiquiatras. Começou a falar, para o pavor de sua mãe, apenas com 5 anos, lhe encantava ficar sozinho e observar ao redor. O menino passava o dia mudo e pensativo. Primeiro pensaram que podia ser autista, depois que tivesse algum retardo e aí perceberam que era apenas... diferente.

O pai não podia aceitar as peculiaridades do filho, fazia de tudo para que Gus se adequasse aos demais. Gus odiava bola. Gus odiava televisão. Gus odiava carros. Paulo botou o filho no futebol. Paulo o fazia ver os filmes da moda. Paulo lhe comprava todos os carrinhos que encontrava pela frente.

Gus gostava de ler, principalmente sobre florestas, sobre biologia, sobre natureza. Imaginava como seriam as enormes florestas tropicais, como seria respirar o ar puro, como seria o cheiro das plantas, como seria sentir a vida de dentro da floresta...Gus sabia da aversão do pai a qualquer coisa que respirasse e que não fosse humana, mas ele não podia evitar, nutria uma curiosidade enorme sobre as misteriosas florestas.

Gus nasceu na grande cidade de Donário, cheia de enormes prédios, avenidas e pessoas apressadas. A monocromática Donário, assim como a maioria das grandes cidades, possuía muito pouco verde, na realidade o verde era pura decoração. Por medida de higiene, toda área vegetal havia sido removida e substituída por verdes artificiais. A terra, os insetos, as pragas e os vírus haviam sido eliminados das cidades, as grandes áreas verdes foram retiradas e apenas as grandes florestas preservadas.

Era inexplicável e inaceitável para Paulo que seu filho nutrisse tamanha obsessão por algo que ele tanto abominava, e, por isso, tentava de todas as formas mudar o filho.

Gus estava prestes a abrir seu enorme presente de duas rodas, quando a campainha soou. Paulo se levantou para atender:

_Pois não?

_Seu Paulo, chegou uma encomenda pro Gustavo.

Paulo estranhou, mas abriu a porta. Recebeu a caixa com pequenos furos e um enorme cartão, ao reconhecer a caligrafia seus olhos quase saltaram.

_De quem é, pai?

Paulo queria distância do seu passado, havia cortado o contato com seus pais e omitido sua história para a nova família. Todo ano no dia de seu aniversario, Gus recebia um cartão e um presente de seus avós, porém Paulo nunca os entregava. Nesse ano tinha se esquecido de que o porteiro era novo no prédio e não o avisara para jogar fora as cartas e pacotes enviados deste remetente.

Mulher e filho aguardavam pela resposta, mas o pai estava congelado, sem reação. Gus se sentiu atraído pela caixa imediatamente, ela o chamava para perto, algo ali tinha conquistado todos os seus sentidos. A demora do pai em reagir, somada ao enorme poder de atração da caixa, fez com que ele agisse impulsivamente e, quando se deu conta, já havia arrancado o pacote das mãos do pai.

_NÃO!_o grito de Paulo fez com que o filho, assustado, a deixasse cair. A queda abriu a caixa e o chão branco e brilhante ficou coberto de terra.

_Olha o que você me fez fazer! Machuquei ela!_o menino desesperado, juntava toda a terra espalhada pela sala.

_Gus, solta isso! É sujo!_a mãe tinha cara de nojo.

_Gus, não escutou a sua mãe? Larga isso, agora!_Mas Gus estava preocupado demais para escutar o que era dito. Suas mãos estavam negras e nunca se sentiram mais vivas. Ele recolocava toda a terra derramada de volta no vaso.

A PROFECIA DOS TRÊSOnde histórias criam vida. Descubra agora